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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

MERCADO

Filtering by Tag: Sais Minerais

A delicada questão da água

Thiago Sousa

A maior parte das bebidas leva água em sua composição, mesmo aquelas de teores etílicos elevados como um clássico Cognac ou uma espivetada Vodka.

Como bebida, a Água é a mais consumida no mundo, seja quando gratuitamente bebida diretamente nas fontes e rios ou em sofisticadas embalagens que atravessam mares e continentes para simplesmente saciar a sede de um apreciador mais exigente.

Tem propriedades físico-químicas incríveis como nenhuma outra substância conhecida, como a sua capacidade de conduzir eletricidade ou de absorver energia (= calor). No lado químico, consegue dissolver grande parte das substâncias, daí o seu título de Solvente Universal.

Dentre suas características, tem destaque o fato de serinodora (= sem cheiro), incolor (uma boa água deve ser cristalina!) e insípida (= sem gosto). Opa! Paramos por aqui!!!

Na verdade a água tem gosto, sim! (Não vale dizer que é “gosto de água”…)

Em sua composição entram sempre os Sais Minerais, que são obrigatoriamente discriminados em todo rótulo de Água Mineral do mercado. Eles podem alterar o pH (medida que indica se uma água tem personalidade ácida ou alcalina) e diretamente no sabor. Sim, exatamente isso: são os responsáveis pelo sabor da água!

Vamos a um exemplo prático: o nosso conhecidíssimo Sal de Cozinha (= Cloreto de Sódio) tem dividido nos últimos anos espaço nas gôndolas dos supermercados com o chamado Sal Light (= Cloreto de Potássio). Experimente e compare os dois. Você perceberá que o Sal Light (= Cloreto de Potássio) é levemente picante e deixa um final amargo. Diferente? Sim e esse é o preço a ser pago pela substituição…

Nas águas minerais 3 sais não devem, em minha opinião, ter presença muito, digamos, maciça: o Magnésio (que dá sensação untuosa, oleosa como a famosa Água de Magnésia de Phillips), o Potássio (que dá o toque picante que comentei acima e o leve amargor ao final) e o Manganês (que dá um sabor terroso).

Segundo o Protocolo SCAA – Specialty Coffee Association of America para Avaliação Sensorial de Café, que fez um estudo minucioso dedicado exclusivamente à água, recomenda que o TDS (Total de Sólidos Dissolvidos = minerais) para água a ser utilizada no preparo de café fique entre 100 ppm e 225 ppm, porém preferencialmente na estreita faixa de 125 ppm a 175 ppm. O pH deve se situar em terreno levemente ácido, na faixa entre 5,0 e 6,5. Com estes requisitos, o café preparado será sempre fiel ao que o grão torrado tem para mostrar!

Alguns baristas tem usado águas com grande carga de minerais, alterando sensivelmente o resultado final na xícara. É importante lembrar que os minerais, dada sua alta capacidade de estímulo dos nosso sensores gustativos (como estes tem estrutura semelhante aos dos neurônios, são muito reativos aos íons provenientes dos sais dissolvidos na água), mudam nossa percepção dramaticamente, camuflando alguns sabores ou mesmo estímulos físicos (ou táteis) em nossa boca.

É nesse ponto que gostaria de comentar um pouco da “dobradinha” Espresso e Água com Gás. Beber água gaseificada (ou com grande carga de carbonatos = gás carbônico) vem da prática dos apreciadores de vinhos.

Vinhos muito jovens podem apresentar taninos, que são divididos pelos enólogos em “bons” e “maus”. Nada que um pouco de descanso e contato com madeira, principalmente o carvalho, não ajudem a minimizar. Os maus taninos, que caracterizam os vinhos de qualidade inferior, causam a típica adstringência devido a frutos não maduros utilizados na fermentação. A adstringência, neste caso, é resultado da presença de substâncias chamadasalcalóides, que são as defesas naturais que as plantas empregam para protegerem seus frutos dos ataques de insetos.

Como quimicamente os alcalóides tem grande afeto por moléculas de água, quando em nossa boca “roubam” a água presente na mucosa, desidratando-a. Dessa forma, esta se enruga por alguns momentos, causando a sensação de “aperto” ou secura na lateral interna da boca, que é o efeito físico da adstringência.

No café, o mesmo pode ocorrer, quando sementes de frutos colhidos não maduros estiverem presentes num lote.  Só que diferentemente dos vinhos, só ficam os maus taninos, até porque não se deixa café em barricas de carvalho para envelhecer…

As águas gaseificadas tem uma grande carga de gás carbônico que dissolvido na água forma uma estrutura molecular que também nutre especial afeto por moléculas de água livre, como as encontradas na mucosa! É por isso que a primeira sensação que temos ao beber água fortemente gaseificada (ou refrigerantes) é a de ressecamento da boca. Se em seguida você beber um café, digamos, medíocre, que seja adstringente, porém em menor intensidade do que a percebida pela água altamente carbonatada, a sensação que você terá é a de que o café é “macio”!

Bem, isto até o segundo gole, quando os problemas do café se revelam escancaradamente…

É por isso que cafeterias de ponta começaram a servir a mesma água tanto para beber como para preparar o café. Dessa forma, a verdadeira personalidade do café se faz presente, valorizando o trabalho de todos os profissionais, desde o produtor, o juiz degustador, o mestre de torras e o barista!