Contact Us

Use o formulário à direita para nos contactar.


São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

Coffee Break: a hora do cafezinho

Thiago Sousa

O café é talvez a bebida que melhor traduz hábitos globais, antes das marcas internacionais de refrigerantes, cigarros ou outros produtos. Tanto faz parte da cultura mundial que o momento de descontração ou pausa de uma jornada de trabalho é chamada de “A Hora do Cafezinho” ou “Coffee Break”!

Interessante, não?

Por isso mesmo é que, no meu entendimento, esse momento deveria ser melhor preservado nas empresas… Afinal, é quando o pessoal literalmente “recarrega” suas baterias!

Pense bem: dentre os benefícios do café temos uma melhora na concentração e na memória recente, fruto da ação dos “ácidos clorogênicos, cafeína e companhia” em nosso cérebro.

Portanto, o cafezinho e suas outras formas de preparo podem auxiliar grandemente no desempenho profissional das pessoas.

Por outro lado, um café com bebida de baixa qualidade pode subverter tudo isso.

Infelizmente, no Brasil ainda boa parte dos cafés torrados vendidos a preços mais competitivos são compostos por grãos que sofreram fermentação bacteriana e que dão a chamada bebida “Riada” e “Rio”.

Essa fermentação ocorre quando os grãos já estão em sua fase ”passa”, ou seja, já passaram pelo auge da maturação e começam a se desidratar, e, devido às condições climáticas desfavoráveis como grande umidade relativa do ar, os microorganismos iniciam o ataque às estruturas proteicas (= proteínas). Tecnicamente, é meio caminho ao apodrecimento do grão…

E no caso do café o efeito é terrível, pois o sabor da bebida “Riada” é devido à presença de compostos fenólicos.  

Compostos fenólicos possuem um anel benzênico e uma das ligações com a presença de um radical -OH.

Nesta figura em 3 dimensões os átomos de carbono estão em cinza escuro, enquanto que os de hidrogênio estão na cor branca e o de oxigênio em vermelho.

O grande problema dos compostos fenólicos é que possuem um sabor muito amargo, como fel (vem defenólico), de grande intensidade.

Lembram-se de que o limiar de percepção humana para o sabor amargo é de 1:2.000.000?

Pois é, então basta uma gota desse amargor num oceano de doçura para tornar a bebida ruim…

Além disso, os compostos fenólicos em geral são corrosivos e atacam a membrana mucosa. Daí o fato de que beber café elaborado com esses grãos em geral provocam queimação no estômago!

Se alguém lhe disser que “beber café dá queimação no estômago”, você já sabe de onde isso surgiu…

Portanto, em sua próxima pausa para o cafezinho, verifique o que você irá beber. E, naturalmente, exija bebidas melhores, pois todos sairão ganhando com isso…

Afinal, um momento de descontração tem de ser prazeiroso em todos os sentidos! 

Cafezinho, coffee & espresso

Thiago Sousa

Qual a melhor forma de preparar o café?

Bem, podemos dizer que o preparo ou serviço de café tem um papel decisivo no resultado final, isto é, na xícara, mesmo que sejam utilizados os mesmos grãos torrados.
Existem vários tipos de preparo, cada qual, inclusive, carregando fortes componentes culturais.

Outro aspecto muito importante é que o conceito do que é “melhor”, na verdade, é totalmente relativo, pois está ligado à cultura de uma região ou país, além de ter o componente pessoal.

Admitamos, então, que os grãos de café estejam torrados adequadamente, isto é, sem estarem excessivamente torrados ou queimados.

O sabor de queimado, que comentei num post anterior, aparece quando o café, assim como um pão ou uma carne no espeto, estão carbonizados, conferindo um amargor seco típico, que independe do alimento ou bebida envolvida.

A diferenciação do serviço começa pela concentração de café na água. Vejamos:

O espresso é preparado com moagem média-fina dos grãos, e, em seu preparo clássico italiano, deve manter uma proporção de 7 gramas de pó para se extrair 30 ml de bebida. Tecnicamente, é mantida uma relação 1:4, pois 30 ml correspondem a uma onça líquida, enquanto que uma onça-peso corresponde a 28 gramas. Ora, 7 gramas são exatamente uma quarta parte da onça-peso, de onde se explica a relação 1 para 4. Deve ser lembrado que a extração é feita sob alta pressão (mais de 9 vezes a pressão atmosférica) e em tempo curto, em média 25 segundos para essa medida.

O Cofffee como é tradicionalmente consumido na América do Norte e no Japão, principalmente, é mais diluido, sendo que os mesmos 7 gramas de pó, com uma moagem média, menos fina a que a empregada no espresso, resultarão em uma dose de 150 ml.

Vejam: é 5 vezes mais diluído que o espresso !

Outro detalhe, é que o “coffee” é preparado, geralmente, em filtro de papel, tecnologia que hoje está presente em residências de todo o mundo. O tempo médio de preparo, ou seja, de contato da água com o pó e a extração, fica em torno de 4 minutos.


O cafezinho, como tradicionalmente é preparado no Brasil, envolve um ritual muito interessante: o pó é colocado na água fervente antes de ser despejado num filtro de algodão para ser coado. É empregada uma moagem bastante fina, o que aumenta a área de contato do café com a água. E a relação de pó e água muda novamente: em média os 7 gramas, que estamos usando como referência para facilitar a explicação, resultam numa dose de 70 ml. Ou seja, um pouco mais que o dobro da concentração do “coffee” americano…

O tempo de contato é bastante longo: entre a infusão, quando o pó e posto na água em fervura, até a passagem pelo coador, decorrem em média entre 5 e 7 minutos. Também, o coador de pano possui uma malha mais “grossa”, como se fala tecnicamente, ou, traduzindo-se, os orifícios do tecido são relativamente grandes, permitindo que uma quantidade maior de substâncias dissolvidas na água passem por ele.

