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São Paulo

The Coffee Traveler by Ensei Neto

CIÊNCIA

Café: Mitos, paradigmas e dogmas – 1

Thiago Sousa

A primeira bebida global. Isto é o café.

Imagine que há mais de 1.000 anos o cafeeiro é cultivado nas áridas montanhas do Yemen e nos altiplanos da Ethiopia, tendo o Porto de Mocha comooprincipal ponto comercial de suas sementes “não férteis” (isto porque não se permitia que as sementes circulassem para os destinos consumidores com a casca denominada pergaminho para evitar a propagação das plantas) por séculos até chegar à elite européia como bebida para estimular o espírito e daí, definitivamente, ganhar o mundo.

Com um histórico milenar, é natural que MitosParadigmas e atéDogmas surgissem em torno do Café, seja o café fruto do cafeeiro, seja o café a semente (ou grão cru) como matéria prima para a torrefação ou, ainda, o café bebida na xícara. A idéia central desta série de posts é justamente comentar o que faz ou não sentido (paradigmas e dogmas) e o que se torna folclórico (mitos).

Um dos Paradigmas mais conhecidos é o de que todo o café de boa qualidade produzido em nosso país é exportado, ficando apenas “o resto” para ser torrado. Faz sentido em boa parte.

Para se compreender melhor porque isso acontece, devemos lembrar que o Brasil assumiu posição de maior produtor mundial de café no último quarto do Século XIX, período que coincidiu com o fim do período Imperial, desbancando a até então soberana Indonésia e mantendo com folga até os dias de hoje essa liderança.  Sendo um produto voltado para o mercado internacional, a lógica de comércio que prevalece é a de que o que o que é vendido tem de ser de boa qualidade.

Quando você vai às compras, primeiramente verifica-se a qualidade do produto e, então, o seu preço, muitas vezes comparando com similares. Afinal, o cliente tem o poder de manter ou retirar o vendedor do mercado quando o ambiente é competitivo.  

Esta é a lógica de comercialização por parte do produtor. Os melhores lotes sempre são vendidos com maior facilidade. E sendo o Brasil um país produtor, é natural que a oferta de matéria prima para a indústria local é grande, desde grãos de boa qualidade aos terrivelmente ruins como os fermentados ou fraudulentos como cascas externas, que muitas vezes carregam grande quantidade de açúcares da polpa seca, conhecida como palha melosa. Ainda é muito comum entre os cafeicultores deixarem para seu consumo (isso mesmo, para oferecer aos visitantes de sua propriedade!) os piores lotes como os chamados Fundos e Quebrados, Fundo de Ventilação (onde ficam muitos dos verde-pretos) e suas variações. Em casa de ferreiro, espeto de pau!

Formou-se um círculo vicioso composto por produtores que fornecem estes produtos sofríveis e até de má-fé, torrefações de baixa categoria que acreditam que ganharão espaço vendendo um produto de preço competitivo (= barato), porém com total ausência de boa qualidade de bebida.

Neste ponto, a IN-16 (Instrução Normativa) do MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, que define especificações e normas para o café industrializado, vem para arrumar o mercado. Assim esperamos.  Indústrias que respeitam o consumidor não tem o que temer, sendo a IN-16 capaz de coibir fraudes que empregam misturas pouco recomendáveis no café torrado e moído. 

Mas o cenário mudou bastante nos últimos 12 anos no Brasil. A crise de preços que aconteceu no início deste milênio e que perdurou até meados de 2004 estimulou o surgimento de um novo participante em nosso mercado: a pequena torrefação de cafeicultores. Como se diz no interior: “o sapo não pula por boniteza, mas por precisão (= por necessidade)” …

Premidos pelos baixos preços, quase não cobrindo as despesas de produção, alguns cafeicultores lançaram-se ao mercado de café torrado. O segmento de espresso experimentava grande expansão e com a melhora da economia brasileira, o poder de compra turbinado da população também estimulou a experimentação por produtos e serviços mais sofisticados. Marcas como Pessegueiro e Orfeu, por exemplo, tornaram-se casos de sucesso, levando de quebra como mensagem adicional o fato dos grãos de café serem de um produtor identificado.  

Hoje muitos lotes excepcionais de café ficam em nosso país, adquiridos por torrefações de cafés especiais e cafeterias que procuram oferecer o que há de melhor. Casas como Suplicy e Santo Grão, em São Paulo, Lucca, de Curitiba, Rubro, do Rio de Janeiro, e, fora desse eixo, a novata mas surpreendente Ateliê do Grão, de Goiânia, oferecem cafés maravilhosos como encontráveis em suas irmãs norte-americanas ou do norte europeu. E outras casas em diversos outros Estados e no interiorzão estão surgindo aos borbotões num saudável movimento.

Ou seja, é um paradigma que está mudando rapidamente…

Projeto educacional: Cursos e workshops para coffee lovers

Thiago Sousa

O Conhecimento promove o chamado Consumo Consciente, quando as pessoas passam a consumir com base nos valores que atribuem aos produtos. Esses Valores são mescla de elementos não tangíveis, isto é, que são aqueles ligados especificamente com nossa Razão e Sentimento, com outros perceptíveis, que provocam Sensações muito agradáveis. O resultado dessa combinação é o Valor que pode ser dado a alguma coisa ou serviço, maior ou menor dependendo do que foi a experiência.

