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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

Filtering by Tag: Coffee

Sobre o poder do conhecimento

Thiago Sousa

Passei quase três décadas de minha vida considerando o café como uma bebida ruim, que, em parte, era devido à cultura brasileira de que o Cafezinho deveria ser forte na cor e intenso no sabor. Como atenuante, bebia apenas o Pingado, quando adicionava o leite para diminuir esse que era um sofrimento para mim. (OK, detesto o sabor Amargo, talvez porque tenha muita sensibilidade para ele…)

A mudança se deu quando iniciei minha vivência de roça na fazenda de café do meu sogro. Literalmente foi uma imersão diária, pois decidimos nos mudar para os confins do Cerrado Mineiro, na histórica região de Paracatu.

Depois de quase uma década trabalhando em indústrias de Bebidas & Alimentos que empregavam processos fermentativos, a guinada na minha vida foi muito grande!

Aprender sobre botânica e o comportamento das plantas ante as sutilezas climáticas, sobre as pragas e doenças, mas, principalmente, sobre como realizar uma colheita impecável foi o grande desafio, que percebi que seria um longo aprendizado. Ter um guru das lavouras foi fundamental para empreender essa jornada, ainda mais se essa pessoa tenha se tornado um grande amigo, como o Evanildo Peres, que foi professor de Fisiologia do Café na UNESP de Botucatu. Aprender a pensar e analisar como as plantas “funcionam” é fundamental para compreender os modernos conceitos de Território, por exemplo.

Resolvi, até aprender um pouco sobre esse “Universo da Fisiologia Vegetal”, fazer o caminho oposto, aproveitando a experiência que tinha de trabalhar com produtos alimentícios e bebidas:  saber como e para quem vender o café. A experiência com produtos de consumo começou a me ajudar a compreender o mercado de alta complexidade que é o do Café!

A rotina de torrar, provar e desenvolver relacionamentos veio daí, sem perder o precioso aprendizado das coisas da roça.

De volta ao asfalto, o aprendizado se voltou para a Química da Torra do Café, bem como aconteceu o retorno para a Análise Sensorial.

A alimentação de forma geral mudou muito, sendo muito mais industrializada, mesmo nos restaurantes. Mudança esperada em razão do processo de urbanização do nosso país e que trouxe problemas a tiracolo. Para suprir a crescente demanda por alimentos em metrópoles cada vez mais gigantescas, a indústria lança mão de toda tecnologia disponível. E quando digo tecnologia, esta pode ser tanto para o Bem quanto para, digamos, o não tão do Bem assim…

Saber o que se come e o que se bebe é fundamental para uma vida saudável. Suas escolhas se tornam mais precisas, sem exageros ou baseadas, em muitas vezes, muito doidas “lendas urbanas”…

Você não precisa ser um especialista para perceber se uma xícara tem um café muito delicioso, enquanto que uma outra pode ser um desastre sensorial.

É um processo contínuo de aprendizado, experiência e comparação.

Foi a partir desse pensamento compartilhado com o pessoal do CLUBE DO CAFÉ, desenhamos um evento voltado exclusivamente para o Consumidor, Coffee Lover, Coffee Geek ou, simplesmente, quem adora Café: o JAMBOREE BRASIL CAFÉ 2015!

Num processo criativo conjunto, foi pensado baseado nos seguintes pilares: InovaçãoTendências eExperimentação.

 Nada de “cardeais” ou “papas” disso ou daquilo, mas gente que realmente está fazendo coisas inovadoras para o Mercado do Café. Produtores e Pesquisadores que estão pensando de forma renovada a produção de café, “fera” da Ciência da Torra, Gustavo do Valle, mostrando dados com alto rigor científico e uma reflexão sobre a diferença entre Apreciar e Avaliar Sensorialmente um produto.

Garimpamos o que enxergamos como Tendências, justamente para fazer todos pensarem juntos!

E, Experimentar cada equipamento, apetrecho e novos produtos é muito incrível porque permite conhecer com mais profundidade o que pode ser adquirido para um deleite diário…

Muitas empresas entenderam a proposta e, assim, foram feitos diversos lançamentos de produtos nesta primeira edição do Jamboree: moinho manual para preparo de Espresso genuinamente tupiniquim, uma água muito bacana, moinho doméstico ECM e uma cachaça que tem proposta interessante de ser base para coquetéis.

Diversas estações de degustação trabalharam incessantemente durante todo o dia 21 de março, oferecendo belos cafés em diferentes serviços como a Trifecta (Bunn), Hario, French Press e Cold Brew. Aliás, num divertido e inovador serviço com chopeira, idealizado pelo Ton Rodrigues do True Coffee Brasil.

Outra idéia fantástica e inspirada foi a “impressão digital” do evento criada pelo Daniel Kondo: logomarca, cartoons e muita diversão!

E já estamos trabalhando para transformar a próxima edição do JAMBOREE BRASIL CAFÉ uma festa ainda maior!!!

Saiba mais do evento no website: www.jamboreebrasil.coffee.

Tudo isso tem um recado básico:

Aprenda, sempre!

Sem medo de ser feliz…

Quem colocou sal no meu café?!

Thiago Sousa

O café é uma bebida apaixonante, sendo apenas menos consumida que a água e menos comercializada que o petróleo. Impressionante, não?

Devido à sua semente ter em torno de 15% de gorduras, está longe de ser uma oleaginosa, da qual poderia, por exemplo, se extrair óleos para serem usados como ingrediente culinário ou mesmo na produção massas que nos fazem lamber os beiços como um sempre bom marzipan. Seus quase 20% de açúcares, que podem ser perfeitamente percebidos na polpa dulcíssima quando os frutos estão maduros, são mais do que suficientes para produzir grandiosa quantidade de energia para desencadear reações químicas que formam compostos muito sofisticados.

Essas condições é que levaram ao melhor tratamento industrial que a semente do café poderia ter: ser torrada.

Depois de torrada, desde que o processo tenha sido bem conduzido, as sementes devem ainda manter uma boa quantidade de Açúcares, Ácidos, Compostos Clorogênicos (Cafeína e Família) e moléculas de Aromas, além de óleos saturados.

A próxima etapa é a dos Serviços: Como servir o café?

Como fazer uma xícara excelente?

Para tanto, deve ser seguido o Princípio da Extração do Café, que é baseado na Relação de Solubilidade dos componentes do café com a água. Substâncias mais solúveisou que se combinam com maior facilidade com a água, são extraídas primeiro.

E, assim, chegamos à xícara para nosso momento dos pequenos prazeres da vida…

Muitas pessoas tem me perguntado por que existe na Coréia o costume de adicionar sal à xícara de café?

Estranho, não?

Vamos pensar juntos, então. A partir do Princípio da Extração do Café, sabe-se que numa xícara de café deve conter ácidos orgânicos, principalmente o Ácido Cítrico, presente em 100 de cada 100 lotes de café; os Açúcares, considerando apenas aqueles que denomino como Majoritários (SacaroseGlicose e Frutose); Compostos Clorogênicos (Cafeína & Família); e, eventualmente, algum mineral caso os grãos sejam de origem vulcânica.

Além de tudo, deve ser lembrado que em torno de 98% da bebida é… Água!

E a Água que é usada para preparar o café sempre contem minerais.

Portanto, podemos organizar a extração das substâncias a partir de uma escala decrescente de solubilidade, iniciada pelos ácidos: Ácidos, Minerais, Açúcares e Compostos Clorogênicos.

Por outro lado, existe uma ordem de sensibilidade que temos em relação aos principais estímulos e que é organizada tomando-se por base os Limiares de Percepção de Sabores Básicos, que estão a seguir:

DOCE = 1:200 (0,50%)

SALGADO = 1:400 (0,25%)

ÁCIDO = 1:130.000 (0,0007%)

AMARGO = 1:2.000.000 (0,00005%)

A partir dessa figura, pode-se concluir que somos pouco sensíveis (e por isso mais tolerantes) ao Sabor Doce, enquanto que temos a maior sensibilidade para o Sabor Amargo.

Em um café de excelente qualidade, o Sabor Amargo é devido aos Compostos Clorogênicos e alguns outros ácido orgânicos formados durante o processo de torra. Outro aspecto interessante é que países onde o consumo de café está se iniciando, em geral a primeira experiência é com o Café Solúvel, pela praticidade, mas cuja base é de grãos de robusta.

O teor de Compostos Clorogênicos num robusta é quase o dobro do encontrado nos arabicas, sendo razoável obter bebida com maior intensidade do Sabor Amargo com os grãos de robusta.

Assim, os primeiros cafés servidos na Coréia eram com base de robusta e, portanto, mais amargos.

Usar o açúcar era um luxo, uma vez que é produto importado e seu uso, devido a este fato, era moderado. Para contornar esse problema, empregaram um dos conceitos básicos de EDUCAÇÃO SENSORIAL: o sal comum, basicamente Cloreto de Sódio, tem um íon que atua como uma chave que pode abrir ou fechar a porta de nossos sensores gustativos, principalmente quando Sabor Amargo está presente.

Ao adicionar um pouco de sal de cozinha numa xícara de café, mesmo que esteja bastante amargo seja por alta concentração de Cafeína ou algum outro defeito de bebida, essa percepção desconfortável é mitigada!

Um truque químico sensorial bastante simples, mas que sempre funciona maravilhosamente bem!

A intrigante questão da bebida limpa

Thiago Sousa

Você já deve ter ouvido ou lido com frequência que um café extraído num determinado método apresenta uma Bebida Limpa. Intrigante, não?

Afinal, se os grãos que foram usados na torra são selecionados como exemplares, ou seja, sem contaminações ou problemas de fermentações indesejáveis, que, por exemplo, os Juízes SCAA ou Q Graders classificam como um lote que tem “Bebida Limpa” ou ausente de problemas de sabores, porque alguém diria que num método ou serviço de café a bebida fica Limpa ou, digamos, Não Tão Limpa?

