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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

HISTORIA

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PALADAR 2013: a consciência da cultura brasileira

Thiago Sousa

E vem aí o PALADAR Cozinha do Brasil 2013   (http://www.estadao.com.br/paladar/cozinha-do-brasil-2013/) em São Paulo, de 03 a 05 de maio!

Já em sua sétima edição, este evento vem ganhando musculatura, diversidade e mais sabedoria ao longo dos anos, introduzindo as muitos boas Atividades Externas (que são aulas que podem acontecer em restaurantes e até nos sítios de produtores dos ingredientes escolhidos por alguns Chefs) e o Menu Paladar (com restaurantes e cafeterias oferecendo pratos e bebidas especialmente selecionadas).

Tenho sido convidado a dar aulas desde 2009, sua terceira edição, e a evolução do evento é muito impressionante.  Seu início foi um manifesto sobre a preservação da cultura culinária brasileira, mas que foi ganhando corpo e, principalmente, Norte sobre o papel que hoje tem. Falar de como pedaço do Brasil prepara um determinado prato e os ingredientes usados é, antes de tudo, preservar o que cada povo possui de mais valioso: sua cultura.

Muitas plantas podem ser cultivadas em diversas localidades, porém em cada uma, além das influências da Geografia, ao serem utilizadas como ingrediente na alimentação representam a forma como cada grupo de pessoas se relacionava. Por exemplo, em locais onde as conservas são mais frequentes, é sinal de que os ciclos de escassez deveriam fazer parte da vida daquelas pessoas e que ter alimentos preservados era a certeza de que não passariam fome.

O Brasil, com suas dimensões grandiosas tanto na Latitude quanto  na Longitude, tem o privilégio de manter um fantástico acervo de biomas, permitindo que um sem número de Produtos de Territórioaflorem.

Com vocação para o chamado sistema de Plantation na agricultura a partir da Cana de Açúcar, o Brasil no final do Século XIX alcançou o posto de maior produtor mundial deCafé, ultrapassando a Indonésia, que havia reinado por mais de 300 anos absoluta nessa posição. Em minhas andanças e pesquisas, dentre as quais a de reproduzir todo o Trajeto do Café no Brasil, percebi como a sua relação com a Cana de Açúcar era forte, ambas quase sempre juntas ou uma substituindo a outra. E como a mais eloquente e genuína representante dos teores etílicos do Brasil, a Cachaça, que agora reconhecida mundialmente como bebida tipicamente brasileira, muitas vezes abriu as trilhas para o Café.

É nesse contexto histórico que o super expert em  Cachaças, o cachacieMaurício Maia, e eu apresentaremos uma aula (dia 03 de maio, 18h00) sobre a relação entre ela e o Café em diferentes territórios.

A degustação será o ponto alto!

Imagine saborear exuberantes cachaças em harmonia com excelentes cafés…

Diversos Chefs vem fazendo excepcional trabalho de estímulo à produção de ingredientes que estavam se perdendo devido ao movimento de migração para as grandes cidades como o Mel de abelhas nativas, a grande pesquisa que o Thiago Castanho vem fazendo com vegetais da Amazônia ou os deliciosos queijos brasileiros produzidos de Norte a Sul, sem falar no trabalho do premiadíssimo Chef Alex Atala de manutenção das comunidades locais com sua cultura.

Resgatar um pouco da história, além de apresentar tendências e técnicas inovadoras, faz parte desse grande caldeirão que se tornou o Evento. E para colaborar, a historiadora Ana Rita Suassuna irá contar como o Sertanejo Nordestino preparava o seu café (hummm… será que existe uma versão sertaneja da French Press?!) junto com outros ricos detalhes, enquanto que eu prepararei cada forma para tornar a história ainda mais viva!

E é claro, com direito a apreciar todas as xícaras!

É um convite que faço a todos para irem ao Paladar 2013, principalmente pela riqueza de conhecimento e sabores que vocês poderão conhecer!