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Depois de consolidar os Cursos Avançados em São Paulo, que realizamos nas completas instalações do CPC – Centro de Preparação de Café do Sindicafé de São Paulo, como oSensorial, que também prepara os alunos para os exames de Q Grader do CQI – Coffee Quality Institute, e o de Ciência da Torra do Café, voltado para o aprimoramento técnico dos Mestres de Torra, estamos iniciando uma nova fase de nosso Projeto Educacional.

A partir de Maio terá início nova série de Workshops e Cursos especialmente desenhados para Consumidores eProfissionais em novos locais.

A primeira série é a dos Workshops denominados Jornada Sensorial, onde pretendemos mostras diferentes perspectivas na degustação de café a partir da cultura local. O primeiro deles será no Ateliê do Grão, em Goiânia, GO, certamente a cafeteria mais high tech da América do Sul. Utilizaremos muitos elementos da gastronomia goiana, ou seja, ingredientes, aromas e sabores do dia a dia das pessoas daquela incrível parte do Cerrado, tornando essa  experiência muito divertida e instigante. A se realizar nos dias 20 e 21 de Maio, tem o total de 5 horas-aula. Apesar de seu modelo mais específico para consumidores apaixonados por café, acredito que profissionais também poderão experimentar algo novo. O Ateliê do Grão fica à Rua 36, 354, Setor Marista, Goiânia, GO, e você pode obter mais informações com o Rodrigo pelo telefone 62-3226-0101 e o email rodrigo@ateliedograo.com.br .

Outra série é a que lançaremos em São Paulo, SP,  denominada Mestres do Preparo do Café.

Veja que nos últimos anos diversas novas formas de preparo de café ganharam os balcões e mesas das cafeterias ao redor do mundo, como os Chemex, Aeropress, Syphon e os novos porta-filtros e filtros da japonesa Hario, além do indispensávelespresso. Os moinhos também vem num processo de evolução tecnológica muito grande, até caso de equipamento incorporando 2 sistemas diferentes de moagem, como o Versalab M3!

Portanto, conhecer e aprender a explorar as possibilidades de cada modo de preparo disponível no mercado torna-se indispensável para que os profissionais, tanto os donos de cafeterias como os baristas, por exemplo, continuem atualizados. A constante evolução do mercado e o maior acesso às informações faz com que consumidores mais exigentes procurem por esses novos serviços.

A primeira edição do Mestres do Preparo do Café em São Paulo terá lugar nas modernas instalações da Astória Máquinas nos dias 26 e 27 de Maio, em horário integral, num total de 14 horas-aula.  A Astória Máquinas fica na Rua Oscar Freire, 2172, São Paulo, SP, e para mais informações entre em contato com o Tiago através do 11-3062-8415 e 11-8429-6962 e pelo emailtiago@astoriamaquinas.com.br .

E a grande novidade para os “loucos” e apaixonados por café é a Viagem de Conhecimento Café, um Sabor Brasileiro.

Latitudes, sediada em São Paulo, é uma empresa de turismo especializada em Viagens de Conhecimento, com grande experiência em viagens internacionais  para destinos pouco tradicionais e roteiros muito interessantes. Fazer parte da equipe deEspecialistas Latitudes será uma oportunidade diferente para compartilhar experiência com a Cultura do Café.  

Nesta viagem iremos acompanhar uma colheita de café numa tradicional fazenda produtora localizada no centro do Estado de São Paulo. Serão 3 dias em imersão no Mundo Café, conhecendo a colheita, secagem, benefício e torra do café. Irei comentar um pouco sobre a história e curiosidades do café no Brasil, além de fazer uma iniciação na arte da degustação. A Fazenda Monte Alto produz café há mais de 100 anos e seu maravilhoso casarão tem boas estórias para contar. Um bom começo para novosCoffee Hunters!

Você pode ter todas as informações sobre esta viagem com a equipe Latitudes através do telefone 11-3045-7740 e email latitudes@latitudes.com.br  e pelo website www.latitudes.com.br .

23rd SCAA Show & Coffees of the year competition

Thiago Sousa

E hoje foi a abertura da 23. Edição do SCAA Show, o maior e mais importante evento de cafés especiais promovido pela SCAA – Specialty Coffee Association of America, desta vez em Houston, TX, USA. Além de abrigar a maior feira do setor, com presença de empresas de máquinas, equipamentos, insumos e utensílios para a indústria e cafeterias, tem diversas atividades educacionais e competições, sendo a mais importante o USBC – United States Barista Competition, que seleciona o representante norte-americano para o WBC – World Barista Competition.

 Outro evento que é muito badalado é o Roasters Guild Coffee of the Year Competition, onde cafés de diversos países com entidades irmãs da SCAA enviam amostras para serem avaliadas por juízes degustadores, Q Graders e SCAA Cupping Judges.Estes devem ser participantes do Roasters Guild, o grande grupo de discussão e educação para profissionais da indústria de torrefação organizada pela SCAA.

Dentre os diversos comitês de trabalho da SCAA, há o IRC – International Relationship Council, fórum que reune entidades representativas de cafeicultores de países produtores, onde o Brasil possui como representantes a BSCA – Associação Brasileira de Cafés Especiais e o Conselho do Café do Cerrado, além da ABIC – Associação Brasileira da Indústria do Café como membro convidado. 

No quadro acima estão os cafés escolhidos como Top 10 ou 10 Melhores Cafés do Ano pela SCAA. Gostaria de fazer algumas observações sobre os resultados.