Na verdade, depois de acompanhar algumas pessoas preparando excelentes cafés em diferentes serviços como na French Press (ou Prensa Francesa, cujo líder no mercado na fabricação dessa peça é uma empresa suiça…) e no coador Hario, e ouvir como descreviam cada bebida resultante, consegui as pistas para matar essa charada

Primeiro de tudo é importante compreender que Preparar Café nada mais é do que um processo químico conhecido por Extração, que envolve por princípio um objeto que contém substâncias que são solúveis (e por isso passíveis de serem extraídas) a um determinado ou grupo de solventes.  No caso específico do café, a Água é o solvente, enquanto que as sementes do cafeeiro torradas e moídas farão o papel do Objeto da Extração.

A semente do cafeeiro, depois de torrada, contém um número grandioso de substâncias dos mais variados grupos como Carboidratos (a grosso modo, açúcares), Ácidos Graxos (ou gorduras e óleos), Ácidos Orgânicos (tanto os formados durante a “vida no campo” da semente quanto durante a torra) como o Ácido Cítrico e o Ácido Quínico, Aminoácidos e os Minerais (que são os sais). Isso sem mencionar as moléculas de grande complexidade que dão origem aos Aromas e Sabores que podem ser percebidas num café muito supimpa, como as florais ou frutadas, e os Compostos Clorogênicos.

Para facilitar a compreensão, podemos considerar apenas 4 grupos como os de maior importância prática: Ácidos Orgânicos, Açúcares, Compostos Clorogênicos e Óleos.

Observe que já posicionei esses grupos por ordem decrescente pela Solubilidade em Água.  E os Óleos, como sabemos, é insolúvel em água, por isso sempre essas substâncias irão ficar na superfície, pois são também muito menos densas.

Os Serviços de Café podem ser separados em dois grandes grupos: com ou sem filtração. Hummm…. realmente um ou outro faz toda a diferença!

Por exemplo, o Espresso, o Ibriq e a Prensa Francesa fazem parte do grupo sem filtração, enquanto que os coados em geral empregam um filtro como o Cafezinho (e seu inseparável filtro de flanela), o Hario e o Chemex.

Um dos conceitos que tem sido difundidos de forma equivocada é o de que no Café a percepção de Corpo é dada pelos óleos e sólidos solúveis. Na verdade, sob a perspectiva de Ciência dos Alimentos e Bebidas, quem define a percepção de Corpo são os Açúcares, simplesmente, que é explicada pela sua natureza química e estrutura molecular.

Os óleos não são miscíveis em água e ficam sobrenadantes, alterando a percepção de corpo. O grande problema é que as substâncias que conferem sabores amargosos são em sua esmagadora e quase completa maioria solúveis em óleos (= lipossolúveis), enquanto que aquelas que tem notas mais nobres e elegantes, como as florais, frutadas e de natureza adocicada são hidrossolúveis (= solúveis em água). E, como informação muito relevante, os açúcares tem preferência por água ao invés de óleos para se combinarem…

Quando você tem cafés preparados com filtro, os óleos ficam retidos e a tal percepção de Bebida Limpa é devida à perfeita interação dos açúcares dissolvidos na água e sua maravilhosa teia molecular formada, ressaltando a percepção de Corpo e as notas de sabores adocicados, florais e de frutas, por exemplo. Nos cafés preparados sem filtro essa percepção de limpeza é parcialmente ofuscada pelos óleos que ficam sobrenadantes e, principalmente, pela presença das moléculas de sabores amargosos que se combinaram com as gorduras.

Interessante, não? Faça um teste no seu próximo Espresso: experimente em separado a Crema da bebida e me conte depois…

Caramelização: Um olhar microscópico

Thiago Sousa

Um dos grandes desafios na Torra de Café é o de se conseguir preservar ao máximo aqueles que denomino de Açúcares Majoritários (Sacarose, Frutose e Glicose). Definitivamente não é tarefa simples.

A Torra de Café depende de alguns parâmetros que podem levar à soluções absolutamente distintas para cada tipo de situação. Por exemplo, em sua etapa final há o predomínio da Reação de Pirólise, quando existe um ganho de energia muito grande pelo sistema.  Isso leva à conclusão de que quanto maior a quantidade de grãos de café o sistema tiver, tanto maior será a quantidade de energia gerada nessa reação. Ou seja, neste caso, tamanho é documento!

A etapa de maior importância para se trabalhar os Açúcares é naquela em que há o predomínio das Reações de Maillard, um impressionante conjunto de reações envolvendo quebra, rearranjo e formação de moléculas de aminoácidos e açúcares entre outros. CompetentesMestres de Torra sabem trabalhar muito bem esta etapa, produzindo verdadeiras obras primas de se beber!

Observe nesta foto, que fiz usando uma poderosa lente Macro, o que denomino de Efeito Mousse.

Este é um grão Moca ou Peaberry, semente que preencheu sozinha todo o espaço dentro do fruto (a outra não vingou!), ganhando o formato arredondado. Veja que sua junto à sua superfície há uma fina camada de cor mais clara que é obtida pela caramelização e posterior cristalização, formando uma superfície de grande resistência mecânica e que ajuda muito para garantir boa longevidade sensorial do grão torrado.

Nesta foto, para comparação, podem ser vistas partículas de grãos moídos de um café que passou por uma Torra Clássica (à esquerda) e outro que experimentou um belo trabalho na etapa das Reações de Maillard (à direita). São muito diferentes, mesmo empregando mesma regulagem de moinho!

Em geral, numa Torra Clássica as sementes experimentam uma expansão muito rápida devido à Reação de Pirólise que acontece intensamente, criando forte expansão da estrutura interna e, assim, tornando mais frágil a parede celular. No momento da moagem, há formação mais frequente de partículas muito pequenas, que pode ser verificado pela análise granulométrica ou pela foto à esquerda. Junto com açúcares caramelizados (e cristalizados) estão partículas muito menores como um fino pó. A foto à direita apresenta de forma clara maior incidência de caramelo cristalizado e pequena incidência de partículas de dimensões muito menores.

É resultado de um belo trabalho de competente Mestre de Torras!

E qual seria a diferença numa extração como no Espresso desses dois cafés?

Esta foto mostra o multipontilhamento devido à grande quantidade de caramelo cristalizado desse café!

Sob alta pressão, a dissolução do caramelo pela água quente é facilitada e o resultado fica muito bonito de se ver, docemente aromático ao se inspirar e muito, mas muito mesmo, adocicado, com notas bem definidas de deslumbrante Caramelo!

Um Espresso extraído a partir de grãos da torra mostrada à esquerda na segunda foto  tem crema de cor uniforme, sem qualquer contraste proporcionado por açúcares caramelizados.

Excelentes grãos, torra muito bem feita e uma ótima extração compõem pinturas abstratamente bonitas e sensorialmente esplêndidas sempre!

Sobre elefantes, concursos, preços e qualidade percebida… – 2

Thiago Sousa

Voltando ao Limiar de Percepção Diferencial ou da Diferença Minimamente Perceptível, vejamos outro exemplo: você já percebeu como ao colocar gotas de um potente molho de pimenta vermelha, como o ardente Tabasco, numa empadinha o impacto é imediato?

É a ardência se espalhando pela boca, fazendo alguns pontos formigarem e  sensação de queimação na língua (e no resto do corpo!). Simples efeito da Capsaicina.

No entanto, se você depois de alguns instantes repetir a dose, perceberá que o impacto é menor e tanto  o será na terceira vez. Nosso conjunto sensorial se ajusta rapidamente a esse, digamos, tamanho de impacto, de forma que para se perceber maior ardência é necessária uma dose maior de molho de pimenta na empadinha.

Assim também é como a percepção para o sabor Doce funciona, por exemplo, e para isso, é importante se conhecer as intensidades limites de percepção dos Sabores Básicos (= Gostos). Há um clássico estudo sobre o Limiar da Percepção dos Sabores Básicos pelo ser humano, que, por outra vez, é baseado em outro cujos resultados são conhecidos pelo nome de Aptidão Sensorial – Paladar, que ajudarão a compreender melhor a questão da Diferença Minimamente Perceptível.

Comentei que cada pessoa percebe de uma forma peculiar os Sabores Básicos (Doce, Salgado, Ácido, Amargo e Umami) porque a percepção depende da, digamos, população de papilas na língua.

Existem 3 tipos de papilas e elas podem ter tamanhos variados, bem como sua distribuição pela língua, sendo isto tudo em razão das características genética de cada pessoa.

Considerando-se a multiplicidade de combinações entre tipos e tamanhos das papilas e sua densidade, chegou-se ao seguinte: 25% da população é considerada como Muito Aptos (incluindo-se as pessoas que trabalham com avaliação sensorial), 50% é considerada Aptos (ainda bem, pois isso já permite às indústrias de bebidas e alimentos desenvolverem seus produtos!) e 25% da população é de Pouco Aptos (pessoal que precisa de estímulos muito intensos para perceber os sabores).

A partir dessa constatação foi construída a tabela do Limiar dos Sabores Básicos, empregada pela indústria de alimentos e bebidas.

O que se pode entender ao olhá-la atentamente, é que temos o menor limiar para o sabor DOCE, daí ser necessária quantidade maior para se sentir minimamente do que, por exemplo, o sabor ÁCIDO, para o qual nosso limiar é 650 vezes maior do que o do primeiro.

E quando falamos em Análise & Percepção Sensorial, o sabor de maior influência na contabilidade da Percepção de Qualidade é o Doce, vindo daí a importância dos açúcares. Há que se lembrar que o fruto do cafeeiro amadurece somente enquanto ligado à planta e que as melhores sementes, que serão depois torradas, são as dos frutos maduros. O fato de ser maduro está relacionado com o de ter sua máxima quantidade de açúcares. Sempre!

Vamos a um exemplo: o sabor de uma clássica uva Niágara é inconfundível. No entanto, é possível perceber que quando está madura todos as nuances da uva se tornam mais nítidas e, portanto, potentes. É o mesmo que ocorre ao experimentarmos jabuticabas ou pitangas.