O Café de Pedra e o Café Cabeludo – Uma prosa deliciosa com Ana Rita Suassuna

Thiago Sousa

O Brasil tem Sertão e Sertão. Tem o Sertão que fica no Sudeste, de matas bonitas e exuberantes que só a Serra do Mar poderia ter, mas também tem o Sertão Nordestino, que convive parte com a fartura que a chuva traz e experimenta também a seca prolongada e angustiante. E assim, a escassez desperta no sertanejo o espírito do zelo com a comida como em nenhum outro lugar.

 Relatos desse preciosismo nordestino com o alimento, antes passados oralmente e que foram preservados graças à memória e mãos de Ana Rita Suassuna, escritora de deliciosa estampa e conhecedora nativa daquela realidade, chegam ao conhecimento do Povo do Sul através de livros como o Gastronomia Sertaneja*.

Ana Rita, como gosta de ser chamada (nem pense em tratá-la por “Dona” ou “Senhora” porque a faz “infeliz”…), tem um cabedal de histórias e casos deliciosos de ouvir, além de apresentar utensílios e preparos que deles saem junto com algo de divertida eloquência. Nordestina e tipicamente sertaneja…

Durante o Evento PALADAR COZINHA DO BRASIL, no finalzinho de julho, em São Paulo, SP, ela me fez duas perguntas danadas de boas: “Você sabe o que é Café de Pedra?” e “E o Café Cabeludo?”. A bem da verdade, houve uma terceira, que foi “Conhece o Café com Rapadura?”.

O Café com Rapadura, bem como suas variações com o açúcar mascavo e cristal, eu conhecia há muito tempo, tanto como modo de torrar quanto de preparo, comum pelo interior do Brasil. No caso, ela se referia ao café preparado com rapadura dissolvida na água, que assume papel de costume tão arraigado que quase se parece com umBaião de Dois para beber…

Caipiramente pelo interior adentro do Sudeste, o Café com Rapadura é um retrato da cultura desbravadora do Bandeirante e mostra como esses dois produtos da terra eram tão próximos aos exploradores das fronteiras mato adentro.

Café de Pedra não tem parentesco com a Sopa de Pedra, que faz parte da Antologia dos Contos Caipiras. Conheci no interior da Bahia e de Minas Gerais esse preparo. Na verdade, uma pedra “de estimação”, de preferência arredondada e sem porosidades, era posta junto às brasas da fogueira que os tropeiros faziam para preparar as refeições e, também, se aquecer. Depois de bem aquecida, bem “pelante”, era colocada num bule que recebia o pó de café e a água.

É uma clássica infusão, devendo o pó de café ser fino para precipitar mais facilmente, depois de devidamente mexido e, conforme o gosto pessoal, adoçado.

Veja que a pedra “pelante de quente” é muito prática, pois pode acompanhar o tropeiro ou sertanejo por onde ele for, sem ocupar espaço no embornal, além de ter profundo espírito ecológico devido à sua total reutilização…

Como parte da etiqueta sertaneja, canecas em ágata fazem o conjunto perfeito!

E o Café Cabeludo?

Bem, para responder esta pergunta, tive de revirar minhas anotações e memória… não foi de “bate pronto”.

Como a própria Ana Rita me disse (“Já vi Café Cabeludo até no Google!!!”), fui ver o que era. E descobri que já conhecia também, porém com outro nome: Café de Tição, que provei no interior de São Paulo, na Sorocabana!

Num bule com água que vai ao fogo é colocado o pó bem fino, até chegar à fervura. E aqui temos uma outra infusão, desta vez muito mais próxima ao Ibriq, que é o preparo mais antigo do mundo. O Café Cabeludo difere do Ibriq porque ao invés do bule ser retirado do fogo quando o líquido ferve, repetindo-se este ato por até 3 vezes até que o pó precipite totalmente, pode ter um pedaço de carvão em brasa rapidamente mergulhado no café ou ter um pouco de água fria despejada. Como resultado, há a formação de grossa camada delicadamente cremosa e revolta na superfície, lembrando uma despenteada cabeleira.

Observe na foto a formação de estrias depois de um pouco de água fria ser colocada, parecendo rastros ou mechas de aloirada peruca…

Tente fazer também um desses cafés, experimentando, assim, o autêntico espírito sertanejo num bule de café!

*GASTRONOMIA SERTANEJA – Receitas Que Contam Histórias (Editora Melhoramentos, 2010)