A primeira coisa que salta aos olhos é a distância que o café campeão, produzido emCaucaColômbia, teve diante o vice: praticamente 2 pontos na escala SCAA. Numa competição dessa natureza, é uma diferença que impressiona, pois em geral esses cafés estão em nível de qualidade muito próximos, como pode ser observado na pontuação obtidas pelos outros lotes.

O lote de café vencedor é da variedade Geisha, que deu fama à panamenha Finca Esmeralda da região de Boquete, cujas lavouras ficam numa área de vulcões ativos e a expressivos mais de 1.600 m de altitude. Essa combinação confere á bebida exuberante acidez, efervecente e crepitante na boca. E por isso alçou os preços de lotes de Geisha produzidos naquela propriedade a valores antes impensáveis.   

 Nos últimos anos o perfil de bebida do café colombiano sofreu mudanças substanciais devido à utilização de variedades não tradicionais, à introdução de novas áreas de plantio a menores altitudes e, principalmente, pelo emprego da desmucilagem mecânica. Assim, a acidez, sua principal característica, perdeu a maior presença do ácido lático, que é formado no processo de fermentação aeróbica nos tanques de demucilagem. O fato de um lote Geisha produzido na Colombia ter conquistado o primeiro lugar no Coffee of the Year Competitioncertamente mostrou que o mercado sempre está apresentando supresas!

Destaquei o processo de secagem do terceiro colocado, que obteve a excelente pontuação de 89,46 pontos SCAA, que é o mais empregado no mundo e no Brasil: o Natural, quando os frutos são secos com a casca. E aqui outra surpresa: o café foi também produzido em Cauca, Colombia!

Incrível, não?!

 A imagem que a Colombia vende há mais de 30 anos é a de que produz Cafés Lavados (= Washed), como sinônimo de Café Despolpado, e que numa sutil mensagem induz a pensar que cafésNaturais ou Não Lavados (= Unwashed, portanto, não despolpados), produzidos principalmente pelo Brasil, seriam “sujos”!

É irônico pensar que o lote colombiano que obteve a terceira colocação foi produzido pelo processo Natural, à frente de 7 outros lotes. Isso demonstra que mais do que o processo escolhido para secagem, é o conjunto de cuidados que o produtor tem de tomar que definem a qualidade final do lote. Caso a variedade fosse o Bourbon Amarelo, pois apenas foi apontado que é Bourbon, outro ironia do destino se somaria: o Bourbon Amarelo foi originalmente encontrado nos altiplanos de Botucatu, SP, sendo historicamente conhecido como o Amarelo de Botucatu, portanto, variedade genuinamente brasileira aprimorada pelo venerando IAC – Instituto Agronômico de Campinas.

Observe que o quarto e nono colocados, cafés de El Salvador e da Guatemala, respectivamente, são da variedade Bourbon Amarelo. Também genuinamente brasileiro, outro resultado do magistral trabalho dos pesquisadores do IAC – Instituto Agronômico de Campinas, é a variedade Catuaí, presente no lote boliviano que ficou na oitava posição.

A reflexão que esses resultados nos levam é a de que o Brasil tem um setor de pesquisa genética que faz um trabalho primoroso, bem como nos setores de fisiologia e nutrição,  sem deixar de mencionar a pesquisa de processos de secagem. E se a Colombia está tentando reescrever sua história com a oferta de excepcionais cafés produzidos pelo método Natural, devem as entidades de produtores de Cafés do Brasil estimularem ainda mais para que todos trilhem os caminhos da Qualidade + Conhecimento + Tecnologia.

Finalmente: à exceção dos dois lotes produzidos na Bolívia, cujas áreas cafeeiras estão a majestosas altitudes, todos os outros são de origens localizadas no Hemisfério Norte. É questão de calendário: neste período, os cafés daquelas origens estão com o frescor da colheita recente, como acontece com os cafés brasileiros em outubro!

Do pó sairás… – 2

Thiago Sousa

O café teve como sua primeira forma de preparo a infusão, como dizem suas lendas e história milenares, sendo conhecida como Ibriq e é forma tradicional da região do antigo Porto de Mocha,Yemen. Para que pudesse ser preparado sem o uso de qualquer tipo de filtro, o pó tem moagem bastante fina, quase como um talco, como pode ser também  encontrada  em algumas marcas depreços muito competitivos aqui no Brasil.

Mas com o tempo e a popularização da bebida na Europa, novas formas de preparo surgiram e, em sua esteira, os equipamentos e maquinários. Dentre os equipamentos, os moinhos tem papel fundamental, pois são os responsáveis pela preparação dos grãos de café para a extração do café (= bebida!).

Comentei no post anterior que a essência ou alma do café tem uma série enorme de substâncias formadas e que passam a se expressar mais retumbantemente durante o processo de torra como açúcaresácidoscompostos clorogênicos e proteínas. Cada uma dessas substâncias tem um sabor característico e que pode ser mais ou menos evidente na xícara dependendo de como foi feito a extração. Em geral, numa xícara de café um pouco mais de 97% corresponde à água (incrível não?!), um pouco mais ou um pouco menos dependendo do serviço escolhido, deespresso a French Press. É por isso que a água tem de receber atenção especial para que o resultado na xícara seja sempre delicioso!

Da mesma forma, isso nos leva a pensar como somos sensíveis para perceber e reconhecer sabores! Imagine que 2% a 3% do volume de uma xícara de café contem centenas de substâncias!

Os moinhos devem também receber cuidadosa atenção, pois o resultado na xícara também depende de como as partículas ficam depois da moagem. Basicamente, existem dois modelos mais comuns em razão do tipo de mós: moinhos com mós cônicos e os com mós planas ou de discos.

