Harmonia de cafés e vinhos
Thiago Sousa
Compartilhar uma amizade com pessoas que sempre estão a nos ensinar coisas muito interessantes é sempre muito estimulante. Dentre essas pessoas especiais, tenho em particular o Manoel Beato, certamente o mais premiado sommelier brasileiro.
Manoel tem se destacado no mundo dos vinhos devido ao seu vasto conhecimento, grande habilidade em descrever e classificar os mais diversos vinhos, além de um preciosa sensibilidade para a harmonização.
Quando se fala em harmonização entre elementos distintos, muitas vezes são apresentadas duplas que nunca chegarão a formar um par, de tão díspares. Cabe, aqui, a sensibilidade para que os diversos elementos possam se combinar adequadamente, ou, mesmo, possam travar um saudável diálogo entre sabores e aromas.
Recentemente fizemos uma experimentação coletiva com vinhos e cafés.
A princípio uma tarefa complexa, porém que se revelou lúdica e, ao mesmo tempo, muito estimulante. Escolhi três cafés de diferentes origens, com perfil de sabores e aromas muito distintos entre si, a saber: um proveniente da Fazenda São João, de Coromandel, no Cerrado Mineiro; outro da Fazenda Paraíso, de Carmo do Paranaíba, também do Cerrado Mineiro; e, finalmente, um de Iúnas, Serra do Caparaó, Espírito Santo.
Para que pares perfeitos pudessem ser formados, Manoel selecionou os três vinhos que estão nesta foto a partir do esplêndido catálogo da Mistral Importadora: um espanhol Conde de Valdemar, Rioja de 2002; o italiano Noe, Orvieto; e o alemão Domdechant Hoccheimer, de 2005.
Vinhos e cafés foram degustados simultaneamente, par a par, em regime de triangulação. Foi quando a maestria e sensibilidade de Manoel Beato se evidenciou.
O café do pequeno produtor Reginaldo Silvoni, de Coromandel, MG, que está causando sensação entre os formadores de opinião dos Estados Unidos devido à sua complexidade de notas, mesclando aromas florais como jasmim, delicados tons de amêndoas e uma elegante acidez cítrica adocicada, formou par com o único vinho tinto, um Rioja de uvas Tempranillo, Conde de Valdemar. O diálogo foi estupendo, principalmente quando o café servia de suporte ao vinho, realçando notas de frutas vermelhas com grande brilho.
O segundo par contou com um café que foi empregado pelo atual campeão barista norte-americano,Kyle Glanville, produzido pela Família Veloso em Carmo do Paranaíba, e que apresenta notas de sabor delicadas como nozes e amêndoas, além de um fundo de caramelo entremeado por um frutado cítrico sutil, e o belíssmo Noe, produzido por Paolo e Noemia D’Amico. Aqui, num desfecho inesperado, o vinho serviu de base para o café, ao contrário do par anterior, ressaltando a deliciosa doçura a caramelo do café!
Finalmente, o terceiro par causou momentos de transe, tal a beleza que a composição proporcionou. O café produzido por um pequeno produtor da Serra do Caparaó, no Espírito Santo, apresentava um intenso aroma floral a jasmim com fundo cítrico, além de um sabor a flores brancas, uma estupenda acidez cítrica com finalização frutada, enquanto que o belíssimo vinho alemão de uvas Riesling, de grande carga aromática frutada, reservava uma surpresa, que era o seu sabor de fundo mineral. Na realidade, quando fazía-se a composição café-e-vinho, neste surgia delicados ataques salinos!
Foram mais de duas horas de puro êxtase!
Quem participou, certamente terá memórias formidáveis desse dia.
Nesta foto, estamos juntos, Manoel Beato, com sua colher de prata para provar café, e eu, seu Coffee Traveler.
Ah, antes de finalizar: Manoel também tem um programa semanal da Rádio Eldorado FM de São Paulo, que vai ao ar todos os sábados a partir da 12:30 hs. O nome?
“Adega Musical”.
Muitas informações e dicas sobre vinhos, regadas a ótimas músicas escolhidas pelo próprio!
Versatilidade é isso!