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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

HISTORIA

Filtering by Tag: Educação Sensorial

O inefável raio gourmetizador versus o bom senso

Thiago Sousa

Nos dias de hoje, devido à velocidade que a internet impregnou na disseminação das notícias, idéias e conceitos, rapidamente as palavras podem ganhar super exposição, vindo a perder, muitas vezes, o seu sentido original.

Uma delas é a palavra GOURMET, que originalmente do francês tem o significado de “aquele que sabe apreciar e degustar vinhos”. Porém, já em meados do Século XIX, a palavra ganhou maior amplitude ao somar “entendedor e apreciador de boas mesas”. Posteriormente, passou a funcionar como um adjetivo para “aqueles que preparam alimentos com alta qualidade”.

Isso me lembra uma passagem interessante do Mercado do Café Torrado: em 1999 a ABIC resolveu criar um novo programa para complementar o identificado pelo SELO DE PUREZA ABIC, baseado no conceito de Qualidade do Café.

Para isso, foram estabelecidas Categorias de Café que identificariam ao consumidor a Qualidade Sensorial do Produto. Assim nascia o PQC – Programa de Qualidade do Café da ABIC, que pode ser melhor compreendido através do seu website (www.abic.com.br). São três as categorias: Tradicional, Superior e Gourmet.

Para possibilitar a classificação dos produtos das indústrias, criou-se aprimeira Metodologia de Avaliação Sensorial de Café Industrializado/Torrado do Mundo que emprega pontuação de Zero a Dez pontos: Tradicional (Nota de 4,5 a 5,9), Superior (Nota de 6,0 a 7,2) e Gourmet (Nota de 7,3 a 10,0).

Ainda esta metodologia estava em fase de estruturação quando uma das empresas associadas à aquela entidade lançou produtos com o o nome GOURMET associado. Naturalmente foi uma grande novidade para o mercado, gerando muito impacto na mídia ao mesmo tempo que um enorme desconforto ficou no grupo de trabalho da ABIC.

A lição que ficou é que a simples adoção do adjetivo não significava que o conteúdo fosse de fato de excelente nível, principalmente porque ainda não havia uma metodologia para atestar qual era sua verdadeira classificação.

Se observarmos as pontuações e, sugiro, forem experimentadas as marcas autorizadas a estamparem os respectivos Selos PQC. Apesar da nota relativamente distante da notória Nota 8,0 ou os famosos 80 pontos SCAA/Specialty Coffee Association of America que representam a barra mínima para um Café ser considerado Especial,  os 7,3 PQC estão mais próximos, por exemplo da metodologia empregada pelaBSCA/Associação Brasileira de Cafés Especiais. Esta é a razão pela qual a BSCA tem utilizado como sua barra, principalmente para concursos, a nota 84 pontos CoE/Cup of Excellence.

Aproveitando o caminho aberto por uma das grandes empresas do mercado, outras seguiram o exemplo, proliferando-se rapidamente o número de marcas de Cafés Gourmet no mercado Brasileiro. Uma das características mais interessantes era o fato de que como o serviço de Espresso estava ganhando muita projeção, as diversas indústrias que estavam apostando fichas nesse novo segmento o faziam empregando lotes de café com peneiras maiores, as chamadas Peneiras 17 /18.  Entre as torrefações havia a crença de que o tamanho dos grãos era sinônimo de qualidade, pois, evidentemente, há uma diferença de preços entre lotes com cafés de grãos menores, como os Peneiras 14/16, e os de Peneiras 17/18.

Só para se ter uma idéia de grandeza, uma semente crua de Peneira 14 tem diâmetro médio de 5,56 mm, enquanto que uma semente de Peneira 176,75 mm.

Foram necessários muitos anos para que o mercado começasse a mudar e o consumidor, mais aberto às diferentes experiências com cafés, notar que a Qualidade está ligada com os Aromas & Sabores, que devem ser sempre agradáveis, sem causar sofrimento para beber o conteúdo de uma xícara…

A melhora do poder aquisitivo do brasileiro contribuiu muito para melhorar a percepção da qualidade dos produtos através da possibilidade de viajar para diferentes países e, assim, experimentar produtos e serviços de qualidade superiores aos oferecidos em nosso país.

É a experimentação e vivência que possibilitam a criação da mais importante “arma” do consumidor: a capacidade de comparar!

Bom Senso sempre supera a aceitação de produtos que não são exatamente aquilo que se autoapreagoam, distando muito quando apreciados com o espírito, digamos, desprendido e “pé no chão”.

Infelizmente, a Síndrome do Nouveau Riche ainda permanece no ar e muitas pessoas simplesmente ostentam ao invés de apreciar, o que fez surgir oInefável Raio Gourmetizador! Rá!!!

Esse Raio de efeito devastador criou uma Onda Gourmet de proporções Tsunâmicas, atingindo segmentos até então impensáveis como a Tapioca Rude Gourmet ou Maçarico Gourmet! Isso sem falar nas Varandas e os Etecetera & Tal Gourmets.

Uma simples água mineral de uma grande empresa, vendida em garrafas plásticas ultra finas, ao trocar de embalagem mais robusta, tem seu preço triplicado. Esse é o resultado do Raio Gourmetizador!

O que distingue, realmente, um bom produto de outro que faz parte desse folclórico nicho, são dois aspectos: a qualidade dos ingredientes e sua execução.

