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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

ORIGEM

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Sobre os desafios da produção de café – 2

Daniel Kondo

Há um ditado que diz que “O sapo não pula porque gosta; pula por precisão.”

Podemos entender que muito do que se faz é resultado da necessidade. No caso da Cafeicultura, a incorporação de tecnologias sempre se dá nos momentos de crise de preços, no fatídico período em que os preços vão ladeira abaixo, ou quando algum evento grandioso força a busca por novas paragens. É a tal da “precisão” que surge e faz o sapo pular…

Em 1975 ocorreu a Grande Geada, que modificou definitivamente a Geografia dos Cafés do Brasil. Com as plantações arrasadas pela Geada Negra, efeito resultante dos ventos glaciais que sopraram no Norte do Paraná, até então o mais importante Estado Produtor de Café do Brasil, não sobraram muitas opções aos cafeicultores daquela região para sua permanência na atividade. Muitos decidiram deixar as lavouras dizimadas pelo intenso frio, tomando rumo ao Triângulo Mineiro e o Alto Paranaíba, onde puderam adquirir propriedades bem maiores porque as terras eram muito mais baratas em relação às do Paraná.

A topografia plana do Cerrado, que faz o olhar se perder na imensidão de seus horizontes, de início agradou aos fugitivos da geada, assim como o seu clima continental peculiar, que se mostrava muito estável, e o solo, que também tinha tonalidade avermelhada, um tanto mais amarelada que a clássica Terra Roxa típica do Norte Paranaense.

Assim, os cafeicultores paranaenses foram se fixando em Araguari, Monte Carmelo, Patrocínio, São Gotardo e Carmo do Paranaíba.

A primeira decepção foi dada pelo solo avermelhado do Cerrado, que tinha fertilidade muito baixa, muita acidez e teores elevados de alumínio. Mais uma vez, a Natureza mostrou que faz tudo em equilíbrio: a maravilhosa topografia plana, que permite mecanização em quase todas as operações, tinha como moeda de troca a necessidade de forte correção do solo. Porém, foram esses desafios que fizeram com que os produtores se organizassem em associações que serviram de ponto de encontro para troca de experiências e conhecimento, dando origem à região mais organizada dos Cafés do Brasil: o Cerrado Mineiro.

Além dos tradicionais cafeicultores paranaenses, haviam muitos “novos” produtores, pessoas que mudaram de ramo para tentar a sorte na cafeicultura, estimulados pelas impressionantes cotações do café na Bolsa de New York (NY/CSCE). Para efeito de comparação, com 100 sacas de café beneficiado de 60 kg era possível adquirir um carro de bom nível da época, como um Passat, ou, para os dias de hoje, um veículo na faixa de R$ 90 mil.

Esse caldeirão de gente que tentava domar o pobre solo do Cerrado, bem como compreender seu clima que apresenta apenas 2 estações bem definidas (6 meses chuvosos com temperaturas altas no dia e forte insolação; 6 meses secos e com grande amplitude térmica), começou a manter estreita relação com os órgãos de pesquisa, o que permitiu que novas tecnologias fossem desenvolvidas e rapidamente disseminadas. Junto do plantio em renque (linhas com plantas relativamente próximas), que garante maior estabilidade da produção porque minimiza a bienalidade produtiva dos cafezais, novas metodologias de correção de solo passaram a ser empregadas, assim como um modelo inovador de programa nutricional das lavouras (maior parcelamento com quantidades definidas em razão de cada etapa do Ciclo Fenológico, que é o ciclo da fruta).

O resultado: produtividade com números que assombraram o mundo!

Ante os parcos 8 a 12 sacas de 60 kg líquido de café beneficiado por hectare, muitas lavouras do Cerrado atingiram média de 4 anos de 36 sacas/ha a 42 sacas/ha, sem falar em picos de 70 sacas/ha a 90 sacas/ha em algumas glebas.

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Mas, o que parecia o Paraíso em forma de Cafezal, logo mostrou seu Calcanhar de Aquiles: o período de poucas chuvas ou de sua total ausência afetava impiedosamente as lavouras, tirando a produção por absoluta falta de água!

Esforços para desenvolver uma tecnologia revolucionária começaram no final dos anos 1980. Começava a história da Cafeicultura Irrigada, que teve Araguari como importante centro irradiador.