Sementes selecionadas e torradas corretamente podem fazer xícaras fantásticas.

Um Café Especial (café cru), como visto, tem de alcançar no mínimo 80 pontos SCAA, o que significa que  é composto por sementes de frutos maduros em sua grande maioria. Torradas magistralmente, o perfil sensorial deve corresponder às expectativas. Tanto mais alta é a pontuação, significa que maior complexidade e intensidade de sabores se apresenta como uma boa acidez, notas florais, de caramelo e chocolate, também, ou de elegantes especiarias como canela ou anis. Claro está que esse jogo de complexidades é sustentado por um fundo obrigatoriamente doce, que garante uma percepção agradável. Ou, mais intensamente agradável!

Lotes de café de concurso atingem pontuação altíssima porque presume-se que tem a esmagadora maioria das sementes que o compõem maduras (tanto mais próximo de 100%, melhor!) e, logo, é de se esperar grande Doçura na bebida. Porém, como visto, a partir de um certo ponto, que fica na psicológica barreira dos 90 pontos SCAA, os aumentos de intensidade (sim, o que define para cima a pontuação passa a ser exclusivamente a INTENSIDADE das notas de aroma e sabor) se tornam pouco perceptíveis para a grande parte das pessoas.

E aí tem origem uma dúvida atroz: se fica tão sutil a diferença e, por isso, mais difícil de ser percebida, os valores alcançados em Leilão por esses lotes seriam realmente  justificáveis?

É até cruel pensar que muitas pessoas não perceberão nitidamente diferenças sensoriais de lotes que alcançaram, por exemplo, 93 ou 95 pontos SCAA e passem, então, a comparar com um que alcançou 87 pontos e que já era muito gostoso de se beber. Certamente, a opção de uma nova compra seria para este último lote, apesar de sua pontuação sensivelmente abaixo da primeira.

Mas deve ser pensado que é justamente a capacidade de chamar a atenção das pessoas o mérito dos leilões de concursos de qualidade. Especialistas escolheram um lote magnífico e que proporciona belíssimas experiências, desde que a torra e a extração estejam à altura; cabe ao consumidor perceber quão gostoso é esse café e torná-lo parte de sua memória viva.

Este é o verdadeiro prêmio que todo café busca!

Como preparar a mais fantástica xícara de café – 4

Thiago Sousa

Retomando a série (e atendendo a pedidos), vou comentar um pouco sobre o preparo com a Cafeteira Italiana, também conhecida como Cafeteira Moka ou Cafeteira Bialetti.

A Bialetti Industrie S. p. A. foi fundada em 1919 na pequena Crusinallo, Noroeste da Itália eoriginalmente trabalhava com produtos semiacabados em alumínio. A cafeteira, cujo projeto era deLuigi De Ponti, foi patenteada em 1933 por Alfonso Bialetti.

Basicamente a cafeteira tem 3 seções: a Caldeira (como o fabricante denomina onde a água fica para ser aquecida),Filtros e Recolhedor (onde fica o café pronto). Os italianos tem uma certa idéia fixa de que o café é uma bebida que sempre deve ser intensa (Quente como o Inferno, Negro como a Noite e Doce como o Amor…), sendo o espresso a síntese desse pensamento. A cafeteira Moka também não fugiu a esse conceito, daí a escolha do nome “caldeira” para o recipiente de aquecimento da água (o que não deixa de ser verdade!).

Há uma marcação de nível ideal de água no interior da caldeira (em geral abaixo da válvula de segurança). A seção de filtros é bastante engenhosa, sendo constituído por dois: um que fica junto ao funil cuja ponta tubular deve ficar imersa na água dentro da caldeira e outro que fica num orifício ao fundo do Recolhedor. Ao rosquear o recolhedor à cadeira, tendo os filtros na parte intermediária, cria-se um ambiente quase que totalmente fechado na seção da Caldeira. Esta é a grande “sacada” desta engenhoca!

Ao acomodar o café moído no filtro com o funil, o conjunto formado lembra uma divertida peça de vidro (sendo que nesta a parte superior é também fechada), em geral com um líquido colorido com baixo ponto de ebulição, e que ao segurá-lo na parte equivalente à caldeira faz com que esse líquido entre em ebulição e literalmente suba, ficando no recipiente superior. Ao se retirar as mãos e acontecendo o resfriamento do brinquedinho, o líquido desce pelo tubo interno, retornando à  ”caldeira”.

Com o café moído, esse efeito é parcialmente obtido na cafeteira. Com a água em ebulição, sobe pelo tubo do filtro, fazendo a extração do café, que segue subindo até ficar no recipiente Recolhedor. E pronto!

Vamos às dicas…

Moagem. Fina, Média ou Grossa?

O filtro inferior tem furos em menor quantidade em relação ao filtro superior, que fica na base do Recolhedor. Portanto, é este filtro que determina quão fina pode ser a moagem para este serviço. O recomendável, apesar de que tudo depende da preferência pessoal, é que a moagem seja média-fina para que uma gama maior de sabores possa ser extraída durante a passagem da água em ebulição. Uma vez que a água atinge o ponto de ebulição, o processo, enquanto houver energia suficiente (= chama do fogão ou num aquecedor elétrico, por exemplo), não se interrompe.

A escolha da moagem, se um pouco mais fina ainda, depende do perfil sensorial do café escolhido, principalmente se ele apresentar notas de especiarias como a canela ou nóz moscada. Deve ser lembrado, também, que moagem mais fina dará como resultado bebidas com maior amargor devido à extração dos Compostos Clorogênicos, que tem na Cafeína um de seus representantes. Esse amargor é aquele que lembra o sabor do jiló. Por outro lado, moagem grossa demais, privilegiará a acidez na bebida.

Detalhe importante: coloque um pouco de água no Recolhedor. As primeiras gotas que saem do tubo são bastante pequenas e se o recipiente Recolhedor estiver seco, certamente terá paredes muito quentes, provocando a evaporação da água e a sedimentação do extrato na parede interna, que acaba conferindo sabor de queimado ao café. Com uma pequena camada de água, que ficará aquecida com o sistema, esse efeito é eliminado, e a bebida apresentará tudo que os grãos torrados tem a oferecer!

É possível, também, colocar água previamente aquecida na Caldeira, diminuindo o tempo do processo, assim como se faz no Syphon (= Sifão ou Globinho).

Experimente e comente aqui!

Um contrato com São Pedro

Thiago Sousa

Um dos maiores desafios que os agricultores tem é o de saber como o clima irá se comportar durante a safra que ele está cuidando. Diferentemente de uma indústria, que tem praticamente todos os fatores sob controle, trabalhar com a Natureza envolve um elemento que tem grande impacto e é incontrolável pelo Homem: o Clima.

Um período de seca fora de hora (conhecido como “Veranico”), dias de muita chuva, granizo e massas polares agressivamente frias fazem parte de um cardápio totalmente desafiador e inesperado a cada ano.

Por certo, o maior desejo de um produtor é o de ter umContrato com São Pedro onde ficariam definidas as épocas e quantidades de chuvas, bem como as temperaturas mais  adequadas a cada momento do desenvolvimento das lavouras.

Neste Ano Safra de Café, diversos fenômenos trouxeram grandes preocupações aos produtores. Desde inesperadas chuvas de granizo na Mogiana e Centro-Oeste de São Paulo na transição entre a Primavera e Verão em 2011 a uma seca prolongada a partir de Janeiro, num momento em que ter água em abundância é fundamental para que os frutos dos cafeeiros se desenvolvam perfeitamente deixou muita gente preocupada.

O Outono Brasileiro, que começou em 21 de Março, se mostrou bastante diferente do usual com Temperaturas Máximas e Mínimas, principalmente estas, bastante acima do normal. Prefiro trabalhar com estas duas temperaturas ao longo do ano e não com a chamada Temperatura Média que usualmente é empregada. Há uma delicada questão sobre o significado da Temperatura Média, que posso comentar em outra oportunidade..

Bem, quando essas duas temperaturas ficam mais elevadas, principalmente a mínima, significa que a entrada de Massas Polares é muito mais fácil, o que se traduz em chuvas num período em que não são normais ou, pior ainda, bem vindas. Frutas como os do cafeeiro tem um ciclo cuja colheita acontece entre o final do Outono e meados do Inverno. Se o Outono continua quente, as plantas entendem que ainda não chegou o momento para sua hibernação. Por outro lado, se as chuvas se prolongam com temperaturas relativamente altas, fazem com que as plantas continuem a trabalhar intensamente seus frutos, fazendo-os crescer. É por esta razão que em anos em que essa combinação acontece, os frutos do cafeeiro se apresentam maiores, pois as sementes continuam a crescer.

Chega um momento em que a casca externa dos frutos não conseguem mais acompanhar o crescimento das sementes. É quando essas cascas se rompem. Uma tragédia para a qualidade!

Cascas rompidas num ambiente de alta umidade se tornam portas de entrada a contaminações por fungos e bactérias. No caso de frutos que ficaram maduros e atingiram o estágio “Passa”, quando a casca externa começa a murchar e ficar mais escura, o ataque por microorganismos pode ser ainda mais desastroso, levando à podridão, que se reflete na xícara com a presença do Creosol e seu repugnante gosto químico.

A elevada umidade relativa do ar dificulta os trabalhos de colheita, porém muito mais nos procedimentos de secagem das sementes. Afinal, ar seco é o “santo remédio” contra a umidade nas sementes!

Observe na foto abaixo como os fungos se instalam na casca que começou a murchar. Ela não consegue isolar as sementes dos microorganismos que estão na superfície, que acabam migrando para as sementes, estragando-as definitivamente quando o ambiente está muito úmido.