Cada tecnologia tem os seus defensores e aqueles que não são fãs, mas a verdade é que ambos os tipos funcionam bem. É claro que o material que compõe o equipamento tem muita importância, bem como alguns detalhes de tecnologia como ângulos de ataque, distribuição de microlâminas e etecetera e tal.

O resultado final da moagem pode ser aferido através da chamadaDistribuição de Tamanho das Partículas, que pode ser verificada graficamente, em geral assumindo a forma de uma curva chamada deCurva de Gauss, que lembra a “cacunda” de um dromendário, isto é, uma área central que se parece com um grande calombo, refletindo a maior quantidade de partículas do grão moído com tamanhos próximos à regulagem feita, enquanto que partículas muito menores e outras muito maiores, em menor quantidade, ficam nas pontas do calombo. Uma moagem pode ser considerada eficiente quando esse calombo tem uma chamada dispersão pequena, ou seja, as pontas não ficam muito distantes do centro dele. E isso tem uma influência bárbara na extração!

Ao lembrarmos que a água é que irá retirar a alma, bem como seus pecados e suas virtudes, de dentro das partículas do café moído, ela acaba usando uma, digamos, lista de prioridades das substâncias a serem retiradas, definida pela propriedade denominada Solubilidade (em Água, no caso): osácidos são mais solúveis, como o Cítrico e Málico, portanto são extraídos com prioridade, depois osaçúcares, aí é a vez das proteínas e, finalmente, oscompostos clorogênicos, como a Cafeína. É porisso que o café tem bebida mais amargalembrando jiló, que é o sabor da Cafeína e seus colegas Clorogênicos, quando as partículas necessitam um longo tempo de contato com a água.

Quero comentar um pouco sobre o inspiradíssimo moinho Versalab 3, que você pode conferir nesta e na foto anterior: ele combina dois tipos de mós!

Os grãos de café, dosados em câmaras específicas para cada recipiente, passam inicialmente por um conjunto de mós cônicas, que devido às diferentes velocidades ao longo dos cones cortados  faz o serviço sem causar grande aquecimento, sendo, portanto, ótima solução para ajudar a preservar notas aromáticas e de sabor de maior sensibilidade ao calor. Em seguida, passam pelas mós planas (= discos), que finalizam o serviço com um ajuste magnífico da dispersão do tamanho das partículas do grão moído. O resultado é fantástico pela uniformidade que se obtém!

Daí para a extração, pode-se dizer que o sucesso do sabor na xícara está praticamente garantido!

Por ora, somente a high tech Ateliê do Grão, em Goiânia, GO, tem este incrível moinho na América Latina em conjunto com uma Slayer para espresso.

Pessoal, se vocês quiserem experimentar, vale a viagem!

Do pó sairás… – 1

Thiago Sousa

Café, Café, Café.

Cafés Especiais. Cafés Excepcionais. Simplesmente café…

Preparar uma bela xícara de café ou mesmo uma jarra, envolve um processo que a ciência chama de Extração. Afinal, o que é essa tal de extração?

Extrair significa “retirar algo de dentro”, que, cá entre nós, seria a alma de cada semente do fruto do cafeeiro…  

Podemos pensar que até chegar à xícara, o grão de café (na verdade, a semente da fruta do cafeeiro) passa por três Vidas. O seu primeiro Ciclo de Vida, que ocorre ligada à planta, começa em cada Primavera, quando uma profusão de alvas e perfumadas flores se abrem e rapidamente se fecundam, tendo seu encerramento exatamente no momento em que todos os açúcares esperados se formam e essa frutase mostra avermelhada ou douradamente madura.

A vida da fruta junto à roça termina ao ser colhida, seguindo para o processo de secagem e beneficiamento, quando suas cascas são retiradas. É quando se dá seu segundo Ciclo de Vida, agora como Café Cru (=  Green Coffee) ou matéria-prima para a indústria de torrefação, seja de grande escala, seja artesanal. Este ciclo, para cafés de alta qualidade, é relativamente pequeno, não ultrapassando o tempo de uma nova colheita.

A próxima etapa é o processo de Torra do Café.

 Podemos considerar o processo de torra como a sublimação da essência do grãozinho de café. Ele muda de forma e estrutura para deixar sua essência ainda mais evidente!

Uma torra magistralmente conduzida, respeitando-se todas as potencialidades que o grão carrega e que foram devidamente ungidas pelas influências geográficas em sua origem, adicionadas do toque de artesão do produtor, faz vir à tona toda a riqueza de aromas e sabores. Fecha-se outro Ciclo de Vida, o de matéria-prima, para dar lugar ao terceiro e de maior brilho para as pessoas: a da bebida. Este é um ciclo extremamente curto se comparado temporalmente com os anteriores, mas que possui uma magia incrível!

O café na xícara, independentemente do serviço, é amaterialização de sua essência , trazendo evidência à toda riqueza de aromas e sabores que estavam intangíveis desde a lavoura, ao mesmo tempo em que ele se pereniza em nossa memória sensorial! Traduzindo: ao preparar uma xícara de café estamos como que tornando suas qualidades perceptíveis aos nossos Sentidos e tornando o delicioso ato de beber em algo inesquecível, mesmo que dure poucos instantes.