Daí o fato que o cafezinho preparado no coador de algodão aparenta ser menos translúcido e mais “untuoso” ao beber que o preparado em coador de papel, que é mais usualmente empregado nas residências urbanas, hoje. O filtro de papel tem uma malha muito mais “fina”, ou seja, fechada, retendo sólidos solúveis de estrutura maior. Isso se reflete, também, no “corpo” da bebida, que é a sensação tátil percebida ao bebermos o café (mais “ralo” = pouco encorpado, muito “denso” = encorpado).

Naturalmente, o cafezinho preparado no coador de algodão sempre será mais encorpado.

Levando-se em conta que utilizamos os mesmos grãos de café torrado, esses diferentes preparos, que envolvem relações entre pó e água diferentes, moagem e tempo de extração específicos, acabam tendo grande importância no resultado de outro elemento: a quantidade de cafeína na xícara.

A cafeína pode ser extraída do grão de café de diversas formas, inclusive por água. Ora, então, a preparação de café, na realidade, trata-se também de uma forma de extração de cafeína!

Quando extraída por água, o fator tempo é muito importante, pois quanto maior o tempo de contato das partículas do pó de café com a água, maior a quantidade de cafeína extraída!

Observe que a moagem também tem grande importância nesse resultado.

Portanto, dentre as três formas de preparo que comentei agora, a que apresenta o menor teor de cafeína é o espresso, enquanto que é o cafezinho que tem o maior.

Pode parecer contraditório, porém, geralmente ocorre uma confusão entre o sabor ser “mais forte”, porque a extração a alta pressão “arrasta” mais compostos de aroma e sabor, e ter mais cafeína.

O sabor da cafeína pode ser facilmente identificado, pois é um amargor que lembra, por exemplo, o jiló, que é muito diferente do amargor de algo queimado (carbonizado).

Se você preparar um café usando coador de papel e separar uma fração final correspondente a 10% do total do serviço (por exemplo, se você vai preparar 500 ml de café, passe 550 ml de água no pó, retendo e separando os últimos 50 ml…), ao provar essa dose separada é possível perceber esse amargor.

Esta simples técnica melhora muito o seu cafezinho.

Experimente.

Safra 2007 – Barreiras, oeste da Bahia

Thiago Sousa

Glaucio de Castro é produtor de café em Barreiras, Oeste da Bahia.

Nesta origem, onde obrigatoriamente as lavouras são irrigadas, o módulo das lavouras de café corresponde a aproximadamente 100 hectares (1 hectare = 10.000m²), que é a área média de um pivô central, sistema automatizado de irrigação, como está na foto. Glaucio, que se considera um “pequeno produtor” dessa origem, possui 3 pivôs.

Apesar de algumas pequenas diferenças no clima em relação às outras origens, alguns problemas são comuns.

Um dos aspectos que mais se destaca nessa origem é o fato de que o solo é muito arenoso e muitos técnicos consideram que é como se as lavouras debaixo dos pivôs se assemelhassem às cultivadas por hidroponia!

Além disso, pelo fato da região estar a uma Latitude Sul menor que 15°, a temperatura média é bastante elevada.

Acompanhe, agora o depoimento do Glaucio:

Degustando Café: Ciência e Método – SCAA 2

Thiago Sousa

Quando se fala em “degustação” de café, é importante definir-se qual é o objetivo dessa degustação: é algo profissional ou simples prazer?

A partir dessa premissa, a SCAA organizou cursos para formação de “degustadores” certificados como juízes, denominados SCAA Certified Cupping Judges (Juízes Degustadores Certificados pela SCAA). Esta é a única entidade mundial dessa categoria que possui um curso formal para essa finalidade.

Vários são os aspectos abordados, porém o mais importante é a aptidão da pessoa. Se bem observarmos, para esse tipo de serviço, não basta uma formação acadêmica apenas, pois trata-se de avaliação de um produto com base nas suas características sensoriais. Portanto, o “peso” da aptidão para a qualificação de um Juiz Degustador é muito grande.

Para se ter uma idéia, uma das formas utilizadas para a verificação dessa aptidão baseia-se na contagem das papilas fungiformes em 2 cm lineares a partir do primeiro terço da língua.

Difícil?

Veja a figura abaixo:


Existem basicamente três tipos de papilas: filiformes (parecem com “pelos”), que “sentem” temperaturas; caliciformes (parecem com “cálices” em corte longitudinal), que “sentem” um pouco os sabores; e as fungiformes (parecem “bolotinhas”, mais claras e muito menores que as caliciformes), que “sentem” muito os sabores.
Segundo pesquisas, pessoas que possuem menos de 10 papilas filiformes em 2 cm lineares, são consideradas “non-tasters”, ou seja, que pouco percebem os sabores. É um grupo que compreende a 25% da população.

Há um numeroso grupo que apresenta entre 15 e 30 papilas fungiformes em 2 cm lineares, consideradas “tasters”, ou que distinguem perfeitamente os sabores. Este grupo corresponde a 50% da população (ainda bem, pois o que seria dos “chefs” e “baristas”. . .)

Pessoas que possuem mais de 50 papilas fungiformes em 2 cm lineares são consideradas “super-tasters”, isto é, um importante grupo que possui uma capacidade de percepção de sabores bem acima da média. Normalmente, profissionais como sommeliers, chefs e juízes degustadores de cafés enquadram-se neste grupo, que corresponde a 25% da população.

Obviamente, existem pessoas com número dessas papilas em quantidade acima de 70, porém é um grupo restritíssimo, formado por menos de 5% da população.

Fatores genéticos podem explicar, em parte, essa “densidade” de papilas nas fungiformes.

Você mesmo pode fazer um teste consigo e seus amigos: basta uma boa lupa (que possa ampliar ao menos 4x) e um pouco de corante azul alimento, que facilita a visualização.

Tente!

Quem sabe você também seja um potencial Juiz Degustador. . .

Degustando Café: Ciência e Método – SCAA 1

Thiago Sousa

Nenhuma origem de café tem bebida semelhante a outra!