Imagine que as variedades mais precoces, como o disputado Bourbon Amarelo, são justamente as mais afetadas por esse clima destemperado, prejudicando a qualidade da bebida. Por outro lado, com a umidade do ar mais elevada por um período prolongado, há prejuízo certo para os frutos que irão amadurecer ou se tornar Passa neste princípio de Inverno!

Problema sério!!!

Isto significa que a dificuldade para se ter sementes de qualidade excepcional será maior neste ano, enquanto que lotes com problemas de fermentações indesejadas se multiplicarão. Reflexo certo será o descolamento do preço de lotes de café de alta qualidade ante cotações dos de qualidade inferior.

Para uma esperada grande safra brasileira, como algumas empresas e instituições vinham pregando para este ano, esta pode ser uma pancada que provocará doloridas consequências para o cumprimento de contratos assumidos ainda no ano de 2011. Assim como foi em 2008…

Como preparar a mais fantástica xícara de café – 3

Thiago Sousa

Dois sistemas são de longe os mais comuns no Brasil para preparar café em casa: o Coador de Pano e o Coador de Papel no Sistema Melitta. Gostaria de comentar neste post sobre o Sistema Melitta, que é muito comum em diversos países consumidores de café.

Na verdade cada sistema de preparo de café tem seus segredos para se extrair A Mais Fantástica Xícara de Café e é no mínimo precipitado tentar sepultar um modo tradicional em detrimento de um mais moderno. Grande parte do pré conceito existente sobre o café coado em casa como inferior ao espresso, por exemplo, é resultado de diversos fatores somados, incluindo o fato deste último ser um serviço que tem maior poder de aliviar o peso existencial de sua carteira do que o coado.

Ainda hoje, é raro encontrar cafés de boa qualidade nas gôndolas dos supermercados e padarias, principalmente fora das grandes capitais, sendo corriqueiro encontrar em sua esmagadora maioria cafés na embalagem tipo Almofada, em geral destinada aos produtos de preço mais competitivo (e deve ficar claro que não tem milagre… produto mais barato é sempre inferior!).  Infelizmente, há um pensamento nesses locais de que coisa barata é que gira mais rápido. É por isso que fica a percepção de que o café preparado em casa é quase sempre medíocre, uma vez que a matéria prima é sofrível proporcionalmente.

Algumas indústrias tem procurado oferecer cafés de melhor qualidade e ensaiam trilhar novos rumos, empurradas pela nova e crescente legião de  micro torrefações especializadas em cafés de alta qualidade. Já era tempo…

A melhoria do padrão de qualidade do café bebido no Brasil depende de um esforço generalizado, que deve ter, inicialmente, nos produtores os primeiros divulgadores,  devendo aprender a provar seus cafés e, assim, saber falar dos aromas e sabores que cada lote pode expressar numa xícara. Este é um dos grandes desafios a serem vencidos, pois ainda é um pequeno número de produtores que separa seus melhores lotes para torrar e servir em sua propriedade.

Indústria, cafeterias e seus profissionais tem papel fundamental, não apenas ao se aperfeiçoar no conhecimento e nas técnicas de avaliação sensorial, mas, a partir de um sólido saber, tomar a missão de  explicar aos consumidores o que esperar em cada xícara que está sendo servida.

Em resumo: Educação, Educação e mais Educação!

O sistema Melitta tem o porta filtro com formato oval de sua boca, enquanto que espacialmente é o que se chama de Seção de Cone, pois não tem o bico, lembrando o “Chapéu de Napoleão”. Este porta filtro em particular tem um único furo relativamente grande e as suas estrias na parede seguem o sentido reto de cima para baixo.

Com essa geometria, a água tende a passar preferencialmente pelo centro desse “cone cortado”. E aí vem outra recomendação: depois de “lavar” o filtro de papel (para retirar o gosto dos alvejantes…) e fazer a SEMPRE necessária Pré Infusão, quando as gotas começam a cair mais espaçadamente, coloque o restante da água em fio fino pelas laterais para compensar a passagem mais rápida que acontece pelo centro (isto porque aí o caminho é mais curto…).

Fazendo isso, ter Uma Fantástica Xícara de Café ao final é quase certo!

A moagem ideal para o Sistema Melitta é a Média-Fina. Um dos problemas comuns é o de se usar cafés torrados com moagem muito fina, que acaba exigindo muito mais tempo para a extração além do necessário, tornando, portanto, a bebida muito mais amarga do que deveria. Se você tiver condições de moer os grãos torrados antes do preparo, tanto melhor!

Empregar cafés de perfil sensorial Básico, como chamamos os que tem apenas grande doçura (e, por isso, Corpo!), chamando principalmente notas de Caramelo, em bom equilíbrio com acidez cítrica, conferem Fantástica Xícara, bem como outros de perfil Complexo com notas florais, de frutas amarelas ou mesmo especiarias. O importante é o ajuste da moagem para se obter um bom efeito.

Uma forma prática para saber se a moagem está adequada ou próxima do ideal é verificar quanto tempo se leva para prepara o seu café. Os sistemas com coador tem como tempo recomendado entre 3 e 4 minutos, dependendo da quantidade que você irá preparar. Se o seu preparo levar muito menos dos 3 minutos, certamente a moagem está grossa ou a quantidade grãos moídos em relação a água está bem abaixo do recomendado. A bebida resultante fica mais ácida, quase azeda, e pode apresentar pouco corpo, pois deverá ser menos adocicada.

Por outro lado, se ultrapassar de longe os 4 minutos, ou a tem mais café moído do que o ideal ou a moagem é excessivamente fina. O resultado na xícara: amargor que lembra jiló ou Dipirona Sódica, típico da Cafeína e seus colegas Compostos Clorogênicos, bebida que chega a ser encorpada, mas com menor doçura do que o esperado…

Mercados consolidados, que tem consumidores mais conscientes e exigentes, tem sempre oferta de diferentes apetrechos a todo momento. Nesse quesito, o Japão é um país em que o modelo de consumo é considerado muito sofisticado devido ao alto poder aquisitivo de sua população e o gosto quase nato pela estética (vide a Ikebana ou as famosas cerâmicas). Assim, é muito comum se ver lá produtos especialmente desenvolvidos para aquele mercado (tanto é verdade que em geral as indústrias mantém linha de produtos “para o mercado interno” e “para exportação”, estes menos sofisticados do que os primeiros!), como estas duas incríveis peças desenvolvidas pela Melitta Japan!

Sim, a Melitta mantém no Japão uma linha de porta filtros de porcelana, sendo este um dos mais bonitos que eu conheço!

E, para completar, uma chaleira com um longo, sinuoso e fino bico para que a dosagem de água seja muito bem controlada, que lembra a fabricada por outra empresa japonesa que se tornou febre no Ocidente, a Hario.

Como preparar a mais fantástica xícara de café – 1

Thiago Sousa

Que tal aprender a preparar A MAIS FANTÁSTICA XÍCARA DE CAFÉ?

Parece difícil à primeira vista, mas existem algumas regras básicas, sempre acompanhadas, é claro, do bom senso e das famosas Leis da Natureza (ou, simplesmente, Ciência…). Tenha sempre em mente que estas valem sempre, até a última gota!

Para preparar a primeira das Mais Fantásticas Xícaras de Café que você pode reproduzir em casa, escolhi o Sistema Hario.

A Hario Glass Co. Ltd. é uma tradicional indústria japonesa de vidros especiais para laboratórios e medicina, fundada em 1921 por Hiromu Shibata. No início dos anos 60 sua atual fábrica, localizada em Koga, Ibaraki,  entrou em operação. Com reputação feita no meio médico e científico, passou a desenvolver diversas linhas de produtos, atendendo desde o setor de automóveis até a chamada linha residencial (tableware). E neste segmento se destacou graças ao belodesign de suas peças somado às geniais soluções  para serviços deChá e Café.

Até o final dos anos 90 as peças para estes serviços eram conhecidos apenas pelo sofisticado consumidor japonês. Na virada do milênio, a empresa resolveu fazer sua estréia no mercado norteamericano. Bingo!

Rapidamente ganhou a atenção e o respeito dos descolados apaixonados pelo café da Costa Oeste.Design caprichado e grande conhecimento demonstrado na concepção de cada peça, sua estréia teve efeito fulminante entre os baristas das cafeterias mais vanguardistas de Seattle, WA, e Portland, OR. Hoje sua linha tem peças que são objeto de desejo de todos os apaixonados por café!

Observe este que é o clássico Porta Filtro Hario, confeccionado em porcelana, na foto acima. A geometria escolhida foi a de um cone baseado em um triângulo equilátero.  Parece pouco? Mas, tem alguns conceitos muito bem pensados por trás disso tudo…

O seu centro é aberto o suficiente para acomodar a ponta do filtro, que quando aberto forma um cone de triângulo equilátero. Mas o grande diferencial está no inspirado desenho das estrias, que como se vê, lembra um vórtex!

Tiveram o cuidado de criar estrias relativamente protuberantes e de dimensões avantajadas quando comparadas, por exemplo, com um portafiltro da germânica Melitta. A água flui na lateral do filtro mais facilmente se houver um espaço entre ele e a parede cerâmica, pois esse vão permite que parte da água ganhe mais velocidade na medida que se desloca de alto a baixo.

É por isso que, após a sempre recomendável escaldada do filtro de papel com água fervente (para retirar resíduos das substâncias usadas na industrialização e que podem afetar o sabor da bebida), coloca-se o café torrado e moído fazendo um furo no centro, como está na foto acima. Ah, um detalhe importante: a água deve ser preferencialmente mineral, com pH levemente ácido (entre pH 5,0 e pH 6,5 está ótimo!), com uma quantidade de minerais (basta somar a lista de minerais que deve vir estampada no rótulo da água) que fique entre 100 e 175 ppm (= partes por milhão) e com baixo teor de carbonatos.

E vamos ao show

A moagem para a Hario deve ser a que chamamos de média-fina, mas não tão fina quanto para preparar um espresso. Como a velocidade de extração é muito maior do que num sistema Melitta, por exemplo, para uma moagem média o resultado na xícara serápouco fantástico, com excessiva acidez e pouca presença de açúcares na bebida. Ou seja, será um café desequilibrado.