É por isso que o preparo dessa maravilhosa bebida tem de ser executada com todo o rigor técnico e muita, mas muita emoção!Cada xícara preparada, seja como espresso, num coador de papel ou numsyphon, tem sua arte e técnica mais apurada a ser usada. Assim como toda obra de arte, preparar ou extrair um café tanto mais exuberante é se, além da inspiração na execução, uma série de regras e conhecimento forem empregadas em toda sua extensão.

Dois elementos são fundamentais na extração: a água e o moinho. 

A água é o elemento que vai extrair a alma do café ao passar pelo grão feito em partículas. Portanto, a Moagem dos grãos tem importância muito grande para que a extração seja eficiente. E para cada tipo de preparo de café, existe uma faixa de tamanho de partículas que dá melhor resultado. Por exemplo, a moagem para o espresso é fina, enquanto que para uma French Press (= Prensa Francesa) pode ser mais grossa. Ah, o tamanho médio das partículas também tem grande impacto no resultado!

O tamanho das partículas pode se estender por uma faixa mais ou menos extensa dependendo do tipo de moinho usado. E é isso que vamos ver em seguida…

Programe-se: Agenda de cursos para Belo horizonte

Thiago Sousa

Conhecimento aguça os sentidos!

Veja a Agenda de Cursos e Workshops de ABRIL 2011 para Belo Horizonte.

Teremos mais uma turma, a Turma 3, do Curso de Avaliação Sensorial – Metodologia SCAA, especialmente desenhado para aACADEMIA DO CAFÉ. Estão sendo oferecidos os Módulos 1 e 2, respectivamente chamados de Módulo Boca e Módulo Nariz.

Cada Módulo tem a duração de 16 horas-aula. São dias muito intensos. Muitos exercícios mesclados com profunda base científica em excelente equilíbrio, como tem de ser também cafés bacanas.

No Módulo BOCA, são abordados temas como Sabores Básicos, Ácidos Orgânicos comumente encontrados nos cafés e os diferentes Tipos de Amargor. Já no Módulo NARIZ todos terão a oportunidade de realizarem treinamentos com o conjunto de aromas conhecido por Le Nez du Cafe (= Nariz do Café), desenvolvido pela equipe de Jean Lenoirexclusivamente para a SCAA – Specialty Coffee Association of America.

As inscrições já estão abertas e as vagas são limitadas!

A grande novidade é a realização do primeiro de uma série de Workshops para formar MESTRES DO PREPARO DO CAFÉ.

Afinal, quantas formas diferentes de preparo de café existem?

Você sabe extrair um excelente café mesmo num simples e casualCoador de Papel?

Para quem não pode viver sem o seu café de todos os dias, o grande desafio será conhecer os segredos de cada preparo, que será seguido de degustação para compreender sensorialmente os resultados. Divertido e esclarecedor.

O diferencial da série de workshops é o seu horário: 4 horas-aula distribuídos em dois dias em horário noturno. Comodidade e um bom pretexto para o Happy Hour Cafeinado.

ACADEMIA DO CAFÉ, de Bruno Souza, e o CAFEOTECH, deste seu Coffee Traveler, oferecem cursos, workshops e treinamentos com conteúdos diferenciados e de classe internacional num ambiente agradável e descontraidamente brasileiro.

Você pode obter mais informações através do telefone 31-3223-8565 com Débora ou pelo endereço de email academiadocafe@gmail.com

Aguardo vocês!

Espresso de Fogão: Bacchi Espresso

Thiago Sousa

As máquinas de espresso, principalmente as profissionais, são equipamentos complexos dotados de caldeiras, válvulas, sensores, um sem fim de tubos e diversos controles para que a extração de um café sob alta pressão seja tão precisa quanto possa. Acabam sendo pequenas obras de engenharia em estado de arte!

Para que as poderosas caldeiras funcionem, uma boa quantidade de energia elétrica é exigida, de modo que, também,  muita eletrônica embarcada acaba fazendo parte dessas modernas máquinas (sem falar na iluminação por leds que vem ganhando muitos adeptos).  Para ter em casa uma máquina profissional, mesmo que de um único grupo, sem uma preparação hidráulica e elétrica adequada não é recomendável.

Como contraponto, surgiram alguns equipamentos manuais, mais parecendo gadgets, como a Mypressi, que usa as mesmas cápsulas com nitrogênio comuns às cremeiras pressurizadas. O problema é  o resultado em geral meio sem graça, quase medíocre, apenas o suficiente para dizer que, no meio de uma excursão às montanhas ou numa bela praia, foi possível desfrutar de uma xícara de espresso

Um equipamento que me surpreendeu pelo seu inusitado conceito é o Bacchi Espresso, criado pelo italiano Andrea Bacchi, que conheci através dos Companheiros de Viagem Márcio Carneiro e Stella Bahiense, ambos exemplares Coffee Geeks!

Andrea Bacchi tem um escritório especializado no desenvolvimento de soluções eletromecânicas em Correggio, Reggio Emilia, Italia, e, como todo bom italiano, não vive sem o seu espresso de cada dia… Inspiradamente criou a sua Bacchi Espresso, cujo vídeo de funcionamento pode ser acessado pelo linkhttp://www.caffemotive.com/Bacchi_Espresso.html .  

Este equipamento é genial e tem dois conceitos muito interessantes: seu mecanismo de funcionamento é o de Alavanca Hidráulica, enquanto que sua montagem lembra um  conjunto Grupo Errogador + Porta Filtro invertidos.

Na foto ao lado, produzida pela equipe da Orphan Espresso (www.orphanespresso.com/Bacchi-Design-Study_ep_618-1.html) mostra as três partes principais, a partir da esquerda: a base, que vai ao fogo literalmente, o corpo com pistão e o grupo com o porta-filtro com saída dupla.