Guarde bem isso, pois é praticamente uma lei natural.

O café é um produto agrícola que tem suas características sensoriais muito influenciadas pelas condições geográficas, como o clima, solo e insolação, além da variedade utilizada. Há uma similaridade muito grande com a elaboração dos vinhos, que também recebem a mesma influência direta dos fatores geográficos.

Assim como algumas castas de uvas se destacam, no café, ainda que timidamente, há uma atenção especial para com determinadas variedades, a exemplo da Bourbon, seja Amarela ou Vermelha.

Uma maior complexidade de notas aromáticas e de sabor são responsáveis por uma avidez em sua procura, contribuindo, assim, para a valorização desse café.

Para que as características sensoriais dos cafés possam ser perfeitamente identificadas é necessário que profissionais qualificados possam fazer avaliações segundo uma metodologia rigorosa e que tenha profundo embasamento científico.

A SCAA – Specialty Coffee Association of America (Associação Americana de Cafés Especiais), baseada em Long Beach, CA, USA, é a maior entidade do gênero do mundo, tendo como missão estimular a produção e consumo de cafés de alta qualidade, denominados simplesmente Cafés Especiais.

Conheça a logomarca da SCAA.


Fazem parte dessa grande entidade organizações de países produtores e consumidores, a indústria de torrefação e de equipamentos, empresas de serviços e até consumidores. Possui um programa intenso de treinamento e educação, tanto para profissionais, quanto aos leigos.

Você pode verificar todos os serviços e atividades através de seu website, que é www.scaa.org.

A SCAA estabeleceu, desde meados da década de 90, um Comitê de Normas Técnicas, que elaborou uma Metodologia de Avaliação Sensorial de Café que é objetiva, ou seja, a qualidade é quantificada.

São avaliados dez diferentes atributos, sendo que emprega-se uma escala decimal, ou seja, ela vai de zero a cem pontos.

Esta é a Planilha de Avaliação Sensorial de Cafés da SCAA:

Na verdade, essa metodologia se baseou nos princípios de avaliação sensorial dos vinhos, devidamente adaptados ao café. Afinal, a similaridade é evidente. Seu “banco” básico de aromas foi elaborado pela equipe de Jean Lenoir, famoso aromatista francês, e que é denominado “Le Nez du Café”.
Os aspectos avaliados são: Aroma/Fragrância, Uniformidade, Ausência de Defeitos, Doçura, Acidez, Sabor, Corpo, Finalização, Equilíbrio e Aspectos Globais.

Certamente, na medida que os consumidores “loucos” por café conhecerem esse método, passarão a compreender mais facilmente as características sensoriais de cada café, podendo, a partir disso, fazer sua melhor escolha.

Safra 2007 – Altinópolis, Alta Mogiana

Thiago Sousa

Carlos Piccin é agrônomo e atende clientes em diversas origens brasileiras de café.

Recentemente, esteve na região da Alta Mogiana, em São Paulo, mais precisamente em Altinópolis.

Piccin comenta sobre a situação das lavouras de café e os efeitos do clima para esta safra, além de algumas considerações interessantes.

Acompanhe.

Floradas indesejáveis

Thiago Sousa

As lavouras brasileiras de café estão apresentando um fenômeno até então novo e surpreendente: uma florada ocorrendo entre o final de dezembro e meados de janeiro.

Esta não é a época normal de floradas de café. Como as árvores frutíferas de clima tropical, a florada do café coincide com a primavera, no caso do Brasil acontecendo em setembro, para que sua colheita ocorra ao fim do outono e princípio do inverno, ou entre maio e junho de cada ano.

O que está impressionando é o fato de que este fenômeno está ocorrendo em todas as origens brasileiras de café arábica, da Bahia ao Paraná. Em média, são três internódios com essa manifestação, o que acaba gerando dois efeitos.

O primeiro é que pode comprometer para este ano a qualidade da safra, devido à uma maior desuniformidade na maturação dos grãos.

Grãos verdes conferem forte adstringência ao café, além de residuais de amargor. A percepção humana para o amargor é 10.000 vezes maior do que para o sabor adocicado. Portanto, é necessário retirar os grãos não maduros do lote de café para que se possa obter uma bebida de boa qualidade.

O segundo é que com esta florada agora, a safra do próximo ano agrícola, 2007-2008, terá seu potencial substancialmente diminuído.

Considerando-se que o crescimento médio anual dos ramos correspondente ao equivalente a 14 internódios, a perda de 3 representa algo como 20% !

Para lembrar: o cafeeiro produz somente na parte nova dos ramos, e é justamente nesses internódios que ficam os botões florais, que se tornarão, uma vez fecundados, em frutos. O conjunto de grãos formados junto ao internódio é denominado de “roseta”.

Veja, abaixo, como estão os ramos agora em janeiro de 2007.

Cafés certificados – Rain Forest

Thiago Sousa

Como comentei anteriormente, existem diversos sistemas de certificação para café, sendo que alguns são focados na forma de produção.

Quero comentar um pouco sobre o Rain Forest Alliance, que é uma ONG fundada nos anos 80 e cuja sede fica em New York City.

Seu foco inicial era o de criar um sistema de certificação que demonstrasse às pessoas a preocupação dos produtores em preservar a chamada “Rain Forest” (Florestas Tropicais) na América Central, onde se localizam as primeiras propriedades certificadas. Como se sabe, as Florestas Tropicais, localizam-se entre os trópicos, sendo a Floresta Amazônica um de seus ecossistemas mais conhecidos.

Quando seu modelo de certificação começou a ser implantado nos países produtores de café da América Central, as primeiras propriedades tinham lavouras de café plantadas num sistema denominado “sombreado”, quando as plantas ficam sombreadas por árvores de grande porte, como pode ser vista nesta foto de uma lavoura recém-plantada na região de Antígua, Guatemala.