Fazer a Pré Infusão é obrigatória. Sempre!

A Pré Infusão tem a missão de umedecer todas as partículas dos grãos moídos, justamente para que a extração seja uniforme. Se houver um ponto em que o pó ficou seco, grumos serão formados, prejudicando a extração (menos será extraído!).

Veja que coloquei água apenas no centro, onde havia um buraco no pó seco. Espere que as gotas da bebida extraída durante a pré infusão comecem a diminuir para, então, colocar o restante da água controlando bem a dosagem.

É recomendável que seja um fio de água quando começar a adicionar, que seja de início um pouco mais grosso em relação  aode que está saindo para a jarra ou xícara, para, depois que o filtro estiver quase cheio de água, ter as vazões semelhantes.

Uma alternativa é esperar que o nível de água no filtre baixe um pouco para, assim, completar. Jamais adicionar a água em grande vazão!

Outro detalhe: parte-se do princípio que foram escolhidos grãos de um lote de café honestamente bacana e que sua torra tenha sido bem feita. Exuberante pode ser, mas equilibrado sempre!

E…. Voilà: sua Fantástica Xícara de Café está pronta!

Sendo uma extração relativamente rápida, turbinada pelas estrias em vórtex, uma Fantástica Xícara de Café feita no Sistema Hario irá destacar a acidez da bebida, característica sensorial que confere brilho e vivacidade numa bebida docemente especial.

No Brasil, você pode encontrar algumas das primorosas peças da Hario no website do Martins Café(www.martinscafe.com).

A marcha dos robustas

Thiago Sousa

Tive algumas experiências muito interessantes nos últimos dias com cafés Robusta e Conilon, duas das principais variedades da espécie canephora, e surpreendentes combinações com variedades dearabica. 

Só para recordar, as plantas e frutos dessas duas espécies mantém muitas diferenças, apesar de conviverem com muita frequência em blends de todo o mundo. Além do número de genes, 44 na arabica e somente a metade, ou seja, 22 na canephora, gostaria de destacar algumas características que tem importante impacto sensorial: os teores de óleos, açúcares e de ácidos clorogênicos.

Sementes das variedades do canephora tem quase o dobro do teor de óleos e ácidos clorogênicos que nas doarabica, enquanto que nestas os açúcares é que estão em maior teor, praticamente o dobro que numRobusta ou num Conilon. A maior resistência às doenças fúngicas fez com que diversos trabalhos de melhoramento genético se utilizassem do canephora como base para as chamadas variedades modernas, entre elas o Obatã e o Catucaí.

No entanto, a mudança de composição entre esses elementos (óleos, ácidos clorogênicos e açúcares) pode se expressar mais intensamente dependendo das condições locais de produção. Nossa linha de  raciocínio sempre leva em conta o balanço de energia que está envolvido no Ciclo da Fruta (= Ciclo Fenológico), cuja tradução se dá pelo teor de açúcares e sua formação. Como sempre digo, açúcar é tudo na vida!

Assim como a maturação de uma fruta acontece quando o teor de açúcares geneticamente programado é alcançado, é, também, essa quantidade de açúcares que define como será o Perfil de Torra dessas sementes. Se globalmente a semente de uma espécie possui menor teor de açúcares que de outra, fica evidente que a quantidade de energia necessária para se atingir a Etapa de Pirólise  será diferente para cada uma.

Nesta foto apresento  um Gráfico Visual que utilizo nos cursos avançados de torra de café; no caso, corresponde a um Ciclo de Torra de Conilon. Observe que a Etapa Intermediária, que compreende as Reações de Maillard, é bastante extensa, principalmente se comparada com a etapa final, quando há o predomínio da Reação de Pirólise.

São essas diferenças, digamos, de nascença entre variedades dessas duas espécies que provocam sensíveis diferenças sensoriais!

O menor teor de açúcares faz com que notas de aroma e sabor que se originam na Etapa de Pirólise se pronunciem mais. Especiarias de caráter mais medicinal como uma nóz moscada, pimenta do reino e até cardamomo podem surgir e ser percebidos por pessoas sensíveis a estas notas. É por isso que comumente as pessoas acham “picante” o sabor de bebidas com presença de Robustas ou Conilon!

Recentemente a Nespresso relançou uma cápsula de edição limitada, o Kazaar. É algo surpreendente, pois segundo executivos da empresa, este relançamento foi resultado de uma longa lista de pedidos para que esse ousado blend de Robusta da Guatemala (uma das ousadias!), Conilon Capixaba (ousadamente Cereja Descascado) e um toque de arabica do Cerrado Mineiro. Aqui podemos afirmar que o Mestre de Blends foi genial, pois compensou a menor doçura resultante da torra dos canephoras com um convite aos grãos evidentemente de frutos maduros produzidos numa região privilegiada pelo clima seco durante a colheita.

Não é bebida fácil a desta cápsula de belo azul marinho, mas para iniciados. De potência extrema, reforçada pela extração hiperbárica(que pode atingir impressionantes 19 bar!) numa ecomoderna Pixie, de belo e inteligente design, exige certo preparo físico e psicológico, ainda mais que seu serviço recomendado é o ristretto!

Mas, vale a experiência sensorial, sem dúvida.

Fica clara a percepção do intenso amargor provocado pela avalanche de ácidos clorogênicos (da “família” da cafeína), das notas de sabor como tabaco e especiarias típicas de um robusta de alta qualidade, cujas arestas são minimizadas pela doçura e alteração na percepção de corpo provocadas pelo Cerrado Mineiro.

Para finalizar, gostaria de comentar sobre as variedades com híbridos de canephora, como o Catucaí e o Obatã. Em particular este último, que tenho acompanhado o comportamento de lavouras de diversas idades em diferentes territórios.

Mais uma vez, certamente numa das lavouras mais antigas de Obatã, localizada em São Paulo, em condições geoclimáticas que fazem com que a faceta fenotípica doscanephoras se expresse sem qualquer cerimônia, um efeito que nos leva a muitas reflexões se confirmou. Reconhecido como sementes de planta de variedadearabica, a bebida se mostrou muita próxima do…Kazaar!

Foi surpreendente, pois ajustando a concentração de ambos, a similaridade sensorial foi muito positiva, reconhecida até pelos alunos do último curso de Educação Sensorial em São Paulo.

O Que fizeram com minha teleobjetiva da Nikon?!

Thiago Sousa

Não faz muito tempo que as máquinas fotográficas de película, as tais que usavam filmes de 35mm, eram a mídia dominante (ou será que faz?).

Boa parte do pessoal que conhece o psicodélico Batman com Adam West e assistiu ao impagável Perdidos no Espaço (Lost in Space) teve uma câmera Kodak Rio 400 antes de subir degraus e partir para as tão sonhadas SLR. Neste grupo, marcas como as nipônicas Nikon e Mamiya eram verdadeiros sonhos de consumo.

A Nikon sempre foi referência devido às suas fantásticas lentes e as lendárias câmeras Série F. Eu tive a felicidade de ter uma F3, que foi a primeira máquina fotográfica dessa marca usando elevado grau de eletrônica embarcada (para a época, é claro!) no início de 1980. Além do robusto corpo em aço inox cirúrgico e impecável acabamento, aquelas câmeras brilhavam com a impressionante variedade de lentes intercambiáveis. Por exemplo, eu ainda tenho uma com estupenda luminosidade de F1.2 (!). Os iniciados saberão o que este número significa…

Como seria esperado, a Nikon lançou uma série de lentes de grande amplitude, como as 70-200 mm, consideradas levemente acima do padrão normal (= 50 mm, que se assemelha ao ângulo de visão humana) a algo como “meia” teleobjetiva. Hoje este tipo de lente é bastante difundida entre profissionais e amadores avançados com as modernas câmeras digitais.

Bem, toda essa memória foi resgatada quando visitei o muito recomendável website de compras de material para os “loucos” por fotografia The Photojojo(www.photojojo.com). Lá é possível encontrar coisas interessantíssimas para os que são apaixonados por fotografia e tem um iPhone S4 com companheiro inseparável.

Lá estava esta réplica de uma lente Nikon 70-200 mm que é nada mais, nada menos, que uma caneca térmica!

E dá-lhe café!

Cup Shock: Cafés do Brasil são Surpreendentes!

Thiago Sousa

Você já assistiu ao filme Bottle Shock, que no Brasil saiu com o nome de O Julgamento de Paris?

Lançado em 2010, este belo filme dirigido por Randall Miller conta a impensável história de um sommelier britânico radicado em Paris que resolve agitar o mundo dos vinhos ao viajar à América em busca de novos sabores e emoções.

Em 1976, Steven Spurrier, personificado pelo sempre impecável Alan Rickman, segue para o Napa Valley, CA, USA, para conhecer as vinícolas da primeira origem do que seria conhecido como Novo Mundo num puro projeto de garimpagem. Encontra a família Barrett, proprietária do hoje místico Chateau Montelena, e com o jovem Bo, vivido por Chris Pine, e seus inseparáveis amigos Gustavo (Freddy Rodriguez), um filho de imigrantes mexicanos e enólogo autodidata, e a bela Sam (Rachel Taylor), andam por toda a região.

Feita a seleção das melhores garrafas, Steven retornou a Paris, onde organizou o que seria a mais famosa degustação comparativa entre vinhos dos dois mundos: oClássico Francês versus o Caipira Californiano.

Grandes enólogos e sommeliers, acompanhados avidamente por importantes jornalistas, provaram às cegas e deram o seu veredito. E que acabou surpreendendo aos próprios juízes!

Belíssima fotografia, grandes elenco e uma trilha sonora embalada por deliciosas canções do The Doobie Brothers. Veja o trailer oficial através do link abaixo:

Há uma grande mensagem passada por este filmee que se presta muito bem aos cafeicultores do Brasil: assim como os vitivinicultores californianos, considerados rudes pelos franceses, muitos lotes simplesmente fantásticos tem sido produzidos em nosso país desde sempre!

