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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

Filtering by Tag: Metabolismo

Subtropical, Serjão, Subtropical! – 3

Thiago Sousa

Temos um dilema em casa.

Minha filha adora banhos com água muito quente, diria que quase pronta para despelar tomates, enquanto que eu prefiro aquela com temperatura morna a fria. Da mesma forma, eu me sinto muito bem em temperaturas baixas (algo como 12ºC a 18ºC me fazem feliz), enquanto que minha filha adora dias calorosamente quentes.

O ser humano tem notável capacidade de adaptação aos diferentes climas porque fazemos parte de seleto grupo chamado de Animais de Sangue Quente, isto é, que tem um sistema para manter a temperatura corporal constante, conhecida como Homeostase. A temperatura do corpo humano é de 36,7ºC e se subir acima dos 40ºC nosso corpo literalmente começa a cozinhar, enquanto que abaixo dos 35ºC um colapso vem pela hipotermia.

De forma semelhante, plantas frutíferas como o cafeeiro, a macieira e a videira, que estão no grupo de vegetais mais sofisticados, tem uma temperatura ideal de trabalho, quando sua performance é máxima, ou seja, naquela que o metabolismo da planta está a 100%, como dizem os Fisiologistas.

É provável que você tenha ouvido dizer que as maçãs precisam de uma certa quantidade de horas de temperaturas baixas para obterem excelente qualidade. Até a década de 1980 haviam plantações de maçãs, principalmente da variedade Rainha, no Oeste de São Paulo, na região de Paranapanema. Nessa época as maçãs argentinas dominavam o mercado brasileiro com sua variedade Gala, de cores vibrantes e mais saborosas que as brasileiras de então.
Foi nessa época que se iniciou o cultivo da maçã Fuji nos planaltos de Santa Catarina, tendo Fraiburgo e São Joaquim como importantes pólos. Rapidamente essas maçãs conquistaram o consumidor brasileiro pela sua grande doçura em equilíbrio com umaesplêndida acidez, junto a uma textura divertidamente crocante.
Tudo isso é resultado do ajuste entre clima e macieiras, lembrando que essa é uma das regiões mais frias do Brasil, com nevascas certeiras em todos invernos.

A temperatura de 23ºC é considerada a ideal para o cafeeiro, quando seu metabolismo está em seu auge. No entanto, conforme a temperatura sobe, a performance da planta decai gradativamente até a temperatura crítica de 32ºC, condição em que o consumo de energia é maior do que sua produção (lembre-se da fotossíntese!). Em sentido contrário, temperaturas abaixo de 17ºC tendem a iniciar o processo de dormência no cafeeiro. Naturalmente, esses números podem sofrer discreta variação devido à variedade (= sua base genética) e insolação, entre outros fatores.

Assim como aconteceu com a produção de maçã nos altiplanos de Santa Catarina, estamos observando algo semelhante na cafeicultura. Sim, estou comentando sobre o Norte Pioneiro do Paraná.

Preste atenção neste mapa ao lado. Estes são os municípios que compõem essa região. No sentido da seta verde, que corresponde ao alinhamento Sudoeste-Nordeste, a altitude diminui à medida que segue para o Nordeste (de quase 1.000 m para menos de 500 m). Outro detalhe: aproximadamente 40% dessa região está abaixo do Trópico de Capricórnio, isto é, em autêntica área Subtropical, que é diferente do clima Subtropical de Altitude, onde se localiza mais de 80% da produção de café arábica do Brasil.

Levando-se em conta que nessa região as Estações do Ano são bastante distintas, principalmente com os dias são muito longos no verão e curtos no inverno, é razoável se esperar um comportamento diferente dos cafeeiros.

Certamente a mais importante constatação é o tamanho do ciclo de frutificação, que vai da florada ao ponto cereja (maduro): algumas variedades ultrapassam surpreendentes 300 dias!

Sim, o cafeeiro pode se comportar como uma típica planta de clima subtropical…

Subtropical, Serjão, Subtropical! – 2

Thiago Sousa

As origens de café em todo o mundo estão esparramadas entre os Trópicos de Câncer e Capricórnio.

Imagine a riqueza de combinações de fatores que influenciam a produção dessa fruta tão especial: solo, clima, insolação, variedades e tecnologias empregadas. No entanto, um aspecto chama a atenção: em geral, quanto mais próxima à linha do Equador está a origem, tanto mais elevada se encontra. Casos de Boquete, no Panamá, região ativamente vulcânica, com lavouras a 1.800 m de altitude, e Jabal Bura, no Yemen, com estupendos 3.000 m!

E quanto mais distantes do Equador, as lavouras de café ficam em altitudes menos impressionantes, como as que encontramos no Brasil, entre 750 m e 1.100 m. Como referência, as origens dos Cafés do Brasil se localizam entre as Latitudes 12ºS. e 24ºSul   

O ângulo de inclinação da Terra em relação ao seu Eixo Norte-Sul é de 23º 27’ e que corresponde, não por coincidência, aos números de Latitude dos Trópicos de Câncer e Capricórnio. Na verdade, essa latitude foi pensada como forma de compensar a inclinação da Terra.

Deve ficar claro que quanto mais próximo do Equador, mais intensa é a incidência dos raios solares. Por outro lado, se o local de maior incidência da luz do sol fosse exatamente a linha do Equador, caso a Terra não tivesse a inclinação, e tenha se tornado uma ampla faixa de 46º54’ (que corresponde a pouco mais de 5.100 km percorridos pela superfície terrestre ou a distância entre Buenos Aires e a Cidade de Panamá!) no total, com a inclinação, é razoável pensar que a faixa de maior concentração dos raios solares fique por volta de um pouco menos que a metade (isso devido ao fato da Terra ter um formato esférico), algo como 12º30' de latitude de cada hemisfério.

Nossos estudos têm encontrado com muita freqüência esse número em diversas origens, expressando um ponto em comum: a necessidade de sombreamento.

Sim, o sombreamento em origens de café com esta ou menor latitude é um modelo quase obrigatório em razão da intensidade dos raios UV. E aqui de novo uma outra característica inerente às coisas da Natureza: aquilo que dá a vida, também tira!

Raios Ultra Violeta são fundamentais para ativar o processo de fotossíntese das plantas, gerando energia e, portanto, vida. Porém, em excesso, necrosa as folhas, resultando num efeito mortal…

Portanto, a saída, na impossibilidade de se aplicar protetor solar em larga escala, é o emprego de árvores maiores que o cafeeiro e prover de sombra. Ou seja, é o retorno ao habitat original das primeiras plantas identificadas de Coffea arabica nas florestas da Ethiopia!

O sombreamento parcial, que ainda permite a passagem direta dos raios solares, é empregado sistematicamente em lavouras até essa latitude para dar melhores condições produtivas às plantas. Conforme a localização das lavouras cafeeiras se distanciam do Equador, tanto menor tem de ser o sombreamento.

Isto é fundamental para que um outro fator seja compensado: a “temperatura de trabalho” do cafeeiro, ligada ao seu metabolismo.

Se as condições de trabalho são no mínimo boas, certamente o desempenho será muito bom!