Em meados dos anos 90, através de uma aliança com o IMAFLORA, instituto que tem sede em Piracicaba, SP, iniciou-se a introdução dessa certificação no Brasil. A primeira fazenda a ser certificada foi a Fazenda Boa Vista, da Daterra Atividades Agrícolas, de Patrocínio, no Cerrado Mineiro.

É interessante ressaltar que entre o início do processo de certificação dessa fazenda até a sua conclusão, houve uma grande mudança nas exigências. Desde o princípio, em sua Norma havia a obrigatoriedade do sombreamento das lavouras de café, lembrando que essa Certificação foi originariamente aplicada na América Central. Ao final, focou-se a preservação da vegetação nativa de onde a propriedade se localiza.

Primeiramente, é necessário explicar o por que do sombreamento das lavouras na América Central. 

É, antes de mais nada, uma questão técnica!

O cafeeiro da variedade arábica é uma planta cujo metabolismo, digamos, trabalha “redondinho” na temperatura de 23°C. É quando os técnicos dizem que “o seu metabolismo está a 100%”, ou seja, a fotossíntese e a elaboração dos nutrientes, por exemplo, funcionam muito bem. Mas, a cada 1°C que a temperatura sobe, essa capacidade decresce em 10%. Portanto, em regiões mais quentes, as lavouras de café não têm um bom desempenho.

Outro aspecto é que na América Central as lavouras de café estão distribuidas entre as Latitudes Norte de 6° a 16°, ou seja, devido à inclinação do eixo da Terra, os raios ultravioletas do sol incidem inclementemente nessa faixa, provocando queimaduras nas folhas, que os técnicos chamam de “escaldadura”. Como não dá para aplicar protetor solar nas lavouras, a alternativa foi fazer o plantio de cafeeiros debaixo de árvores de maior porte. É uma solução que resolve dois problemas: minimiza os estragos dos raios ultravioletas nas plantas e diminui a temperatura média das lavouras.

Como no Brasil as lavouras estão situadas entre as Latitudes Sul 14° e 23°, o plantio a pleno sol é prática razoável.

E preservar a vegetação nativa das regiões onde as propriedades estão instaladas é muito sensato. Bingo!

O Brasil possui uma diversidade de eco-sistemas fantástica, desde o Cerrado até a Mata Atlântica. Portanto, uma decisão muito sábia.

Segundo Eduardo Trevisan Gonçalves, que é o Coordenador do Segmento Café do IMAFLORA, hoje já existem algumas torrefações brasileiras oferecendo cafés certificados como Rain Forest (lembre-se do “Selo do Sapinho”), como os do Café Villa Borghese, Bom dia e Ghini, que podem ser encontrados em boas redes do varejo.

Esta é uma embalagem para o preparo individual de café produzido pela Key Coffee Co., uma das maiores indústrias de torrefação do mercado japonês. Foi o seu primeiro produto com o Selo Rain Forest e aproveitaram para lançá-lo com um conceito de preparo novo, com o pó alojado num pequeno filtro acoplado ao copo. Ou seja, para o seu preparo, basta adicionar água quente.

Prático, não? 

A percepção do consumidor em relação a esse Selo é muito positiva, pois com as mudanças climáticas que estamos observando no nosso dia-a-dia, adquirir um produto que auxilia na preservação das vegetações nativas e que, consequentemente, pode contribuir para minimizar o efeito estufa e outros, certamente dá a sensação que estamos fazendo a nossa parte.

E se o café tiver boa qualidade de bebida, será com muito prazer…

Um espresso legal!

Thiago Sousa

O Brasil está tomando rumo no consumo de café parecido com o de países tipicamente “consumidores”, como os europeus e da América do Norte, apesar de ainda ter predominantemente um perfil de consumo de país “produtor”.
Depois que esse planta de origem etíope adentrou em terras brasileiras, vindo escondidamente da Guiana, nosso país nunca mais deixou de ser o maior produtor mundial de café e hoje ocupa a posição de segundo maior mercado consumidor, atrás apenas da “Terra da Starbucks”.
Esse crescimento envolveu um grande esforço de toda a cadeia do café, que vai da produção, com cafeicultores oferecendo lotes com qualidade antes inimagináveis como Cafés do Brasil, passando pela indústria e, obviamente, chegando aos Pontos de Serviço, com a profusão de novas cafeterias.
Mas, para que tudo isso tenha ainda mais sabor, é importante que o consumidor tenha maior conhecimento do que está sendo servido, pois é sua postura crítica e exigente que fará com que o aperfeiçoamento dos serviços seja contínuo.
 
Como contribuição, farei também a apresentação de alguns cafés que passaram por Avaliação Sensorial segundo Metodologia SCAA – Specialty Coffee Association of America (Associação Americana de Cafés Especiais).

O primeiro café que apresento faz parte de um lote produzido pelo Café Terra Brasil, de São Paulo, que são grãos para espresso da série Miscela Oro.
Esta série é elaborada com grãos certificados do Café do Cerrado, que é a primeira Indicação de Procedência para café do Brasil, referente à região do Cerrado Mineiro, que abrange o Alto Paranaíba, Triângulo Mineiro e parte do Noroeste de Minas Gerais.
Particularmente, o lote avaliado atingiu a nota de 83,0 (oitenta e três) pontos SCAA, dentro de uma escala decimal que vai de zero a cem pontos. É considerado Café Especial (Specialty Coffee), segundo critérios da SCAA, aquele cuja bebida supere 80,0 (oitenta) pontos SCAA.
Veja aqui o Laudo Técnico referente a este lote.