Duas correntes tecnológicas estavam sendo trabalhadas paralelamente: a Irrigação Localizada, que se iniciou também em Araguari, e que recebeu o nome de “Irrigação por Tripa”, aplicando a água junto aos cafeeiros, e a Aspersão, feita por canhões de água de alta vazão, cuja aplicação era em área total das lavouras. Logo uma terceira corrente surgiu, ainda mais revolucionária para a época, que foi o uso dePivot Central, que apesar de aplicar água, em área total, tem sua operação toda automatizada, e, finalmente, surgiu o Gotejamento como alternativa de maior precisão.

O resultado?

Novo salto de produtividade! Com a combinação da tecnologia de irrigação e o modelo de adubação parcelada, um novo patamar de números começou a se formar a partir do início dos anos 90 através de teorias idealizadas e conduzidas pelo agrônomo Roberto Santinato. A primeira lavoura irrigada que quebrou a barreira dos 100 sacos de 60 kg líquidos/ha estava plantada em Barreiras, BA, (lembram-se do Sr. João Barata?). seguindo-se de outras no Cerrado, incluindo-se a lendária Fazenda Lagoa Torta, que se tornou sinônimo dessa escola.

Números exuberantes, mas cujos custos de produção deixavam de ser razoáveis. Essa discussão deu início à busca ao ponto de equilíbrio entre Custo de Produção e Produtividade. E desde então o Custo de Produção passou a ser obsessivamente pesquisado, estudado e anotado em todas as origens produtoras.

De qualquer forma, o ponto de partida usado por Santinato foi muito instigante: qual seria o verdadeiro potencial produtivo de um cafeeiro?

Se sua capacidade produtiva era definida geneticamente, como essa função poderia ser trabalhada: com altíssimas produtividades e curto horizonte de tempo ou produtividades médias e tempo de vida mais prolongado?

Imaginando que uma área de 1 hectare tivesse potencial produtivo de 1.600 sacas de 60 kg, esse questionamento poderia ser formulado também desta forma: 16 de vida produzindo 100 sacas anuais ou 80 anos produzindo 20 sacas anuais?

Qual sua escolha?

Bem, daí começamos outra história…

Territórios – 3

Daniel Kondo

Comentei que o Café, como um Produto de Território, apesar da clara influência das coisas daNatureza como o clima e o solo, além das respostas que a Planta dá por tudo isso, tem nas mãos doProdutor a definição que teremos na xícara.

Primeiro e Mais Importante Conceito que o produtor deve ter em mente é o de que produzir café é antes de mais nada produzir fruta!

Creio que acabo sendo insistente neste conceito, porém a grande verdade é que os cafeicultores geralmente tratam o cultivo de café como o de prosaicos grãos (talvez pelo longo histórico do café em fazer parte do grupo comercial de commodities…) como milho ou soja, onde a visão cartesiana de que basta controlar doenças e pragas, eventualmente dialogar com São Pedro para decidir por uma irrigação ou pedir por chuvas, é o suficiente.

Quando estamos falando de frutas, a primeira coisa que nos vem à lembrança é que fruta boa é fruta madura!

Ninguém em sã consciência compra frutas absolutamente verdes, nem mesmo muito passadas, naquele limiar do estragado. Da mesma forma, colher frutas maduras do cafeeiro deve ser objetivo básico. Afinal, como sempre digo, boas sementes vem de frutas maduras e do cafeeiro queremos apenas e tão somente suas sementes!

Mas, na maior parte da vezes, nem sempre é possível colher apenas os maduros, vindo, em boa parte, aqueles ainda não amadurecidos.

Observe que a atenção e o cuidado do produtor ao fazer a colheita é fundamental, devendo se manter ao longo dos diversos procedimentos para a secagem das sementes. Um desses procedimentos é o de selecionar as frutas pelo seu ponto de maturação depois de colhidas através de equipamentos chamados de lavadores, que fazem este serviço usando a água e a diferença de densidade entre as frutas maduras, verdes e em ponto de passa (secas). O efeito visual deste processo é muito bonito, como pode ser visto nesta foto.

O fato de serem separados frutos secos daqueles ainda com muita água (os maduros, quase maduros e os ainda verdes) facilita o processo de secagem. Há um mito que se criou recentemente: grãos secos como Cerejas Descascados (sementes somente com a casca interna conhecida como Pergaminho) são superiores aos Naturais, que são sementes secadas com as cascas. É o típico caso de se justificar uma ocorrência pelo resultado. E, portanto, um pouco de falta de domínio de conhecimento científico.