 Alguns paralelos podem ser feitos com o nosso povo do café e os produtores de vinho do filme: há uma busca incessante em buscar o melhor na produção, apesar do certo ceticismo em relação à qualidade do que se produz.

Isto acontece com muita frequência por aqui, pois raros são os produtores que decidiram conhecer a fundo o que estão produzindo.

Nossos cafeicultores são competentes ao fazer as árvores produzirem frutos aos borbotões, mas cometem falhas que se mostram fatais no quesito qualidade no momento da colheita e da secagem. Quando, muitas vezes apenas guiados pela intuição ou por pura sorte conseguem ultrapassar essa fase, esbarram numa comercialização que em geral se parece como impenetráveis muralhas.

Pessoas como o personagem Gustavo, que procurou estudar a fundo a bebida, sua produção, conceitos técnicos e, principalmente, aprender a degustar, devem se multiplicar também na cafeicultura. No caso do café, nem sempre o tamanho das sementes, conhecido como “peneira”,  é sinal de que o lote tem excelente bebida. Portanto, aprender a degustar e saber como o seu café bebe é parte do ofício do novo cafeicultor.

Conhecimento é o que define o domínio do jogo comercial.

Quando o nível de conhecimento é semelhante, existe equilíbrio e, em geral, a comercialização segue um rumo saudável. Quando o desequilíbrio acontece, quase sempre pendendo para o lado de quem compra, o saldo pode ser amargo para o produtor.

Não há outra saída: aprender, treinar e, assim, conhecer cada lote de café produzido. Degustar é manter diálogo com a bebida, conhecer seus deliciosos segredos ou mesmo seus defeitos e problemas que podem macular o lote. Só assim o cafeicultor pode realmente chamar cada lote de “seu filhote”!

Se você assistiu ao filme, vai entender porque o Cup Shock ( ou o Choque das Xícaras!) chegou aosCafés do Brasil: veja nesta foto a tabela de preços de cafés de uma cafeteria referência em Portland, OR. Sim, é justamente um café brasileiro o mais caro da lista entre tantos outros mais famosos!

E que seus aromas e sabores justificaram plenamente o seu valor, reconhecidos por Mr. Spurriers do Café de diversos países!

Por que Blend? – 1

Thiago Sousa

Cada boca, uma sentença!

Já ouviu algo assim?

Na verdade, o ser humano é sempre único, quero dizer, se não existem duas pessoas iguais (nem mesmo os gêmeos univitelíneos!), muito menos duas pessoas terão exatamente as mesmas percepções. Cada órgão do nosso corpo tem, digamos, uma capacidade operacional como ouvidos mais sensíveis ou um nariz extremamente bem equipado com  milhares de sensores olfativos. Porém, tudo isso só será bem empregado desde que haja uma “central” de grande desempenho para processar informações e correlacionar com diversas experiências para, então, chegar a uma dedução de bom senso.

Imagine que você está numa cafeteria muito bacana, belo ambiente e, então, é hora de pedir um café. Você dá uma olhada na carta de cafés e decide pedir um coado do Blend da Semana.

Hum… e o que seria, afinal o Blend da Semana?

Algumas casas são altamente didáticas e procuram explicar ao consumidor “Louco por Café” como foi que chegaram ao Blend da Semana que está sendo servido. Você pode pensar: “Puxa, estou no Brasil, não tenho a possibilidade de encontrar um café produzido em Limu, na Ethiopia, ou mesmo um sempre instigante Guatemala de Hue Huetenango.”

Não tenha essa preocupação, até porque se você chegou a este ponto certamente já é sabedor de que o Brasil tem origens de café que se esparramam do Ceará ao Paraná e, portanto, podem ser encontrados cafés com uma riqueza impressionante de aromas e sabores com um punhado de países do Hemisfério Norte!

Numa descrição sensorial do café pode haver uma referência à sua acidez (alta ou muito discreta), encorpado (muito ou nem tanto) e a alguma nota de aroma que remete a algo bem conhecido uma flor ou uma fruta seca como nozes. Observe que, no fundo, muito da descrição será percebido por você desde que uma experiência semelhante tenha sido vivenciada. Só podemos descrever uma sensação depois de sentí-la!

A partir da descrição, uma expectativa é criada. “Será esse Blend da Semana tudo isso que escreveram?”

Chega o tão esperado café!

Perfumado, de aroma intenso… seria floral ou uma fruta? O risco de se somatizar a percepção de uma dada nota aromática é muito grande após saber qual é a descrição sensorial, principalmente quando a experiência em desvendar aromas e sabores é pequena e a insegurança que o pouco conhecimento provoca é muito grande. Indução quase que inevitável.

Para superar essas barreiras, experimente! Muito! Sempre! Tudo!

Voltando ao Blend da Semana… para os Iniciantes, é desejável que seja bem fácil e agradável de beber. “Fácil” é um termo que usamos para cafés com bebida, digamos, descomplicada, ou seja, com menor quantidade de informações sensoriais, centradas em sabores mais comuns. Um exemplo: uma bebida que tenha o clássico aroma com notas a caramelo, de boa intensidade; na boca a primeira coisa que se percebe é uma boa doçura, que revela a presença de boa quantidade de açúcares e, portanto, de que os grãos são de frutas colhidas maduras, como se deve! Pode haver um elegante toque cítrico devido a uma acidez de intensidade suficiente para, também, “quebrar” as notas “melosas” de caramelo.

De forma simplificada, ao se pensar num Blend (sim, o que fazemos é Blend Design) a primeira questão é saber quem vai beber (será um iniciante ou iniciado?), como vai beber(ah… qual o melhor preparo?) quando (hum… pela manhã algumas pessoas gostam de sabores ligeiros, espertos, enquanto que à tarde algo mais repousante, caminhando para o relaxamento). Nem sempre um único lote de café produzido numa fazenda específica apresenta um leque extenso de informações sensoriais. É quando se torna necessário combinar diferentes lotes produzidos em diferentes fazendas de localidades distintas.

Um café produzido em região montanhosa tem uma tendência a apresentar maior acidez, enquanto que um produtor se especializou em produzir Naturais que carregam deliciosas notas que lembram frutas como o pêssego. Por outro lado, combinar diferentes variedades pode resultar em cafés de maior complexidade, isto é, que trazem muitas informações sensoriais, o que  é ótimo para testar a evolução de sua capacidade de degustar!

Sobre arabicas e robustas – 2

Thiago Sousa

Os grãos de café da espécie robusta, cuja variedade mais cultivada no Brasil é o Conilon, tem grande importância na composição dos blends industriais, cuja esmagadora maioria disputa espaço nas gôndolas dos supermercados, onde, devido ao modelo de venda, os consumidores se mostram muito sensíveis aos preços.  Basicamente, nas gôndolas de supermercados são vistos em maior oferta cafés torrados na tradicional embalagem almofada e em alto vácuo. São, de fato, os maiores hits de vendas da indústria no Brasil, ocupando a maior fatia do mercado, abastecendo desde concorrências para fornecimento de “Cestas Básicas”, repartições públicas e grandes empresas, além de serem os ainda mais consumidos nas residências brasileiras.

Manter preços competitivos no varejo foi uma das razões para que o ritmo de crescimento do consumo do café em todo o mundo se mantivesse vigoroso desde então. Portanto, a produção crescente de robustas, muito mais produtivos e com menor custo de produção que lavouras de arabica,  permitiu a manutenção de consumidores cativos e a entrada de iniciantes. Em mercados novos, o tipo de café torrado mais usado é o Solúvel, pela sua praticidade e facilidade de preparo. Afinal, começamos a fazer de nossas atividades um rito somente depois que adquirimos experiência e familiaridade.

É importante observar que todos os grãos, de qualquer espécie e variedade que sejam, tem seu papel relevante no mercado e que o crescimento de consumo se faz através de todos os seus segmentos, desde os mais competitivos aos mais sofisticados. Apesar da grande diferença sensorial que um Conilon ou um Bourbon podem apresentar, cada um tem o seu espaço no mercado e na composição dosblends. Existe um efervescente movimento preocupado em aprimorar os atributos sensoriais do Conilon, seja com maior cuidado durante a colheita e secagem, seja na introdução de processos que podem deixar seu sabor mais agradável ao consumidor.

Obviamente, o Conilon não apresenta a mesma complexidade de sabores que um excepcional arabica, pois como possui menos açúcar e mais substâncias alcalóides, seu sabor é, em geral, picante, mais, digamos, “amarrado” e um “panorama” mais para uma planície do que à exuberância de uma cadeia de montanhas.

Algumas empresas vem testando o mercado apresentando grãos para espresso apenas com robustas. Tudo bem, o resultado não lá muito motivador, mas a experiência é válida. Se não experimentarmos, não poderemos nunca comparar e opinar.  Este é um caso extremo, combinando consumo sofisticado com quebra de paradigmas. Há que se tranqüilizar, pois em termos sensoriais, um blend mistoarabica-robusta ou single de um Catuaí Amarelo continuarão agradando muito mais, porém, para alguns, é um sinal de que um Conilon ou Robusta bem preparados podem surpreender…

Outro ponto importante de discussão é o fato de que mesmo no caso dos arábica, ainda há um longo caminho a se percorrer no campo da torra. Muita tecnologia está sendo desenvolvida, softwares, indicadores e sensores, mas, muito estudo ainda é necessário.

Apesar dos surpreendentes avanços, os temas a serem explorados são incontáveis também.

ABLE: Um filtro inoxidável para Aeropress!

Thiago Sousa

Já tem um bom tempo que comentei sobre a Aeropress, um tipo de preparo de café que é feito numa engenhoca que lembra uma grande seringa de injeção. Feita em plástico de grande resistência, tem um encaixe numa das pontas onde é fixado uma tampa perfurada, que é o local que fica o filtro de papel.