Na base há um pequeno recipiente para colocar água (aproximadamente 30 ml) e que recebe o calor da chama diretamente. Como na montagem há boa vedação com o emprego de borrachas e outros apetrechos, essa parte funciona como uma pequena panela de pressão, fazendo com que a temperatura do vapor de água vá além dos 125 C, forçando, assim, o pistão que fica no corpo intermediário. E aqui está a sacada genial: o pistão tem uma parte com diâmetro maior, que fica embaixo, enquanto que em cima o diâmetro da peça fica com medida que corresponde à metade. Para a pressão, o efeito é o contrário: área maior, pressão menor; área menor, pressão maior.

Estima-se que junto ao porta-filtro a pressão fique em torno de 9 bar (Bingo!!!). O resultado é muito bom!

Pense comigo: dispensa energia elétrica, é portátil, não é caro (em torno de 250 euros na Itália), possui muito boa pressão, vai direto à boca de um fogão, leva em torno de 6 minutos para extrair 2 xícaras deespresso e tem um design muuuuuito simpático!

Dá p´ra ficar fã…

Assista ao vídeo a seguir para ver que belo espresso ele extrai: 

Escarlate 27: De São Paulo a Maastrich

Thiago Sousa

O dia 17 de Março foi o último dia do complexo de competições junto ao 10. Campeonato Brasileiro de Barista, em São Paulo, SP.

Além da tão esperada final da competição de baristas, outra final, a do Coffee in Good Spirits,  prometia ser uma ratificação: o grande talento de Marco De la Roche.

Spirit é a palavra em inglês que se refere às bebidas espirituosas, como se diria em clássico português, ou seja, aquelas produzidas por destilação de uma bebida fermentada como o vinho. O Coffee in Good Spirits é a única competição em que uma bebida alcoólica deve fazer parte da receita.

Marco, que tem passagem pelos balcões de café, é apaixonado por bebidas, sendo hoje muito bem conceituado consultor emMixologia. Mas, duas coisas sempre me chamaram atenção: primeiro o seu tino perfeccionista e, por isso mesmo, o segundo, sua avidez em estudar e aprender. Sólido conhecimento técnico é que permite altos vôos conceituais.

Sua apresentação começou a ser arquitetada com muitos meses de antecedência a partir de algumas rabiscos básicos. Daí vem a fase de pesquisa para materializar sua inspiração.

Seu drink de assinatura que lhe conduziu ao Bi Campeonato em 2010, chamado de Monte Cristo, já dava mostra do potencial criativo de Marco, ao mesclar uma infusão de camomila preparada sob média-alta pressão, feita numa Aeropress.

E veio 2011.

O nome do seu novo drink de assinatura, Escarlate 27, já insinua o que está por detrás de sua concepção.

Escarlate é o nome que se dá à cor que tem o vermelho como predominante e um leve toque de alaranjado. Sim, o vermelho tem muito com a bebida…

O número 27, segundo Marco, indica o número de ingredientes que ele escolheu para essa composição!

Ufa! Escolher 27 elementos realmente foi um grande trabalho.

A idéia básica é um insinuante passeio pelos sabores vermelhos. Um profusão de frutas vermelhas faz parte desse passeio sensorial: framboesa, cranberry, mirtilo, groselha negra, amora, morango e cassis, entre outras. 

Flores? Sim, não poderiam faltar: rosas, hibisco e rosa mosqueta. Fazem parte, ainda, frutas cítricas como a laranja, e especiarias que vão da pimenta rosa ao gengibre, passando pela nóz moscada e canela!

A receita completa pode ser acessada através deste link: http://marcodelaroche.blogspot.com/2011/03/escarlate27.html

Como introdução, Marco preparou um livreto, primeira foto deste post, contendo fotos e descrição das bebidas de sua apresentação, o obrigatório Irish Coffee (que teve a feliz coincidência de ter a final no dia de celebração de São Patrício, dia 17 de Março!) e o Escarlate 27.

A execução do drink é deslumbrante, como mostra esta foto do DrinkLab.

Infusões à parte, o toque magistral estava não apenas na surpreendente cesta de frutas vermelhas em casca de gelo, mas o uso inusitado de uma fava de baunilha comocanudo!  Marco borrifou uma infusão de rosas e frutas vermelhas na cesta de frutas, potencializando a percepção aromática. O “canudo orgânico” levava o adocicado e perfumado toque da baunilha à bebida, cujo final destacava o sabor do café.

A riqueza de notas de aroma e sabor podem ser sentidas perfeitamente, num verdadeiro desfile onde cada classe de sabores se revela no momento certo. Simplesmente genial.

Esta criação vale não só uma viagem para Maastrich, Holanda, onde Marco representará o Brasil no campeonato mundial, mas para qualquer outro lugar ou até várias voltas ao mundo…

Quem tem medo do sabor amargo?

Thiago Sousa

Como comentei no post anterior, os Sabores Básicos são aqueles percebidos exclusivamente na boca, daí terem estreita relação com o Paladar.

Antigamente, acreditava-se que cada parte da língua percebia seletivamente um dos sabores, conceito que caiu por terra ao se compreender que tudo depende do tipo, quantidade e como se distribuem as Papilas Gustativas. As papilas são classificadas quanto ao seu formato, podendo ser a Fungiforme, que lembra uma pequena bolinha, a Filiforme, que se parece com cabelinhos, ou a Caliciforme, que tem o formato de um botão e é maior que as anteriores.

