A Bebida Rio e sua origem
Thiago Sousa
O cafe pode ser classificado em função de sua bebida, sendo que no caso da COB – Classificação Oficial Brasileira, ha uma referencia que eh a chamada “Bebida Dura”
Esta bebida tem como característica o fato de, em tese, apresentar “Bebida Limpa”, ou seja, sem os chamados “Defeitos Capitais” que são os decorrentes dos grãos Pretos (que sofreram fermentação fenolica e conferem sabor, digamos, amargosamente “medicinal”), os Verdes (que transferem grande adstringência aa xícara) e os Ardidos (que sofreram a fermentação acética, deixando o sabor do vinagre no cafe). Eh o famoso “Trio PVA” !
Abaixo dessa referencia, o cafe pode ter sua bebida classificada como “Riada”, “Rio” e “Riozona”, principalmente quando os compostos fenolicos estao mais presentes. O cheiro desses compostos fenolicos lembram o “creosol”.
O Companheiro de Viagem Almir da Silva Filho, da industria Cafe Toko, baseado em Juiz de Fora, nos contou a interessante origem do cafe com a “Bebida Rio”, que passo a seguir.
Nesta foto, Almir, muito conhecido como Mizinho ou, mineiramente, Mizim, estah ao centro, com o grande amigo Mane Alves, aa direita, e eu, seu Coffeetraveler, aa esquerda.
Por volta do ano de 1760, numa visita ao Governador do Maranhão, o Governador do Rio de Janeiro recebeu como presente mudas de cafe, que foram entregues a Frades Capuchinhos ao retornar ao Rio. Estes frades multiplicaram as mudas e distribuíram entre os fazendeiros da região do Vale do Rio Paranaíba, dentro da Província do Rio de Janeiro. Estes fazendeiros fizeram aflorar uma cafeicultura que se estendeu de Resende, Vassouras e Valenca ateh Juiz de Fora.
Em 1792, a Sesmaria de Vassouras, atraves de Francisco Rodrigues Alves e Luiz Homem Azevedo, tornou-se a Primeira Capital do Cafe, em pleno Seculo XIX !
Foi o incio do periodo do “Baronato do Cafe”, quando os fazendeiros, enriquecidos pelo fabuloso grao de cafe, adquiriam titulos de nobreza concedidos pela Familia Real instalada no Brasil.
Sobre este assunto hah um interessante video produzido pleo Marcos Sa Correa entitulado “O Vale”, que aborda o opulencia e decadencia dessa regiao que teve o cafe como locomotiva de seu progresso.
Nessa epoca, a colheita do cafe seguia este ritual: inicialmente o chao era limpo com enxada, quando eram retiradas as ervas daninhas e a terra ficava exposta. Esse processo, ainda empregado em algumas regioes brasileiras, recebe o nome de arruacao.
Esperava-se o grao de cafe maduro ou passa cair para, entao, ser “levantado”. Como essas regioes fluminenses sao montanhosas, a umidade do ar era muito alta, de forma que o chao molhado fazia com que reacoes de fermentacao indesejaveis se iniciassem nos graos de cafe, principalmente os de natureza bacteriana.
Depois de levantados, os graos seguiam em sacos nos lombos dos burros ate as sedes das fazendas, que normalmente se localizavam na area mais proxima aas nascentes de agua e, portanto, mais baixas, onde era maior a umidade do ar.
Os cafes que chegavam da lavoura eram, entao, amontoados com o objetivo de “queimar o mel do cafe” como forma de acelerar o processo de secagem.
Os graos “cerejas”, como sao denominados os maduros, tem grande quantidade de acucar em sua mucilagem e quando amontoados inicia-se o processo de fermentacao alcoolica e, em seguida, a acetica devido aa ausencia de oxigenio.
Os graos em estado “passa”, parcialmente desidratados, nessa amontoa, sao induzidos aa fermentacao bacteriana, produzindo os compostos fenolicos. Lembre-se do sabor do “fel” para ligar com o que corresponde aa bebida fenolica…
Depois de dias, observa-se um corrimento escuro desse monte de cafe, alem de uma “fumaca”, que nada mais eh do que o vapor de agua, jah que essas reacoes de fermentacao liberam calor.
Nesse momento, o cafe era “aberto”, ou seja, esparramado no terreiro para finalizar a secagem.
O cafe do Vale do Paranaiba era levado para o Porto do Rio de Janeiro por facilidade e menor distancia. Desde aquela epoca, os cafes produzidos em Sao Paulo seguiam para o Porto de Santos, enquanto que os do Parana, para o Porto de Paranagua.
Esse sabor “diferente”, acre, amargo e intenso, que se destacava do cafe produzidos, por exemplo, nas outras duas regioes, e acabou recebendo o nome do porto de escoamento: Rio.
Com o esgotamento das terras do Vale do Paranaiba, a cultura migrou para o norte, em busca de solos ainda ferteis.
Assim, no final do Seculo XIX, a cafeicultura se instalou a partir de Juiz de Fora ate o municipio de Caratinga, regiao que ficou conhecida como Zona da Mata.
As praticas para a colheita e secagem do cafe seguiam a mesma receita do cafe produzido no Vale do Paranaiba, porem como esta nova regiao, que tem a Serra do Caparao como fundo, eh muito serrana e um clima muito mais umido devido aa presenca da Mata Atlantica, o sabor “diferente” do cafe produzido no Vale se reproduziu com maior intensidade. A partir dessa constatacao, a bebida corrente do cafe produzido na Zona da Mata recebeu o nome de Riozona.
Com o tempo, os produtores da regiao da Zona da Mata descobriram o potencial de alta qualidade que possuem e, por isso mesmo, fizeram um movimento para que a regiao fosse reconhecida como Matas de Minas, nome que arremete aa bebida especial que a regiao pode oferecer.
Ainda assim, muito desse cafe com sabor Rio e Riozona faz parte de blends de muitas industrias brasileiras, ate pelo habito arraigado de se tomar “cafe de garrafa termica” ou o cafezinho dos bares e padarias servido no indefectivel copo de vidro.