Seu inventor é um cafemaníaco da Califórnia, USA,  que fabrica discos de plástico chamados frisbe que o pessoal adora para brincar na praia ou nos gramados com seus cachorros.

Vendido a pouco mais de 20 dólares nos Estados Unidos, rapidamente ganhou adeptos e hoje seu uso é bastante comum em muitos lugares.

O êmbolo possui uma borracha bastante justa e que confere boa pressão durante a fase de extração. Daí o cuidado necessário para que não se faça esse procedimento sobre peças frágeis ou mesmo em locais instáveis. Com a força que é preciso para empurrar o êmbolo na extração, acidentes podem acontecer caso aqueles cuidados não sejam tomados.

A extração por Aeropress é interessante porque mescla alguns princípios que considero muito importantes e que tem alto impacto no que se resulta numa xícara de café: tamanho das partículas do café moído, tempo de contato com a água e o turbilhonamento.

Como abordei diversas vezes, na extração a relação entre o tamanho das partículas moídas e o tempo de contato com a água tem muita importância sobre o que pode se obter na xícara. Estes são os mesmos princípios que encontramos caso o preparo seja numaFrench Press. Nem muito grosso, nem fino demais. Assim deve ser o resultado da moagem para uma promissora extração.

Recentemente foi lançada este filtro feito em aço inox pela Able, sugerindo-se como substituto do filtro de papel especialmente para a Aeropress. Assim como acontece com as coisas que foram criadas pelo genial Steve Jobs, nos cafés especiais há uma profusão deCoffee Geeks que imaginam e inventam coisas para tornar ainda mais emocionante as experiências com cafés bem bacanas!

E onde está a grande idéia por trás do Able?

Quando você pressiona o êmbolo para fazer a extração, a pressão gerada é relativamente grande (sinceramente, ainda não medi…). Se o filtro for perfurado, é razoável se pensar que neste caso o próprio “bolo” formado pelo café moído funcione como filtro, assim como acontece no espresso.

Observe na foto como a perfuração da peça é muito bem executada!


Farei uma série de teste e postarei para compartilhar com vocês. Até lá!

Sobre flores, frutos, casca e conhecimento

Thiago Sousa

O triunfo do barista campeão de El Salvador, Alejandro Mendez, no último WBC – World Barista Championship que aconteceu em Bogotá, Colombia, ainda hoje é tema de comentários entre o pessoal do café.

AlejandroMendez.JPG

Afinal, experientes baristas de países com presença tradicional neste campeonato alinharam-se na arena para mostrar técnica e criatividade em xícaras de café e parecia improvável que um barista de um país produtor de café levasse o título de campeão do WBC 2011.

Como se sabe, durante 15 tensos minutos cada competidor tem de preparar um espresso, um cappuccino e uma bebida de assinatura sem ingrediente alcoólico para cada juiz sensorial. Essa apresentação é fruto de um longo trabalho de preparação que vai desde a seleção dos grãos de café para as bebidas, ingredientes e concepção sensorial, além da trilha sonora que dá o toque especial à performance. Portanto, é um período em que diversos profissionais se unem apoiando e treinando o barista em cada etapa.

Baristas com certa experiência em competições, como era também o caso do Alejandro, sabem que alguns detalhes são importantes como o comportamento de seu blend na xícara, a interação com o leite (é claro que sem se esquecer da sua qualidade!) e com os outros ingredientes na bebida de assinatura. Portanto, uma combinação de técnica, que é desenvolvida através de uma boa e quase sempre longa vivência em balcão junto às máquinas e moinhos, que pode ser simplesmente traduzida por intimidade com esses elementos.No entanto, a criação da bebida de assinatura necessita de um outro elemento que acaba sendo decisivo quando há um alto nível técnico entre os competidores: uma inspirada criatividade!

E isso não faltou ao Alejandro, somando-se, de quebra, um grande conhecimento técnico que revela muito refinamento. O que a princípio parecia ser uma sandice, se mostrou uma pequena obra prima com toques de maestria. 

Sua bebida de assinatura era uma genial composição de infusões e extração de diferentes partes e fases do fruto do cafeeiro!

Uma infusão das flores como um chá de flores brancas.

O cafeeiro é um primo distante da Gardênia, ambos rubiaceas, e suas flores tem um intenso aroma, que por vezes lembra o jamim pela sua doçura.

E uma bebida usando a polpa do fruto? Muito criativo!

Lembrando que a polpa da fruta madura do cafeeiro tem grande doçura e muitas substâncias de sabor, preparar um licor dela é como preparar um de jaboticaba. Sim, isso mesmo! E com uma vantagem adicional, que é dada pela extensa oferta de variedades de cafeeiros entre vermelhos e amarelos… 

Usar a casca como base de bebida, pode?

Em alguns países, caso do Yemen, a casca é destinada para o preparo de uma bebida chamada Qeishr. As regiões produtoras de café daquele país ficam em áreas de raras chuvas e baixa umidade do ar, de forma que os grãos são colhidos quando entram em sua fase passa, apresentando, impressionantemente, cascas sem qualquer tipo de contaminação por fungos,  somando-se o fato do quase inexistente emprego de agroquímicos.

O Qeishr é usualmente composto pela adição de especiarias como o cardamomo e canela, cujas receitas são guardadas a 7 chaves pelos diversos, digamos, Mestres de Blends de Qeishr!

Pelo fato de ser um produto (a casca) que origina uma bebida muito apreciada (o Qeishr), o comércio da casca é regular. No entanto, os dois produtos são distintos, bem como suas respectivas bebidas: Bun(café por infusão, como você pode ver na foto acima, no copo à esquerda) é Bun, enquanto que Qeishr (no copo do centro) é Qeishr. Uma questão de lógica e respeito ao consumidor. 

Ah, para finalizar a explicação sobre a última foto: à direita um copo com Bun e leite. Uma média yemeni

23rd SCAA Show & Coffees of the year competition

Thiago Sousa

E hoje foi a abertura da 23. Edição do SCAA Show, o maior e mais importante evento de cafés especiais promovido pela SCAA – Specialty Coffee Association of America, desta vez em Houston, TX, USA. Além de abrigar a maior feira do setor, com presença de empresas de máquinas, equipamentos, insumos e utensílios para a indústria e cafeterias, tem diversas atividades educacionais e competições, sendo a mais importante o USBC – United States Barista Competition, que seleciona o representante norte-americano para o WBC – World Barista Competition.

 Outro evento que é muito badalado é o Roasters Guild Coffee of the Year Competition, onde cafés de diversos países com entidades irmãs da SCAA enviam amostras para serem avaliadas por juízes degustadores, Q Graders e SCAA Cupping Judges.Estes devem ser participantes do Roasters Guild, o grande grupo de discussão e educação para profissionais da indústria de torrefação organizada pela SCAA.

Dentre os diversos comitês de trabalho da SCAA, há o IRC – International Relationship Council, fórum que reune entidades representativas de cafeicultores de países produtores, onde o Brasil possui como representantes a BSCA – Associação Brasileira de Cafés Especiais e o Conselho do Café do Cerrado, além da ABIC – Associação Brasileira da Indústria do Café como membro convidado. 

No quadro acima estão os cafés escolhidos como Top 10 ou 10 Melhores Cafés do Ano pela SCAA. Gostaria de fazer algumas observações sobre os resultados.

A primeira coisa que salta aos olhos é a distância que o café campeão, produzido emCaucaColômbia, teve diante o vice: praticamente 2 pontos na escala SCAA. Numa competição dessa natureza, é uma diferença que impressiona, pois em geral esses cafés estão em nível de qualidade muito próximos, como pode ser observado na pontuação obtidas pelos outros lotes.

O lote de café vencedor é da variedade Geisha, que deu fama à panamenha Finca Esmeralda da região de Boquete, cujas lavouras ficam numa área de vulcões ativos e a expressivos mais de 1.600 m de altitude. Essa combinação confere á bebida exuberante acidez, efervecente e crepitante na boca. E por isso alçou os preços de lotes de Geisha produzidos naquela propriedade a valores antes impensáveis.   

 Nos últimos anos o perfil de bebida do café colombiano sofreu mudanças substanciais devido à utilização de variedades não tradicionais, à introdução de novas áreas de plantio a menores altitudes e, principalmente, pelo emprego da desmucilagem mecânica. Assim, a acidez, sua principal característica, perdeu a maior presença do ácido lático, que é formado no processo de fermentação aeróbica nos tanques de demucilagem. O fato de um lote Geisha produzido na Colombia ter conquistado o primeiro lugar no Coffee of the Year Competitioncertamente mostrou que o mercado sempre está apresentando supresas!

Destaquei o processo de secagem do terceiro colocado, que obteve a excelente pontuação de 89,46 pontos SCAA, que é o mais empregado no mundo e no Brasil: o Natural, quando os frutos são secos com a casca. E aqui outra surpresa: o café foi também produzido em Cauca, Colombia!

Incrível, não?!

 A imagem que a Colombia vende há mais de 30 anos é a de que produz Cafés Lavados (= Washed), como sinônimo de Café Despolpado, e que numa sutil mensagem induz a pensar que cafésNaturais ou Não Lavados (= Unwashed, portanto, não despolpados), produzidos principalmente pelo Brasil, seriam “sujos”!

É irônico pensar que o lote colombiano que obteve a terceira colocação foi produzido pelo processo Natural, à frente de 7 outros lotes. Isso demonstra que mais do que o processo escolhido para secagem, é o conjunto de cuidados que o produtor tem de tomar que definem a qualidade final do lote. Caso a variedade fosse o Bourbon Amarelo, pois apenas foi apontado que é Bourbon, outro ironia do destino se somaria: o Bourbon Amarelo foi originalmente encontrado nos altiplanos de Botucatu, SP, sendo historicamente conhecido como o Amarelo de Botucatu, portanto, variedade genuinamente brasileira aprimorada pelo venerando IAC – Instituto Agronômico de Campinas.