Cada língua possui uma configuração própria, assim como as digitais ou a íris, o que faz com que cada pessoa tenha percepções diferentes para determinados sabores.

Entre os Sabores Básicos, existe um que sua aceitação é um típico caso de Ame-o ou Deteste-o. Sim, estou me referindo ao Sabor Amargo, que é percebido de forma específica pelas Papilas Caliciformes Posteriores, aquelas que ficam no fundo da língua. Por exemplo, a dona da língua da foto acima adora coisas predominantemente adocicadas, preterindo automaticamente aquelas amargas.

O tipo de sabor amargo que é geralmente identificado por essas papilas é aquele devido, principalmente, às substâncias alcalóides e ácidos clorogênicos. Para se ter uma idéia mais clara, é o sabor encontrado no jiló ou na jurubeba, frutos primos da Família das Solanáceas. No caso do café, este é o tipo de Sabor Amargo aceitável porque é da natureza do nosso grãozinho básico…

Eu, particularmente, não gosto do sabor amargo. Nunca gostei, para ser sincero!

Uma das coisas típicas de mineiros, baianos e goianos é o fato de terem em sua culinária a presença de ingredientes que conferem esse sabor aos pratos. É um povo que adora um amargor… mais intensificado no período da Quaresma. Certamente um resquício da cultura católica portuguesa.

No entanto, numa rápida peregrinação por distintos butecos de Belo Horizonte, juntamente com o grande Companheiro de Viagem Eduardo Maya, inspirado mentor do incrível evento Comida de Buteco, quebrei escrita quanto a comer jiló!

Estivemos no Bartiquim, do simpaticíssimo Bolinha,que fica no delicioso bairro de Santa Tereza. Primeira cortês oferta, Bolinha ofereceu o jiló à moda. A princípio declinei, mas a insistência do Eduardo foi muito grande, de forma que cedi. Aliás, cedi e capitulei!

Não fiquei apenas na primeira fina peça, mas pedi uma segunda porção…

Sabedor da resistência natural da maioria das pessoas para o sabor amargo, Bolinha fatia finamente o jiló, deixando em descanso em uma vasilha com água. Através de um básico princípio de Osmose, os alcalóides e companhia limitada se transferem para a água. As fatias do jiló recebem uma primeira camada de queijo curado ralado para ganharem uma fina massa de farinha de trigo e ovo. Frito em óleo bem quente, o resultado é um cocrante, saboroso e de, eu diria, inócuo amargor. Ah, e nada como uma excelente cachaça para acompanhar…

Magistral!

Outro aspecto muito bacana desse evento Comida de Buteco que deve ser destacado é o capricho e espírito de pesquisa despertados nos Chefs Butequeiros ao lidar com os diferentes ingredientes temas de cada edição. E, além de tudo, resgata a cultura gastronômica de comunidades e locais que estavam caindo no esquecimento devido aos novos padrões de comida trazidos pelos movimentos globalistas.

Umami: um raro sabor no café

Thiago Sousa

Até recentemente, quatro eram os Sabores Básicos, percebidos especificamente na língua, considerados: DoceSalgadoÁcido e Amargo.

O que distinge um sabor básico de um complexo é o fato de que este último precisa da ajuda do nosso Olfato para ser sentido, como o de frutas ou um dos chocolates. O Nariz tem papel fundamental para captarmos esse tipo de sabor e que faz parte de uma paleta muito extensa. Por outro lado, os sabores básicos, que podemos dizer que são tipicamente da Boca, podem ser percebidos mesmo que estejamos constipados, pois a língua é o principal “equipamento” de identificação!

Cada sabor básico possui um receptor específico, isto é, uma molécula que “reconhece” o estímulo provocado por um deles especificamente, transmitindo imediatamente a informação para o cérebro, que compara com o que está na “biblioteca” (= nossa memória gustativa) e identifica, finalmente, o sabor.

No início do século passado, o pesquisador japonês Kikunae Ikeda conseguiu identificar um receptor para o Ácido Glutâmico, cuja presença lhe pareceu notável em alimentos com alto teor de proteína, principalmente carnes. A esse novo sabor, confirmado em 1969 por pesquisadores da Universidade de Miami, deu-se o nome de Umami, que ganhou status de Sabor Básico, sendo o quinto desse seleto time.

O Umami é o sabor típico de proteínas, em geral compostas por aminoácidos que tem átomos de enxofre em sua estrutura molecular. Este, inclusive, é um dos sinais identificadores da sua presença num determinado alimento ou bebida.

Para pessoas acostumadas com os sabores da culinária oriental, este sabor fica relativamente fácil de, digamos, compreender. Um bom exemplo onde encontrá-lo é no molho, conhecido por tarê, usado para marinar um típico prato japonês de verão, oHiashi Somen, que lembra o macarrão capellini.  O molho é feito através de uma redução em água de um tipo de alga marinha, mais larga, cultivada principalmente nos mares ao norte do arquipélago japonês, cogumelos e lascas de peixe seco.

Para as pessoas que não tem tanta familiaridade com os sabores orientais, creio que o sabor de batata doce é o mais fácil para criar uma associação.

No café é um sabor raro de se encontrar. Porém, tive a oportunidade de encontrar num lote produzido na Fazenda Califórnia, de propriedade da família do Luiz Roberto Saldanha Rodrigues, em Jacarezinho, Norte Pioneiro do Paraná.

