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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

Filtering by Tag: Percolação

A delicada questão do tamanho do buraco...

Ensei Neto

”It's Up to You”. Diferentes métodos de preparo de café. Ilustração de Daniel Kondo.

”It's Up to You”. Diferentes métodos de preparo de café. Ilustração de Daniel Kondo.

Outro dia o Companheiro de Viagem Chico Rabelo, de Maceió, veio com uma dúvida muito interessante: numa extração, qual é a influência da geometria nos métodos por percolação? Seria o tamanho do orifício de escoamento o responsável pelo desempenho da extração?
"Boas perguntas", respondi ao Chico, que é instrutor de pilotos de helicópteros e que, portanto, possui um excelente conhecimento de Física e Matemática, principalmente em Geometria. Inicialmente barista, um dos melhores que conheci nos últimos tempos, tem se especializado como Mestre de Torras, sempre a partir de uma combinação de talento com forte base científica.

Primeiramente, é importante saber que a Percolação é um modelo de extração em que o solvente, no caso a água, passa por um sistema fixo, que é o "bolo" de pó de café, retirando daí substâncias solúveis.
Ao se verter a água sobre o pó de café é possível dosar o volume incidente, o que regula em parte o contato entre a água e as partículas de café moído. 
No entanto, a principal força que atua nesse mecanismo é a Gravidade.

As Leis da Natureza são infalíveis e intocáveis! 
Por exemplo, a Força da Gravidade é vetorial, isto é, relaciona-se com uma direção e um sentido muito bem definidos. Em nosso planeta, ela tem como sentido o do centro do globo, daí a impressão de que, para nossas referências, a Gravidade sempre aponta para o chão. Porém, há ainda um outro elemento fundamental para se entender o chamado "jogo de forças" da Natureza: o "motor" de qualquer tipo de atividade é resultado do que é conhecido como "diferença de potencial".
O conceito básico da Diferença de Potencial (DDP) reside no fato de sempre algo que está em posição de maior potencial se desloca para outro de menor. Vejamos alguns exemplos práticos para facilitar a compreensão: as quedas d´água que movimentam as usinas hidrelétricas (quanto maior for a queda, maior é a movimentação das turbinas hidráulicas); uma simples ligação elétrica monofásica, com um fio de 110 v e outro, zero volt; a troca de calor por contato (algo mais quente transmite calor/energia a algo menos quente); ou os ventos, que nada mais são que ar em deslocamento, da zona de alta para outra de baixa pressão.

Observe que na figura acima que apresenta um porta filtro com forma similar a um triângulo, o deslocamento do extrato aquoso, que é sempre perpendicular à superfície do filtro, configura uma composição vetorial, sendo que a força que aponta para baixo é a da gravidade. Uma vez que o fluido passa pelo filtro, é necessário que haja espaço entre o filtro e a parede do porta filtro para que ele possa escorrer até o orifício de saída.

O que faz o café extraído escorrer para o orifício localizado na parte mais baixa do porta filtro é a distância entre o filtro e a parede do porta filtro. Quanto maior for essa distância, melhor será o desempenho do sistema, pois, para existir o deslocamento é necessário respeitar uma das mais importantes leis da Física: dois corpos não podem ocupar o mesmo lugar ao mesmo tempo!

Em razão disso, a Chemex, a despeito de possuir o orifício com o maior diâmetro dos três métodos que apresentei acima (Melitta, Hario e Chemex, respectivamente), sua extração é mais demorada pelo fato da parede de vidro ser lisa, provocando eventuais interrupções. Para retomar a extração, deve-se suspender o filtro para se descolar da parede de vidro.
É por isso que alguns amigos da West Coast apelidaram a Chemex de "levanta cueca"...
Portanto, a resposta à segunda pergunta do Chico Rabelo é: não, não é o tamanho do buraco que importa! 
O que interessa é conhecer o efeito da composição vetorial do fluxo do café extraído através do filtro, que está diretamente ligado com o ângulo do porta filtro,  e também da altura das estrias internas do porta filtro para garantir bom fluxo descendente.

Mas, afinal, um buraco maior do porta filtro não permite um fluxo maior de café extraído?
Sim, naturalmente, mas desde que garanta uma concentração de sólidos solúveis que agrade...