Na realidade, o que se busca quando se quer Alta Qualidade  nada mais é do que sementes de frutos maduros, sem qualquer tipo de interferência, seja por contaminação ou causada por fermentações indesejáveis. É óbvio supor que o resultado será muito melhor em termos de uniformidade ao se passar frutas recém colhidas por equipamentos que fazem a seleção pela diferença de densidades (frutas secam flutuam, por exemplo) quando mergulhadas em água e daí passarem por outros que descascarão as frutas por atrito.

E se por acaso a região tiver uma severa restrição de água, como fazer?

A saída é secar com a casca, preparando Naturais.

A bem da verdade, produzir excelentes cafés Naturais exige muito mais cuidado, capricho e conhecimento pelo fato da possibilidade de que diversas floradas possam ter acontecido, gerando frutas em diferentes estágios de maturação. Sim, sem dúvida os resultados são diferentes na xícara, mas por razões absolutamente devidas à fisiologia e bioquímica, que comentarei numa outra oportunidade.

A partir destas pistas, pode-se concluir que apesar da Natureza estabelecer a maior parte das condições do Território como o clima e o solo, sem dúvida é o Produtor que tem nas mãos o poder de não deixar se perder o potencial de qualidade de um lote de café. Pode dizer que a Natureza contribui com 90% dos elementos, enquanto que o Produtor com meros 10% do conjunto; mas para preservar a qualidade sensorial das sementes, é do Produtor 90% da responsabilidade.

Portanto, quem faz o Território é o Produtor!

E vivas para o Produtor

Nos campos de café do Paraná: Norte Pioneiro – 1

Daniel Kondo

O Estado do Paraná foi durante muitos anos o maior produtor de café do Brasil. Era pensar em café e lembrar do Paraná.

Mas as geadas foram as responsáveis por um forte movimento de migração dos cafeicultores rumo a outras paragens de clima mais quente, principalmente em meados da década de 1970. Foi nessa época que, por exemplo, a cafeicultura foi implantada na região do Cerrado Mineiro.

Dos que permaneceram nas tradicionais regiões cafeeiras paranenses, muitos optaram por mudar para outras culturas, típicas do clima subtropical, como o trigo e a aveia.

A crise de preços que aconteceu no final dos anos 90, combinada com as perversas geadas do início de 2.000, fez com que a produção de café do Estado ficasse abaixo de 500.000 sacas de 60 kg, número que nem de longe mostrava a pujança e importância que essa cultura teve.

Atualmente, duas são as áreas mais importantes na produção de café: o Norte do Paraná, que tem como cidades polo Apucarana e Maringá, e o Norte Pioneiro, um quadrilátero formado pelas cidades de Jacarezinho, Tomazina, Ibaiti e Cornélio Procópio, tendo influência de Londrina.

A importância dessas regiões para a cultura do café era tão grande que atraia muitos investidores estrangeiros que se empolgaram com as possibilidades oferecidas. Grupos vindos da Suiça, Alemanha e dos Estados Unidos se instalaram ao longo da região com o objetivo de produzir café.

É possível encontrar  diversas fazendas com as estruturas originalmente levantadas por aqueles empreendedores, dando uma idéia do notável avanço tecnológico existente na época e alguns conceitos de visão de sociedade pelo layout das sedes.

Uma dessas fazendas emblemáticas é a quase centenária Fazenda Califórnia, em Jacarezinho, hoje nas mãos da família Rodrigues, de Ourinhos, SP. Luiz Roberto Rodrigues, que é um dos administradores, comentou-me que as instalações tem soluções que podem ser consideradas avançadas ainda hoje, sendo muitos dos projetos foram elaborados por técnicos ligados à Universidade da Califórnia, USA. Daí a razão do nome adotado pela fazenda.

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A primeira foto, ao alto, mostra o complexo de dutos que levavam os grãos colhidos de café para os terreiros após passarem pelo lavador.

A segunda foto nos dá uma idéia dos caminhos percorridos pelos grãos de café e como chegavam aos diversos pontos do imenso terreiro de tijolos. Impressionante!

Finalmente, a terceira foto mostra o conjunto de tanques utilizados para a demucilagem do café, num processo de preparo para secagem denominado fully washed, muitíssimo empregado nos países da América Central e Colômbia, por exemplo.

Isso nos dá a dimensão do que a região tem de história e estórias para contar…