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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

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Nada será como antes

Thiago Sousa

O início do Século XXI foi marcado por uma longa e amargurante crise do mercado do café cru, como acontece de tempos em tempos. Apesar de apresentarem uma temática absolutamente semelhante, em cada quadro sempre são retratados elementos inéditos, que acabam por criar a identidade daquele momento.

Dois elementos saltaram aos olhos do mercado: o primeiro foi o exuberante aumento da produtividade média das lavouras cafeeiras do Brasil, que saltou olimpicamente de parcos 8 sacas de 60 kg/hectare no final dos anos 80 para mais de 23 sacas/ha; o outro, o surgimento de um novo país revestido de nova potência da cafeicultura, que era o Vietnan, que estava superando a Colômbia e assumindo o posto de segundo maior produtor mundial de café. Café da espécie canephora, é certo, porém um volume suficiente para ficar com folga à frente da Colômbia e todos os seusarabicas.

Enquanto isso, o mundo que consome café, a bebida quente mais consumida de todos os tempos, experimentava também uma formidável transformação, ampliando suas fronteiras como nunca, conquistando povos e esquinas até então inexploradas. Definitivamente beber café se tornou um hábito elegante e pleno de prazer ao redor do mundo.

O Espresso alcançou uma projeção até então impensável, assumindo o posto de Grande Embaixador das xícaras doNegro Vinho através das Competições Mundiais de Baristas (WBC – World Barista Championship), iniciadas na Europa e, em seguida, nos Estados Unidos até ganhar o Mundo.

Em meados dos anos 2.000, as cotações do mercado de café cru voltaram a assumir trajetória de subida, estimulando a renovação das lavouras decadentes, investimentos em maquinários de processamento de pós colheita e, como não poderia deixar de acontecer, novos investidores entrando no rol de cafeicultores. As novas tecnologias de produção adotadas no Brasil constroem lavouras de maior produtividade ede menor tempo necessário para sua primeira grande safra, entre elas as variedades modernas empregadas pelos cafeicultores, todas filhas de híbridos de Timor e de Vila Sarchi, portanto com um tanto de DNA de canephora. Costumo chamá-las de variedades de alto desempenho, como osCatucaís e Obatans.  

Nesse meio tempo, um dedicado grupo de técnicos do INCAPER – Instituto Capixaba de Pesquisas e Extensão Rural começou a apresentar variedades de canephora com muita aptidão para produzir bebidas de muito boa qualidade. Em paralelo, várias iniciativas vindo de empreendedores privados no Espírito Santo buscando apresentar novas facetas sensoriais do Conilon criaram o movimento doConilon Especial. Vale destacar o esforço em certificar um laboratório para promover os Exames paraR Graders, que é a certificação de juízes sensoriais especializados em robustas pelo CQI – Coffee Quality Institute.

Depois de atingir valores que rondaram os US$ 300 a saca de 60 kg para o café cru, as cotações no mercado comum de café cru iniciaram seu caminho descendente, que por vezes se pareceu com movimento de queda livre. Foi quando observou-se o quanto o canephora (Robusta e Conilon, por exemplo) havia tomado espaço do arabica em muitos blends do grande mercado de café.

Com um custo de produção sensivelmente mais baixo, que se reflete no preço de aquisição pelas indústrias torrefadoras, rapidamente o famoso grão “bicudinho” conquistou a preferência dos compradores. Justifica-se o fato de que é muito melhor comprar um robusta de boa qualidade, isento de defeitos capitais de bebida, do que um arabica de baixa qualidade pelo mesmo preço, para compor os blends de grande escala.

A escassez de um dos produtos, no caso dos grãos crus de arabica, sempre provoca, além de uma reacomodação do mercado, uma busca por novas tecnologias de produção industrial. Por outro lado, promove um efeito perverso entre os produtores, que se desestimulam a produzir grão se melhor qualidade, pois o grande mercado paga preços muito bons mesmo para cafés arabica medianos nesses períodos.

A crescente elevação do padrão de qualidade de robustas vem surpreendendo o mercado. Ainda que timidamente, alguns baristas de renome começaram a usar blends com Robustas Especiais em alguns eventos, pois há uma certeza de se obter uma Crema espessa e abundante, valorizando seus Espressos.

Com um teor de lipídeos dobrado em relação às variedades do arabica, a nova geração de canephorasestá conquistando um novo espaço: o remodelado mercado de cápsulas para espresso, onde a Cremaabundante é sinal de qualidade para o consumidor médio. A queda de algumas das patentes da Nespresso, líder absoluta no segmento de cápsulas, escancarou as portas para um imenso número de novos competidores, fazendo do preço para o consumidor ou operador o novo balizador desse mercado.