Observe que há um gráfico que facilita a visualização dos atributos verificados durante a Avaliação Sensorial. Cafés que apresentam gráficos tendendo  a uma figura mais regular e, também, mais expandida,  denotam que os atributos são mais harmônicos e de maior intensidade, respectivamente. 
Particularmente, considero este lote muito interessante, pois possui um intenso aroma com notas predominantes de amêndoas. Apresenta delicada acidez cítrica em grande equilíbrio com notas de sabor que remetem à frutas secas, com  grande presença de amêndoas. O toque “diferente” fica por conta de uma delicada finalização de elegante frescor que lembra ervilhas verdes, conferindo inusitada combinação de finalização. No espresso, apresentou creme de aspecto aveludado e coloração levemente tigrada de grande consistência, denotando presença considerável de óleos de cadeia curta.
Este café está disponível, por exemplo, nas lojas da Rede Ofner, em São Paulo.

Desvendando sabores do amargor

Thiago Sousa

E, finalmente, o último, mas não menos importante, sabor: Amargor.
Comentei em um post anterior que o limiar de percepção do sabor Amargo é 10.000 vezes menor que o do Doce, ou seja, é uma proporção do tipo 1:2.000.000 !
O ser humano possui essa grande sensibilidade ao sabor Amargo porque faz uma correlação instintiva com algo que lhe põe em risco. Uma característica das substâncias amargas é o de estimular a atividade das glândulas salivares, ou seja, passamos a salivar com mais intensidade ao percebermos o sabor Amargo. Essa reação do corpo pode ser entendida como um instinto de preservação.
Em geral, na Natureza, os venenos mais violentos são substâncias da família dos alcalóides, que têm como característica o sabor …(sim!) Amargo.
Também, devido ao tipo de preparação para as soluções de referência, que neste caso também necessitam de condições laboratoriais, farei uma abordagem qualitativa, como no caso dos Ácidos.


A rigor, podemos destacar 3 diferentes tipos de Amargor:

1. Resultante de um excessivo processo de torração do grão, há o Amargor que lembra o sabor queimado, idêntico ao que se tem quando, por exemplo, um pedaço de pão se queima numa torradeira ou ao fogo. Este amargor é “seco”.

Foto obtida no www.istockphoto.com

2. Há o amargor pungente, de sabor medicinal, decorrente do aparecimento de compostos fenólicos. São substâncias formadas, geralmente, por fermentação bacteriana que atacam algumas proteínas dos grãos de café. Esta fermentação indesejável leva ao café com “Bebida Riada e Bebida Rio”. Tecnicamente, é quando os grãos estão apodrecidos; por isso, na xícara, além do aroma medicinal (lembra um toque de cânfora), é bebida que efetivamente provoca um belo estrago no estômago.
Veja como são os grãos atacados por microorganismos e que resultarão em “Bebida Riada” na foto ao acima.

3. O terceiro tipo de amargor é, digamos, o menos desagradável, lembrando, por exemplo, o quinino presente na Água Tônica. A cafeína, substância característica do café, apresenta esse tipo de amargor. Lembro que a eficiência de sua extração da cafeína por água depende diretamente do tempo de contato. Portanto: o serviço de espresso é o que apresenta o menor teor de cafeína por dose, enquanto que o cafezinho, pelo fato de ter o pó finamente moído misturado à água antes de passar pelo coador, é o serviço que leva uma maior quantidade de cafeína.
Agora…à prática!

Desvendando o sabor salgado e a acidez

Thiago Sousa

Afiados no sabor Doce?
Então, podemos partir para o segundo, que é o sabor Salgado.
O limiar de percepção do sabor Salgado é duas vezes menor que o do sabor Doce, ou seja, equivalente a 1:400 ou 0,25% (= solução de 2,5 gramas de sal de cozinha em 1 litro de água).
O sal, no nosso caso o Cloreto de Sódio, tem grande importância histórica, tendo cedido seu nome para compor a palavra de origem latina Salário como sinônimo de pagamento, originalmente, dos soldados romanos.
Para você ter uma idéia sobre essa concentração de referência, a água do mar é constituída, em média, em 3,5% de sais dissolvidos, dos quais dois terços são Cloreto de Sódio. O terço restante é composição de Cloreto de Magnésio e Cloreto de Cálcio. Quem já bebeu água do mar, sabe o quão salgada ela é…

Ao lado, uma turma de Juízes de Cafés Especiais em treinamento.
Prepare também uma solução com 0,5% m/v de sal (5 gramas de sal dissolvidos em 1 litro de água).
Experimente e memorize. Estas serão suas referências de agora em diante.
No caso do café, o sal não é percebido isoladamente, a não ser em casos excepcionais. Normalmente, ele trabalhará conjugado com um outro sabor.

E o sabor Ácido?
Aqui, em relação ao sabor Salgado, o salto no limiar de percepção é olímpico: 1:130.000 ! Isso mesmo, o equivalente a 0,00076%.
Para se preparar as soluções, somente em condições laboratoriais. Por isso, considero mais adequado fazer uma abordagem qualitativa.


Vejamos os ácidos mais comuns nos alimentos e que conferem a característica “ácida”:
- Ácido Cítrico: é o que encontramos no limão, na laranja e abacaxi, daí o nome de Frutas Cítricas.
- Ácido Fosfórico: está comumente presente nos cafés do Kenya. É o ácido que compõe a Coca-Cola.
- Ácido Málico: encontrável na maçã. Alguns cafés produzidos em grandes altitudes podem apresentar esse tipo de ácido, principalmente nos cafés da América Central. Recomendo testes com a variedade Fuji, de grande acidez, para se familiarizar com este ácido.

- Ácido Lático: presente no iogurte (para o pessoal da “cidade”) ou coalhada (para o pessoal da “roça”). Raro, perceptível em alguns cafés naturais produzidos em regiões montanhosas.
- Ácido Acético: é o ácido do vinagre. É resultado da transformação dos açúcares presentes no café, sendo considerado um grave defeito de bebida devido à uma fermentação indesejável. Para pessoas mais sensíveis, provoca queimação no estômago.
Mais uma vez recomendo: experimente, experimente e experimente!

Desvendando o sabor doce

Thiago Sousa

Creio que, para quem não está acostumado, ouvir referências de notas de sabor que lembram “torrone” (nougat), vinhos Rioja (uma famosa origem da Espanha) ou mesmo chocolate trufado pode soar amalucado, se não o caso de pedante.

