Contact Us

Use o formulário à direita para nos contactar.


São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

O melhor torrador do mundo

Ensei Neto

Amostragem durante torra. Foto: Ensei Neto.

Amostragem durante torra. Foto: Ensei Neto.

Foi o físico e matemático inglês James Maxwell que comprovou que a luz se propaga na forma de onda eletromagnética, ainda no Século XIX. Essa afirmação foi fundamental para estabelecer base para correlacionar as cores e suas respectivas características ondulatórias, definindo-se, inclusive a quantidade de energia associada.
Uma das aplicações mais interessantes desses conceitos é a análise de cores de uma chama. Como se sabe, a chama nada mais é do que a visualização da reação de combustão, que basicamente pode ser representada pela equação

1912-EQUACAO.jpg

Nessa equação, em particular, estamos considerando como combustível um típico derivado de petróleo, que pode ser desde o chamado gás encanado, composto por metano e etano, ou o GLP, que é fornecido em botijões, e é uma mistura de propano e butano.
E aí começa a fazer sentido a importância da escolha do combustível para se fazer essa combustão: quanto menor é a sua molécula, ou seja, mais curta for a cadeia, mais eficiente tende a ser a reação, resultando tão somente em gás carbônico, água e energia. Por outro lado, se a molécula do combustível for grande, isto é, de cadeia longa, a reação tende a perder eficiência, resultando na chamada “combustão ou queima incompleta”, que tem como elemento resultante adicional o carbono, representado pela fuligem que se forma.
Uma alternativa para minimizar esse efeito é ter uma melhor combinação com o oxigênio.

 As cores observadas numa chama têm relação direta com a maior ou menor eficiência da combustão, de forma que onde a reação ocorre de forma perfeita, a cor tende a ser de azulada a branca (principalmente na parte chamada de “alma”), enquanto que se a reação for incompleta, a coloração vai do alaranjado ao avermelhado, muitas vezes com a ponta negra, denunciando a presença da fuligem.

A chama de cor alaranjada tem temperatura por volta dos 450ºC a 500ºC, enquanto a chama azul atinge 1.200ºC. Incrível, não, essa diferença olímpica?!

A partir deste ponto, vamos retornar um pouco à questão da luz e sua natureza ondulatória. 
O chamado espectro visível da luz compreende frequências que compõem o arco íris, para facilitar a compreensão, e suas 7 cores: Vermelho, Alaranjado, Amarelo, Verde, Azul, Anil (Azul Escuro) e Violeta. Frequências que ficam abaixo da cor vermelha são conhecidas como infravermelho; já as frequências superiores à da violeta, recebem o nome de ultravioleta. 
Observe que frequência (que corresponde à intensidade ou força da onda) do infravermelho é bastante baixa e, por consequência, sua onda possui uma amplitude (que é, digamos, o tamanho da onda) grande. É por isso que nos fornos para dourar ou gratinar trabalham com uma fonte de infravermelho, cuja ação é mais superficial.

1912-esprectro visivel.jpg

Por outro lado, a luz do sol é fonte de ondas com frequência ultravioleta, daí a recomendação de se usar protetor solar que ameniza os efeitos violentos dos UV-A e UV-B, que são potentes e de pequena amplitude, o que os torna muito penetrantes. 
Se na chama a coloração predominante é a azul, tenha certeza de que a combustão está indo muito bem. Ao contrário, se a cor alaranjada predominar, a reação certamente não está sendo das mais eficientes.

A torra do café tem seu início entre o Yemen e a Etiópia, numa clássica discussão sobre onde esse processo aconteceu primeiro, tal qual a origem do tango, que tem a disputa intelectual entre a Argentina e o Uruguai.
Nos primórdios da torra do café, estimado entre 1.100 e 1.200 anos atrás, era empregada uma vasilha plana em material cerâmico, antes de se utilizar o torrador em formato esférico confeccionado em metal. As sementes cruas são esparramadas na vasilha e mexidas com uma espátula enquanto ficam sobre o fogo.

Utilizar uma vasilha plana ou levemente abaulada para torrar café é também um privilégio brasileiro, costume ainda muito arraigado no interior do Nordeste, onde recebe o divertido nome de “caco”, segundo minha grande amiga e companheira de viagem Ana Rita Suassuna, assim como é típico da Etiópia.  

Um “caco” entregue pela Ana Rita Suassuna à ceramista Gisele Gandolfi, da Muriqui. Foto: Ensei Neto.

Um “caco” entregue pela Ana Rita Suassuna à ceramista Gisele Gandolfi, da Muriqui. Foto: Ensei Neto.

O uso do torrador bola foi sequência natural e engloba alguns conceitos simplesmente geniais. O espírito criativo das pessoas, quando respaldados pela Ciência, mesmo que de forma intuitiva, promove o avanço tecnológico.
Os povos do Oriente Médio dominam há séculos o trabalho de metalurgia e confeccionar uma esfera metálica com um eixo para fazer sua movimentação não foi tarefa tão complicada...

A esfera é a forma geométrica em que qualquer regime de forças fica com distribuição equilibrada. Ao incluir movimento com um eixo centralizado em velocidade adequada, cria-se excelente distribuição de massa das sementes de café, que se comportam como fluido, condição fundamental para que o processo de torra ocorra perfeitamente.

Ao se colocar a quantidade recomendada de café cru, em torno de 2/3 do volume do torrador, as condições ideais de trabalho ficam praticamente completas. É muito interessante observar que o volume de café, proporcionalmente ao do torrador bola, cria condição que tecnicamente recebe o nome de inércia térmica alta, fazendo com que a fase de desidratação seja suficientemente longa, contribuindo de forma decisiva para um melhor resultado sensorial da bebida. 

Ao se iniciar a fase que denomino de Q1, quando as reações químicas passam a acontecer e a reação mais importante é a da quebra de amido, a dinâmica térmica é ainda lenta o suficiente para que tudo ocorra de forma eficiente e perfeita!

 A finalização da torra, que denomino como fase Q2, quando a reação de Pirólise é predominante, segue a dinâmica de todos os equipamentos inclusive os de alta tecnologia. 
O torrador bola, como no trabalho maravilhoso que as Mulheres de Divinolândia fazem, pede sensibilidade para definir a quantidade de energia que é dada a cada momento, levando a uma bela coreografia de aproximar e afastar o “bola” do fogo, assim como escolher a lenha a ser utilizada a cada momento faz parte do espírito do jogo.
O resultado surpreende os incrédulos!

Ah, sobre o melhor torrador do mundo... é aquele que você pode adquirir!