É um segmento que está se tornando tão competitivo quanto o dos blends de Café para Todos os Dias encontrados nas prateleiras dos supermercados. Ou seja, vislumbra-se essencialmente uma briga de cachorro grande…

Para tornar o cenário ainda mais complexo, veio à público a patente requerida em 2008 pela gigante internacional do segmento de cafeterias, a Starbucks, de processo industrial para melhoria de qualidade de robustas earabicas, como pode ser visto neste link do departamento de patentes dos Estados Unidos: http://appft1.uspto.gov/netacgi/nph-Parser?Sect1=PTO1&Sect2=HITOFF&d=PG01&p=1&u=/netahtml/PTO/srchnum.html&r=1&f=G&l=50&s1=20080299283.PGNR.

Através de diferentes processos que envolvem desde tratamento com soluções aquosas com precursores de moléculas importantes para a alta qualidade percebida até o uso de sistemas de troca iônica para a extração de substâncias indesejadas, a Starbucks pretende, a partir de grãos de baixa qualidade, melhorar sensorialmente seus atributos, retirando tudo o que é de ruim ou inserindo o que pode torná-lo bom.

Esta iniciativa da Starbucks está inaugurando uma Nova Era do Café, quando a qualidade deixa de ser algo originalmente produzido na Natureza e pelas mãos dos cafeicultores, passando para a indústria a missão de ajustar artificialmente a qualidade sensorial dos cafés que serão bebidos.

Como primeiro impacto observado, cai por terra toda e qualquer iniciativa ligada à Origem do Café, suas Denominações e Tipicidades.

Definitivamente, nada será como antes… 

Ou será que outras soluções virão a galope?

Escolhendo o melhor café do Brasil de 2012

Thiago Sousa

A Safra de Café, como todas as coisas que são regidas pela Natureza, tem altos e baixos em razão dos humores climáticos, que  particularmente nesta de 2012 foi quase desastrosa. O Outono no Brasil tem como característica ser mais seco e menos chuvoso, principalmente em suas regiões mais continentais; porém, o que aconteceu neste ano foi uma situação “tipicamente atípica”…

Imagine que num dos meses em que as temperaturas ficam bem mais baixas da média e, por isso mesmo, com tendência a um clima mais seco, o que se presenciou foi a chegada de chuvas torrenciais. O Norte Pioneiro do Paraná, por exemplo, registrou um dos seus Outonos mais molhados de todos os tempos, chegando ao Estado de Calamidade devido às enchentes!

Por outro lado, a Bahia e suas regiões cafeeiras experimentaram um ano de clima muito seco, que prejudicou muitas lavouras e sua produção. Tristeza.

Assim sendo, foi uma safra difícil. Chuva no momento da colheita, quando os frutos precisam iniciar seu processo de seca rapidamente para se evitar problemas de qualidade nas sementes, é problema na certa!

Ambiente perfeito para o ataque de fungos, bolores e bactérias, que provocam fermentações indesejáveis e apodrecimento acelerado dos frutos e suas sementes. Ou seja, a qualidade vai literalmente para o vinagre…

No entanto, produtores caprichosos e de espírito preparado para essas intempéries, conseguem dar sequência ao seu ofício e obter lotes fantásticos de café. Definitivamente não é tarefa fácil.

ncursos regionais, organizados nas mais diferentes microrregiões cafeeiras. Os lotes vencedores em seus respectivos torneios regionais seguem para a grande final Estadual. Neste ano aconteceram Concursos Estaduais em São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Espírito Santo. A Bahia, em razão da forte estiagem e consequente problemas de qualidade, excepcionalmente não realizou sua competição. Uma pena, pois já se tornaram reverenciados os cafés produzidos na sempre deslumbrante Chapada Diamantina e sua ausência foi muito sentida.

Como sempre, convidamos para formar o Comitê Técnico profissionais que tenham intimidade com a Metodologia SCAA de Avaliação de Café, além da disposição para se aplicar à Metodologia do PQC – Programa de Qualidade de Café da ABIC.

Neste ano participaram, a partir da direita na foto acima, a barista Isabela Raposeiras, o Q e R Grader Joaquim Inácio Neto, o Q Grader Surfista Edgar André Gomes, a Maria Gabriela Pariz, do GAC da ABIC, e eu, seu Coffee Traveler.

Tarefa árdua, muitas xícaras provadas às cegas, que exigiu muita concentração e  talento de todos os profissionais do Comitê, que tive a assistência do Felipe Gaspar e a presença indelével da auditora Celina de Almeida. Sim, não dispenso auditoria full time num evento dessa importância!

Apesar das dificuldades climáticas, alguns lotes de café concorrentes atiçaram a imaginação de todos os juízes para o seu potencial numa xícara de café. E Minas Gerais foi o Estado que deu origem aos grandes campeões (saiba mais pelo link www.abic.com.br). Tenho certeza de que se você tiver a oportunidade de provar um dos lotes de ponta, também ficará com um sorriso de felicidade depois de cada gole…