Será que esse povo está querendo me fazer de “tonto”?

Esta é uma pergunta que geralmente ouço quando um grupo de experts se reune com um de simples ‘loucos’ por café.

Aliás, a linguagem hermética é típica dos iniciados em qualquer coisa, o que pode ser extremamente irritante para quem está por se iniciar. Por exemplo, já percebeu que uma dor de cabeça para os médicos é “cefaléia” ? Ou que, caso você tenha feito o “back up” dos “files” de maior importância, não há o perigo de perder informações ao “deletar” por engano…

Afinal de contas, ninguém nasce sabendo tudo e, por isso, gostaria de apresentar um pequeno guia para desvendar os sabores

Como ponto de partida, considero fundamental que sejam conhecidos os 4 sabores básicos ou de referência, como são tratados pela SCAA – Specialty Coffee Association of America (Associação Americana de Cafés Especiais) e o CCWC – Coffee Cuppers Wolrd Council (Conselho Mundial de Juízes de Cafés Especiais pela SCAA): Doce, Salgado, Ácido e Amargo.

Vamos iniciar com o sabor Doce.

Pense um pouco e verá que sua memória gustativa lembrará ou do açúcar, seja refinado ou não, ou do mel.

Dentro dos parâmetros da SCAA, a calibração do padrão Doce, ou seja, a solução de referência para percepção desse sabor, corresponde a uma solução de açúcar refinado em água a 0,5% m/v (5 gramas dissolvidos em 1 litro de água destilada).

O limiar de percepção humana do fator Doce corresponde à relação 1:200 açúcar/água ou 0,5% m/v!

Você pode tentar reproduzir essa solução em casa utilizando água mineral com pouco teor de sais. Neste caso, verifique se a soma dos sais presentes não ultrapassem 250 ppm. Preferencialmente, devem ficar na faixa entre 125 e 175 ppm.

Você pode preparar uma solução com o dobro de concentração, ou seja 1,0% (10 gramas de açúcar dissolvidos em 1 litro de água).

Experimente e sinta a diferença entre as duas soluções. Com o tempo, você poderá fazer uma correlação com bebidas em geral.

É interessante tentar com esses sucos em pó. Veja no rótulo os componentes e verifique a concentração de açúcar. Compare com suas soluções.

Este experimento é muito interessante e certamente vai ampliar sua capacidade de perceber o quão doce é uma bebida, pois você passou a ter uma referência.

Desvendando sabores…

Thiago Sousa

Desvendar os sabores dos cafés é coisa apenas para iniciados?

Esta é uma questão que constantemente as pessoas me perguntam, pois acham algumas descrições de bebida “muito surreais”….

Bem, para facilitar, vamos iniciar olhando o “Menu” atual da Stumptown, uma micro-rede premium de cafeterias do Oregon, USA.

Muito simpática a capa, não?

De cada Ano-Safra, sua equipe percorre diversos países produtores procurando por lotes de café que sejam absolutamente interessantes, especiais e, quase sempre, únicos.

Veja, agora uma seleção de cafés do Leste da África:

Foram listados um café do Kenya e dois da Ethiopia.

Os cafés do Kenya se caracterizam por serem muito ácidos devido à presença do ácido fosfórico. Tanto é que para alguns importadores conferirem se realmente se trata de um café kenyano, é feita a verificação do teor de ácido fosfórico.

O ácido mais comumente encontrado nos cafés de quase todo o mundo é o ácido cítrico, que é o que se encontra na laranja e no limão.

O ácido fosfórico é o que está presente na Coca-Cola.

Sendo produzido em elevadas montanhas, notas de sabor de frutas e flores são normais no café do Kenya. A presença do ácido fosfórico é indicada pela percepção do sabor de hibiscus.

O café etíope Limu de floresta já teve um comentário em post anterior.

O Harar é um café de sabor que apresenta notas achocolatadas combinadas com frutas vermelhas, geralmente de amora preta, que possui mais tanino. É isso que, muitas vezes, dá a percepção de que é um café de sabor pesado.

Observe, agora, a descrição do café de Sumatra:

Sim, você não leu errado. A segunda nota de sabor percebida pelo avaliador da Stumptown é a de “cannabis” !

Eu, particularmente, não saberia identificar esse sabor, mas o restante é bastante típico de um café de Sumatra: um toque de especiarias (representado pela aniz) e bebida encorpada.

Por vezes, um leve toque de terra se faz presente.

Qual a mensagem?

Deve ficar claro que para se fazer uma avaliação sensorial, ao menos três elementos são preponderantes:

- o primeiro é, sem dúvida, ter uma grande memória olfativa-gustativa. Esta é a sua biblioteca;

- o segundo é a capacidade de identificar as notas de aroma ou sabor que normalmente estão num conjunto complexo; e

- o terceiro é a capacidade de associar ou correlacionar as notas percebidas com os itens de sua “biblioteca”.

Portanto, é uma mescla de aptidão e treino, muito treino.

Você pode começar hoje: experimente a grande variedade de frutas e vegetais disponíveis nesta época do ano.

Cheire, mastigue e marque.

Memorize.

Pratique.

É muito estimulante!

Cappuccinos e o Cappuccino Brasileiro

Thiago Sousa

Uma das bebidas a base de espresso mais festejadas, o cappuccino teve uma trajetória singular no Brasil.    

A entrada de máquinas de espresso no Brasil foi muito tímida até o final dos anos 90 e, por isso, o autêntico cappuccino foi uma bebida durante muito tempo desconhecida do grande público consumidor. 

Em fins dos anos 60 e início dos 70,  a empresa paulistana Dalca do bairro de Vila Mariana, especializada em produção de máquinas para encapsulamento de pós, próprio para a indústria farmacêutica, lançou pastilhas de café que eram muito parecidas com comprimidos. O seu proprietário era um ”louco” por café e pensava em ter um cafezinho, nem que fosse em comprimidos, sempre no bolso !

O conceito era inovador na época e na embalagem havia um desenho de astronauta para passar a mensagem de que era um produto muito avançado.

Em seguida, a empresa lançou um preparado em pó que simulava o cappuccino e que foi registrado como tal.

Sucesso absoluto !

E resultado da criatividade brasileira…

Elaborado à base de café solúvel, continha, também, três ingredientes particularmente especiais: leite em pó, canela em pó e, aqui o toque genial, bicarbonato de sódio.

O bicarbonato de sódio, como se sabe,  reage com muita facilidade com a água, liberando gás carbônico. Por isso, também é muito empregado como base de fermento em panificação, o chamado “fermento químico”, pois a liberação do gás carbônico forma as bolhas, expandindo a massa. É exatamente o mesmo efeito que ocorre com o preparado para cappuccino.

Com o tempo, a formulação se tornou de domínio público, de forma que hoje grande parte das indústrias brasileiras de café oferecem o seu “preparado para cappuccino“.

Somente com o crescimento do mercado consumidor e, naturalmente, com a introdução de um grande parque de máquinas de espresso, já após 2.000,  é que o autêntico cappuccino ficou disponível para o consumidor brasileiro.

Espresso, leite vaporizado e um toque de chocolate em pó: é assim que ele é saboreado no mundo inteiro. O outro, só no Brasil.

Aqui, um belo cappuccino executado pela barista do Café Terra Brasil.

Sobre o espresso 3

Thiago Sousa

Várias pessoas perguntam sobre máquinas de espresso domésticas, sobre as melhores, as mais baratas, e assim por diante…

Bem, a grande diferença entre as máquinas domésticas e as profissionais está na caldeira, que é a parte onde é feito o aquecimento e pressurização da água. Como normalmente possui uma resistência, naturalmente, uma profissional consome muito mais energia, exigindo instalações apropriadas. É como um chuveiro de alta capacidade ligado sem interrupções! Além disso, exigem um moinho, que também consome bastante energia quando ligado.

Abaixo, uma típica máquina doméstica de baixo custo, sem moinho incorporado:

Dentre as máquinas domésticas, existem algumas muito em conta que trabalham com sachês, isto é, a dose do café já está moída e acondicionada num saquinho de papel filtro, lembrando os “chás de saquinho”. Veja abaixo como é o sachê de café para espresso:

Como já está moído, é recomendável que seja acondicionado individualmente em embalagens aluminizadas para não “oxidar”. A “vida útil” do pó moído é curta, oxidando-se rapidamente pois tem muita área de contato com o ar. Você pode perceber que o pó está oxidado quando, na xícara, sentir um sabor rançoso, semelhante a uma fritura amanhecida…

Sobre este aspecto, um grande amigo costarricence, Señor Alberto Miranda, tem um ditado: “O café cru dura anos; o café torrado em grãos, dias; o café moído, minutos, e o preparado, segundos…”

O café verde (cru), se bem armazenado, pode durar alguns anos, porém, toda a riqueza de aromas e sabores se esvai ao cabo de um ano após de colhido e beneficiado. O café torrado em grãos, pelo fato de ter sofrido diversas reações químicas, fica mais sensível à influência do meio ambiente, daí os cafés de alta qualidade serem embalados em pequenas quantidades.

O café moído, conforme já comentado, é muito vulnerável ao ar, por isso que a embalagem de vácuo minimiza esse problema. No entanto, ao abrir a embalagem, “adeus” proteção.

E, finalmente, um bom café é consumido rapidinho mesmo. É o prazer da degustação!

Abaixo, uma máquina denominada “super-automática”, que possui um lugar para armazenar o café torrado em grão, e um moinho incorpado. Neste caso, todas as funções são automatizadas, controladas por um sistema pré-programado. Basta apertar o botão certo…

Espresso: Blends & moagem

Thiago Sousa

Como visto, são 4 os pilares para a extração de um excelente espresso, cada qual com um tipo de influência na bebida.

Comentando um pouco mais sobre o moinho, é importante saber que cada Miscela (blend) possui um ponto de ajuste próprio, pois cada origem tem uma “personalidade” a ser respeitada. Por exemplo, grãos produzidos em grande altitudes, em geral, apresentam maior densidade, que é a relação de quanto “pesa” um determinado volume, e, também, maior “dureza”. Estes dois componentes têm influência direta na técnica de torra, que, por conseguinte, influencia o ajuste do moinho.

O pó para a extração do espresso não pode ser muito fino, pois dessa forma o filtro pode ficar “entupido”, dificultando a passagem da água por ele. Quando isto ocorre, normalmente se vê um vazamento de água e pó pelas laterais do porta-filtro. Se, nesse caso, você observar como ficou o pó nesse porta-filtro, o pó estará “nadando” em água… Naturalmente, no bico de saída do porta-filtro, o líquido sairá em gotas, pois o pó muito fino, além de entupir o filtro, forma uma barreira para a água pressurizada.

Um ajuste de moagem adequada propicia um tempo ideal de contato entre a água pressurizada e a miscela, permitindo obter-se uma xícara perfeita! Um blend é criado levando-se em conta uma série de fatores, principalmente sua aplicação. Por exemplo, existem aqueles próprios para o espresso simples, que privilegia a cor e textura do creme, aroma e equilíbrio dos sabores, assim como outros para elaboração de lattés.

No caso específico dos blends de espresso, é possível se observar a extração dos diferentes compostos, principalmente os delicados óleos de cadeia curta, através das “estrias”, também chamadas de “tigramento”, porque lembram as listras dos tigres, no creme. Nesta foto, um espresso pelas mãos do fantástico Dismas Smith, um dos mais festejados baristas norte-americanos.

Manchas esbranquiçadas no creme revelam que o espresso ficou “super-extraído”, ou seja, o tempo extração ficou muito prolongado. Se você tiver a curiosidade de, com uma pequena colher, provar a diferença, sentirá um amargor nessa mancha, ao contrário da parte de cor amendoada.