Observe que o quarto e nono colocados, cafés de El Salvador e da Guatemala, respectivamente, são da variedade Bourbon Amarelo. Também genuinamente brasileiro, outro resultado do magistral trabalho dos pesquisadores do IAC – Instituto Agronômico de Campinas, é a variedade Catuaí, presente no lote boliviano que ficou na oitava posição.

A reflexão que esses resultados nos levam é a de que o Brasil tem um setor de pesquisa genética que faz um trabalho primoroso, bem como nos setores de fisiologia e nutrição,  sem deixar de mencionar a pesquisa de processos de secagem. E se a Colombia está tentando reescrever sua história com a oferta de excepcionais cafés produzidos pelo método Natural, devem as entidades de produtores de Cafés do Brasil estimularem ainda mais para que todos trilhem os caminhos da Qualidade + Conhecimento + Tecnologia.

Finalmente: à exceção dos dois lotes produzidos na Bolívia, cujas áreas cafeeiras estão a majestosas altitudes, todos os outros são de origens localizadas no Hemisfério Norte. É questão de calendário: neste período, os cafés daquelas origens estão com o frescor da colheita recente, como acontece com os cafés brasileiros em outubro!

Do pó sairás… – 1

Thiago Sousa

Café, Café, Café.

Cafés Especiais. Cafés Excepcionais. Simplesmente café…

Preparar uma bela xícara de café ou mesmo uma jarra, envolve um processo que a ciência chama de Extração. Afinal, o que é essa tal de extração?

Extrair significa “retirar algo de dentro”, que, cá entre nós, seria a alma de cada semente do fruto do cafeeiro…  

Podemos pensar que até chegar à xícara, o grão de café (na verdade, a semente da fruta do cafeeiro) passa por três Vidas. O seu primeiro Ciclo de Vida, que ocorre ligada à planta, começa em cada Primavera, quando uma profusão de alvas e perfumadas flores se abrem e rapidamente se fecundam, tendo seu encerramento exatamente no momento em que todos os açúcares esperados se formam e essa frutase mostra avermelhada ou douradamente madura.

A vida da fruta junto à roça termina ao ser colhida, seguindo para o processo de secagem e beneficiamento, quando suas cascas são retiradas. É quando se dá seu segundo Ciclo de Vida, agora como Café Cru (=  Green Coffee) ou matéria-prima para a indústria de torrefação, seja de grande escala, seja artesanal. Este ciclo, para cafés de alta qualidade, é relativamente pequeno, não ultrapassando o tempo de uma nova colheita.

A próxima etapa é o processo de Torra do Café.

 Podemos considerar o processo de torra como a sublimação da essência do grãozinho de café. Ele muda de forma e estrutura para deixar sua essência ainda mais evidente!

Uma torra magistralmente conduzida, respeitando-se todas as potencialidades que o grão carrega e que foram devidamente ungidas pelas influências geográficas em sua origem, adicionadas do toque de artesão do produtor, faz vir à tona toda a riqueza de aromas e sabores. Fecha-se outro Ciclo de Vida, o de matéria-prima, para dar lugar ao terceiro e de maior brilho para as pessoas: a da bebida. Este é um ciclo extremamente curto se comparado temporalmente com os anteriores, mas que possui uma magia incrível!

O café na xícara, independentemente do serviço, é amaterialização de sua essência , trazendo evidência à toda riqueza de aromas e sabores que estavam intangíveis desde a lavoura, ao mesmo tempo em que ele se pereniza em nossa memória sensorial! Traduzindo: ao preparar uma xícara de café estamos como que tornando suas qualidades perceptíveis aos nossos Sentidos e tornando o delicioso ato de beber em algo inesquecível, mesmo que dure poucos instantes.

É por isso que o preparo dessa maravilhosa bebida tem de ser executada com todo o rigor técnico e muita, mas muita emoção!Cada xícara preparada, seja como espresso, num coador de papel ou numsyphon, tem sua arte e técnica mais apurada a ser usada. Assim como toda obra de arte, preparar ou extrair um café tanto mais exuberante é se, além da inspiração na execução, uma série de regras e conhecimento forem empregadas em toda sua extensão.

Dois elementos são fundamentais na extração: a água e o moinho. 

A água é o elemento que vai extrair a alma do café ao passar pelo grão feito em partículas. Portanto, a Moagem dos grãos tem importância muito grande para que a extração seja eficiente. E para cada tipo de preparo de café, existe uma faixa de tamanho de partículas que dá melhor resultado. Por exemplo, a moagem para o espresso é fina, enquanto que para uma French Press (= Prensa Francesa) pode ser mais grossa. Ah, o tamanho médio das partículas também tem grande impacto no resultado!

O tamanho das partículas pode se estender por uma faixa mais ou menos extensa dependendo do tipo de moinho usado. E é isso que vamos ver em seguida…

Por que o café é bebida singular?

Thiago Sousa

A palavra Singular tem, segundo o Dicionário Aurélio, estes sentidos: “único, individual; especial, raro; aplicável a um só sujeito”. Se levarmos esses sentidos para uma perspectiva de raciocínio lógico, podemos ver que há uma notável correlação com conceitos estatísticos.

A saga das sementinhas de café até nossas xícaras de cada dia iniciam-se durante a fase da floração. Numa lavoura de café, apesar de semelhantes, nenhuma planta é exatamente igual a outra, pois cada qual é um indivíduo. Mesmo entre os dedos de uma mão, cada um tem sua individualidade!

Veja nesta foto como cada flor está num estágio sutilmente diferente das outras, assim como existem também botões fecundados. É, na vida tudo transcorre como uma grande corrida, onde cada um de nós acaba ficando em diferentes colocações.

Em cada fase do ciclo da vida dos frutos do café, essas pequenas diferenças de tempo de floração podem se tornar dramaticamente maiores em razão de uma série de efeitos determinados pelo clima ou pela nutrição dada à planta, por exemplo.

Se lembrarmos que o fruto do café amadurece apenas enquanto estiver preso à planta, o momento em que é feita sua colheita tem influência direta no que poderemos perceber na xícara durante a degustação.

A foto ao lado mostra muito bem como cada fruta tem, digamos, velocidade diferente em seu processo de amadurecimento. Deve ser levado em conta que pelo menos foram 4 floradas diferentes que ocorreram, identificadas pelas distintas cores. Como comentei anteriormente, o ponto “Maduro” da fruta corresponde quando ela adquire a cor avermelhada como cerejas maduras, no caso das variedades vermelhas, ou alaranjada, quando forem variedades amarelas. Antes disso, o teor de açúcares é menor do que o que em um fruto perfeitamente maduro, levando a diferentes resultados durante a torra das sementes do café.

O processo de torra do café é na realidade um complexo conjunto de reações químicas regido pela energia que é posta num torrador. Porém, as respostas de cada grão (= semente ) de café dependem do ponto de maturação da fruta durante sua colheita.

Observe na foto ao lado que, numa primeira vista, podemos admitir que o resultado da torra está uniforme, ou seja, com os grãos praticamente com o mesmo tom de marrom. Mas, ao se observar mais atentamente, veremos que existem sutis e até consideráveis diferenças nos tons de cor!

Alguns estão com um tom que lembra chocolate ao leite com bastante cacau, que indica que são sementes de frutos que estavam perfeitamente maduros quando foram colhidos. Tons mais claros indicam que as sementes são de frutos imaturos, daqueles que darão a sensação de adstringência quando experimentarmos na xícara. Adstringência é aquela sensação incômoda de aspereza e secura na boca, como quando comemos uma banana ou caqui verdes. Isso é sempre um péssimo indicador de qualidade. Lembre-se que Qualidade Sensorial do Café está definitivamente ligada à uniformidade de maturação das sementes usadas para preparar um xícara, preferencialmente originadas de frutos maduros.

Costumo dizer que o espresso é o serviço de café que é o exemplo máximo do significado de Bebida Singular. Se pensarmos na técnica italiana, que utiliza 7 gramas de café torrado para extrair 30 ml de espresso, essa quantidade corresponde a aproximadamente 50 grãos torrados. Como a quantidade é pequena, é razoável pensar que se houver um único grão proveniente de um fruto verde, o estrago será amplificadamente percebido na xícara!

Deixando de lado estas situações desastrosas, se forem 50 grãos de frutos perfeitamente maduros, cuidadosamente secos e selecionados (o olhar atento e as papilas privilegiadas dos Juízes Degustadores são decisivas aqui…), magistralmente torrados (ah, a mão e sensibilidade do Mestre de Torra se revelam nesse momento!) e inspiradamente extraídos por hábeis Baristas,certamente a Experiência Sensorial será memorável!

Veja que nenhuma xícara de espresso será igual a outra! Por mais uniforme que seja o lote de café, por mais regular que seja o Barista em cada extração, os resultados não se repetem. Além do mais, cada pessoa tem uma sensibilidade particular, de forma que a percepção de cada uma será sempre distinta de outra.

É por isso que o Café é uma Bebida Singular!

Trip to Yemen – 6: Videos

Thiago Sousa

Para completar esta série sobre a incrível viagem ao Yemen com direito a conhecer as mais antigas lavouras de café do mundo, estou incluindo 2 vídeos.

O primeiro vídeo mostra Tallook, onde é praticada cafeicultura sombreada a 1.300 m de altitude. Veja uma bonita cerimônia com serviço de Bun (café) e Qishr, e se surpreenda em saber que lá a associação é de produtoras (mulheres), funcionando muito bem!

Veja agora imagens do antigo Porto de Mocha, o Mar Vermelho (Red Sea) e  Taiz, maior cidade do Yemen e seu belo mercado. Ao final a divertida cantoria de Steve, do Kenya, cantando Akuna Matata, imortalizado no filme da Disney “O Rei Leão” pela impagável dupla Timão e Pumba, e como o café cria fortes laços de amizade: