Temperaturas percepção
Thiago Sousa
Se você pensar que o seu nariz com os fantásticos sensores olfativos e a sua boca com o intricado conjunto de papilas gustativas são verdadeiras máquinas de análise de sabores e aromas, você está absolutamente certo!
A Natureza nos privilegiou com os sentidos justamente para podermos aproveitar melhor o que a vida pode nos proporcionar. E, certamente, saborear excelentes cafés é uma delas…
Obviamente, como todos os equipamentos, ajustes são necessários para o seu bom funcionamento, bem como o treinamento dos operadores para que os resultados sejam confiáveis e consistentes.
No caso dos juízes de cafés, como aqueles formados dentro da Escola SCAA – Specialty Coffee Association of America, o princípio que norteia a estrutura lógica dos cursos é a de que nós somos maravilhosos equipamentos de avaliação sensorial e que para que o desempenho seja correto é imprescindível que saibamos interpretar corretamente nossas sensações ao beber o café.
Para avaliarmos um café, primeiramente um pouco da amostra deve ser torrada. Após um período de descanso, semelhante ao que ocorre no processo industrial, os grãos torrados são moídos e postos em xícaras.
Tanto o ponto de torração quanto o ajuste da moagem dos grãos devemrespeitar um padrão para que as condições de avaliação sejam sempre as mesmas.
Cada grão, dependendo de sua origem, tem uma forma de conduzir a torra. Este será um assunto que abordarei num outro post.
O tamanho das partículas após a moagem deve ser suficiente para que, ao se hidratarem, possam liberar os componentes de aroma e sabor para a bebida.
A água, tanto na prova quanto para o simples consumo, tem grande importância na bebida.
A água deve ser levemente ácida, ou seja, com pH menor que 7, pois águas alcalinas acabam reagindo com algumas substâncias presentes no café e fazendo perder algumas notas de sabor interessantes.
A temperatura…bem, não use água fervente ou que ficou fervendo, pois isso faz com que o oxigênio dissolvido se perca, tornando o sabor da água, digamos, “chocho”.
A temperatura ideal é em torno de 93°C, que é quando bolhas grandes começam a se desprender do fundo do recipiente que está no fogo, num processo que é chamado de nucleação.
No caso da avaliação sensorial do café, faz-se uma infusão, ou seja, a água fica em contato com o pó num processo de extração contínua.
Ao se despejar a água sobre o pó, este hidrata-se e forma uma crosta, como pode ser observada na foto ao lado, com aproximadamente 2 cm de espessura e que “prende” boa parte dos aromas extraídos das partículas de café.
No primeiro minuto após a colocação da água, quando esse “colchão” é formado é possível captar os aromas que o café possui. É um exercício muito interessante.
Normalmente após 3 ou 4 minutos procede-se a quebra dessa crosta, que é feita delicadamente com uma colher própria para a prova de café. Não há necessidade de fazer grande agitação porque o objetivo nesse momento é captar o mosaico de aromas que o café pode apresentar e que fica concentrado na crosta.
Depois, faz-se a retirada do creme sobrenadante para que a bebida fique exposta de forma limpa, pronta para a avaliação propriamente dita.
Nosso palato percebe melhor os sabores abaixo dos 45°C, naturalmente com pequenas alterações para mais ou para menos para cada pessoa. Acima dessa temperatura a única sensação que percebemos é… o quão quente está a bebida!
E há, ainda, o risco de prejudicar nossa gengiva e a delicada teia de ligamentos com nossos dentes.
Tente fazer um teste com um excelente café bebendo-o a diferentes temperaturas. Até porque, numa apreciação do tipo slow food, além de ser um momento de prazer você pode perceber como diferentes sabores podem ser captados nas diferentes temperaturas!
Sim, o café, principalmente o de boa bebida, é para ser apreciado, sentido e “curtido” como um permanente aprendizado sobre nossa percepção dos aromas e sabores…