Uma xícara assim deve ser recusada, pedindo ao barista uma perfeita !

Espresso & os 4M

Thiago Sousa

Quero fazer um comentário sobre os elementos clássicos do espresso, segundo a Escola Italiana.

Segundo esta Escola, os pilares de um excelente espresso são representados pelos 4 M: Miscela (que é a origem ou o blend de grãos de café), Moinho (pois a regulagem é particular para cada condição), Máquina (aqui especificamente aquela para este serviço) e Mão (que representa a habilidade do barista).

Sobre blends e baristas, pretendo fazer comentários posteriormente, ficando, agora, nos itens relativos aos equipamentos.

Existem vários modelos de moinho para café, sendo que, para o serviço de espresso, há maior uso daqueles que fazem a moagem dos grãos de café por meio de pequenos cones metálicos e aqueles que utilizam discos.

No caso dos discos, existem dois de diâmetros semelhantes e montados alinhadamente pelo centro, com uma pequena folga entre si, folga esta que irá determinar a granulometria (tamanho dos grãos moídos).

O giro contrário, num efeito semelhante ao de um freio de discos dos carros, realiza a moagem.

Outro sistema emprega dois conjuntos planos formados por vários cones metálicos, também com um pequeno espaço entre ambos os conjuntos. Da mesma forma que o sistema de discos, os grãos passam por entre os dois conjuntos de cones, que processam a moagem.

Na foto, um moinho do tipo drogaria, ou seja, que não tem um recipiente para retenção do café.

No caso das máquinas de espresso profissionais, também denominadas de máquinas “de grupo”, todas possuem uma caldeira interna onde a água é aquecida e pressurizada. Um “Grupo” é o conjunto composto por um cano que traz a água aquecida e pressurizada, um terminal que lembra um chuveiro chamado de Errogador, que tem o encaixe para o porta-filtro, onde fica o pó de café.

Veja acima uma máquina de grupos com uma saída vaporizadora à direita na foto.
A caldeira deve ter capacidade de geração de vapor suficiente para os grupos e para o vaporizador, permitindo o atendimento sem problemas em locais de grande fluxo de clientes.

Algumas máquinas possuem um sistema que mantém a temperatura na “ponta” do grupo constante, pois o aquecimento excessivo desse material pode provocar a queima de parte do pó de café durante a extração. Este problema é comum de ocorrer após um bom período sem serviço. Por isso é que baristas bem treinados sempre “soltam” um pouco do vapor do grupo antes de acoplar o porta-filtro com a finalidade de se ajustar a temperatura e, assim, garantir um bom serviço de espresso.

Veja uma foto do resultado de um blend muito bem preparado, moído corretamente, com uma máquina bem ajustada e um exímio barista executando o serviço.

Observe o “tigramento” do creme do espresso,através do fundo do porta-filtro é aberto, indicativo de excelente blend, corretíssima moagem e extração exemplar!

Esta maravilhosa foto foi tirada pelo “Companheiro de Viagem” Jacques Pereira Carneiro, de Carmo de Minas, MG, no Centro de Treinamento da ZOKA, cafeteria de Seattle, WA, USA.

Preparando um cafezinho básico

Thiago Sousa

Uma das perguntas mais freqüentes é sobre qual a temperatura que deve estar a água para preparar o cafezinho…

Recomenda-se que a água seja de boa qualidade, preferencialmente mineral e de pH levemente ácido, isto é, menor que 7. Também, não se deve deixar a água em fervura, pois esse processo, quando a água fica em grande agitação, faz com que o oxigênio dissolvido nela “escape”. Menos oxigênio dissolvido resulta em uma água meio sem graça no sabor.

Recomenda-se temperatura entre 90°C e 93°C, que é quando bolhas maiores se formam. Uma forma prática para se conseguir isto é a de, ao se iniciar a fervura, apagar o fogo e aguardar 1 minuto.

Bem, fiz esta foto, avaliando com um termômetro a laser a temperatura da água, no momento que as bolhas grandes começam a se formar…

Observou as bolhas ao fundo?

Bingo: 92°C !

Enquanto isso, o pó de café já deve estar no filtro. Lembre-se que uma moagem mais fina permitirá uma extração mais eficiente e, portanto, com mais cafeína ao final. Por outro lado, caso seja utilizado o filtro de papel, uma moagem extremamente fina acaba provocando o entupimento precoce dos microporos, resultando numa extração mais lenta e, portanto, com mais cafeína ainda.

Lembrando, mais cafeína extraída, mais amargor na bebida.

Um indicador de que o café torrado, seja recentemente moído, caso você tenha um moinho em casa, ou adquirido assim, está bem fresquinho é a “capacidade de expansão” do pó ao se verter um pouco da água quente.

Nesta foto, observa-se a formação de uma camada cremosa, que é desejável e que está relacionada com a pré-hidratação do pó.

Nesse momento, você percebe que o desprendimento dos aromas é muito intenso, podendo treinar sua perícia… Após essa hidratação inicial, vá completando com água em fio não muito grosso, sempre pelas laterais. Isto é importante porque a água “gosta” de fazer um caminho sempre “menos trabalhoso”: se você verter a água apenas no centro, irá acontecer uma “super-extração” apenas nessa região, comprovada pela formação de manchas mais claras no creme. Assim sendo, ao adicionar a água pelas laterais, ela será forçada a “trabalhar” em movimentos circulares descendentes, promovendo uma extração mais homogênea do café.

E ao fim de 3 a 4 minutos…

… o seu cafezinho está pronto!

Observe a que a temperatura final fica na faixa entre 65°C e 70°C, que é exatamente a que se obtem numa extração por espresso.

Ah, e não se esqueça de separar o final da extração, caso você prefira uma bebia com menos amargor, pois o aumento do teor de cafeína no cafézinho preparado é diretamente proporcional ao tempo de contato do pó com a água.