As coisas bem feitas saltam aos olhos e são verdadeiros afagos ao Palato, traduzindo-se em verdadeiras Experiências Sensoriais. Como deve ser!

É a qualidade dos ingredientes e a execução da receita que definem, em boa parte, os preços dos produtos, principalmente no caso dos alimentos. Produtos da grande indústria em geral não primam pelo uso de matéria prima de excelente qualidade pelo simples fato de que sua equação econômica segue um preceito básico: custos baixos para preços de venda elevados.

Perceba que para se obter algo de alta qualidade, os ingredientes devem ser muito bem selecionados, não indicando propriamente que o valor do produto final tenha de ser estratosférico.

Não importa o produto que você irá escolher para APRECIAR: café, chocolate, tortas, bolos, sushi, cerveja ou mesmo um complexa água… o que vale é reconhecer que ao final a Experiência valeu a pena!

Para isso, basta confiar em seus sentidos. Se por acaso se sentir intimidado pelo ambiente ou por quem está servindo, feche os olhos, respire fundo e deixe-se guiar por você mesmo!

SLOW FOOD: Em busca das raízes

Thiago Sousa

A combinação do crescimento da população urbana, da necessidade de atender a demanda por alimentos e dos avanços tecnológicos da indústria de alimentos fez surgir um tipo de comida que é conhecida como Fast Food. Na realidade, o nome Fast não vem apenas da raiz da palavra, que significa “rápido”, mas de todo um conceito de padronização de procedimentos, de processos e de produtos. O serviço final, que também deve ser fast, acaba sintetizando esse conceito.

Imagine só: quantos sanduíches são vendidos numa grande rede, seja do “M” amarelo ou do “B” vermelho?

Certamente são números grandiosos. Se cada sanduíche tem, digamos um hamburger de 120 gramas, que nem é apenas material cárneo, pense na quantidade de matéria-prima necessária para atender toda essa demanda!

Além disso, como a padronização de produto tem de ser rigorosíssimo, temperos e conservantes tem de ser adicionados incondicionalmente para que cheguem às centenas de lojas em todo país, partindo de pouquíssimas unidades fabricantes, com, digamos, características aceitáveis para o consumo.

O movimento SLOW FOOD iniciou-se na Itália, em 1986, como um manifesto contra a “Cultura de Massa” que o Capitalismo estava impondo na Europa. Sim, esse movimento começou com viés socialista liderada por pessoas da chamada Esquerda Italiana. Hoje, porém, politicamente a Esquerda Italiana está considerada acabada e o Slow Food alçou vôos mais amplos, muito além de uma simples ideologia política.

Contando hoje com mais de 100.000 membros de 132 países, tornou-se antes de tudo um movimento de busca e preservação das raízes culturais e, também,  de alimentos tradicionais. Imagine uma grande Arca de Noé onde os “passageiros” fossem os alimentos como frutas, legumes, folhas e mesmo cogumelos, alguns em risco de extinção: esta é um dos grandes projetos dessa hoje respeitada ONG.

Outro projeto muito bacana é o de Educação do Paladar, voltado para as crianças, que serão os consumidores conscientes do amanhã, bem como os futuros formadores de opinião. Não existe melhor caminho que a educação, principalmente dos “pequenos” para transformarmos o Mundo.

A Educação do Paladar é um grande laboratório sensorial, onde reuniões em sítios e fazendas permitem o contato com as coisas naturalmente produzidas. E aí é possível compreender o tripé que hoje sustenta a Missão Slow FoodBomLimpo e Justo.

Para se atingir esses objetivos (B + L + J), a conexão do produtor com o consumidor ou aquele que tem a facilidade de chegar ao consumidor é a chave mestra! Conexão real, sem intermediários, com total transparência. É o que encontramos no chamado Fair Trade (= Comércio Justo), principalmente nos projetos de produtosOrgânicos e Biodinâmicos ou, simplesmente, quando é feita a conexão de produtores que fazem excelentes trabalhos com pessoas que querem consumir coisas desse perfil.

Nesse ponto, gostaria que vocês vissem a série de posts onde comento sobre os Pequenos Grandes Competidores, produtores de café que tem esse perfil. Algumas histórias são emocionantes, como a da família da Isadora Reis, que muito gentil prepara e serve um cafezinho típico de roça a todos que visitam seu pequeno sítio já certificado pelo Governo de Minas Gerais.

Colocar produtores que procuram fazer tudo com excelência em contato com os consumidores e formadores de opinião é uma experiência incrível, que, felizmente, tenho tido em grande escala.

Todos estes sentimentos foram trazidos à tona depois de um frutificante e saborosíssimo encontro com o Chef Sauro Scarabotta (ao centro, nesta foto), com quem tive a honra de dividir mesa juntamente com o Companheiro de Viagem Gilberto Manso, da Belini Pães & Gastronomia, de Brasília, neste último sábado.

O Chef Sauro, proprietário do Friccó, em São Paulo, é famosíssimo pela maestria em preparar o tradicional prato que dá nome ao seu restaurante, além de um adepto e disseminador do Slow Food no Brasil. Ele esteve em Brasília para participar do Terra Madre Brasil 2010, evento ligado ao Slow Food, que iniciou-se no dia 19 e encerrou as atividades hoje, dia 22, e que trouxe o atual presidente do movimento, Carlo Petrini.

Para saber mais sobre o Slow Food, acesse www.slowfood.com e www.terramadre.slowfoodbrasil.com .