Na foto acima vemos como o ciclo de frutificação da variedade Obatan é longo, particularmente para aquela localização, apresentando um fases distintas por período muito acima do esperado, principalmente por se tratar de um lavoura com primeira produção. Por isso, também pudemos inferir que possivelmente a acidez do café poderia ser acima da média. Bingo!

Esse lote, que recebeu o número de #145, tem aroma com notas iniciais que lembram batata doce e doce de marron glacê, além de um fundo como capim limão. Na boca, a primeira surpresa, para os afeitos à culinária oriental, vem o sabor típico de algas marinhas e o cogumelo negro shitake, seguido de  notas como rapadura e erva cidreira, complementados por uma presença de intensa e elegante acidez cítrica.

Por tudo isso, este lote fez juz para integrar o Projeto Sharing Coffees, onde cafeterias irmãs, no Brasil e no exterior, compartilham o mesmo lote, num modelo de grande sinergia de informações e experiências. No caso, está disponível no Brasil na high tech cafeteria Ateliê do Grão, de Goiânia, GO, e em Tokyo, Japão,  na Horiguchi Coffee.

Café, açúcar e adoçantes

Thiago Sousa

Você já percebeu como é quase lugar comum associar um adoçante com o café?

Todas as peças publicitárias de adoçantes, incluindo aí filminhos de 15 e 30 segundos, mostram como o principal uso do adoçante (sacarina, ciclamatos, steviosideo, sucralose e outros que tais…) adoçar café!!!

Isso sem falar nas várias propagandas de açúcar…

É, não é à toa que tudo isso leva a crer que o café é uma bebida amarga!

Na realidade, esse entendimento, digamos, errôneo começou há milênios com os famosos versos que descreviam a bebida do café como sendo ”escura como a noite, amarga como fel e quente como o inferno…”. A cor escura do negro vinho decorre de uma torra p´ra lá de intensa, quando os famosos “pipocos” ou “pops”  já deram o ar de sua efêmera graça. Esse som nada mais é do que o barulho do rompimento das membranas celulares devido à pressão resultante do aumento de vapor de água e gás carbônico da Reação de Pirólise. Após isto, inicia-se a fase em que a celulose é consumida na reação de combustão ou, mais precisamente, de carbonização.

Portanto,  o grão fica carbonizado.

O gosto disso?

Amargo e com o sabor de carvão (exatamente o que ocorre quando queima-se uma carne no espeto ou o pão no forno).  Tenho certeza que a absoluta maioria das pessoas não aprecia um filé esturricado…

Outra origem do amargor, agora com característicamedicinal ou química, é quando a semente do café sofre um ataque bacteriano, alterando moléculas de proteína. É quando surgem os compostos fenólicosindesejáveis, dando origem às chamadas bebida Rio. Tecnicamente, estes grãos estão apodrecidos.

Esses compostos fenólicos, quando presentes no café, atacam a mucosa do estômago, causando um belo estrago!

Assim, a queimação no estômago que algumas pessoas dizem sentir quando bebem café é porque, certamente, beberam café de baixa qualidade, com grãos que sofreram algum tipo de fermentação indesejável.

Gostaria muito que isso seja algo que ficasse definitivamente no passado.

Afinal, há um grande esforço conjunto para levar ao consumidor brasileiro cafés de alta qualidade para as xícaras. Entram nesse circuito caprichosos produtores que acreditam que a qualidade de seus cafés podem trazer diferenciação e reconhecimento, torrefações e cafeterias com o ideal de ajudar a transformar o mercado, tal qual aconteceu com muitos segmentos como vinhos, chocolates e azeites.

Um café cujos frutos foram colhidos maduros, que tiveram uma seca cuidadosa, passaram por um processo de torra magistral e são servidos com um extração bem feita, pode ter sua doçura perfeitamente percebida, dispensando açúcar ou qualquer tipo de adoçante!

É quando pode-se dizer que para deixar a vida mais doce, nada melhor que beber e apreciar um café bacana!

Chamada para belô: Uma agenda para os mineiros!

Thiago Sousa

Um Mar de Morros. Esta era a definição que os livros de Geografia, quando eu ainda estava esquentando os bancos da antiga escola primária (hoje Primeiro Grau), davam para a topografia de Minas Gerais.

Eu, Paulistano da Gema, cresci com a mágica impressão de que na falta de praias, as ondas mineiramente simuladas poderiam esconder muitos tesouros como em profundos oceanos. Havia, ainda, o histórico de que este era o pedaço de terra do Brasil mais recheado de riquezas  como ouro e pedras preciosas, daí a origem do seu simples e genial nome: Minas Gerais.

Durante o chamado Ciclo do Ouro, quando bandeirantes, nada mais que exploradores movidos pela perspectiva de encontrar tesouros escondidos em rios e cavernas e, assim, se tornarem ricos senhores, estabeleceram rotas que ligavam as distantes paragens com cidades como o Rio de Janeiro e Parati, formando o conjunto que posteriormente seria conhecido como Estrada Real.

Mas, outras riquezas ainda viriam fazer parte da rica história mineira…

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Na verdade, a arquitetura natural que a topografia de Minas Gerais proporciona é muito mais diversa, tendo grandiosas cadeias de serras como a Mantiqueira e a do Caparaó, sendo que nesta fica o majestoso Pico da Bandeira, por muitos anos o ponto mais alto do Brasil;  áreas planas a perder de vista ficam noTriângulo Mineiro e Alto Paranaíba, constituindo a região demarcada do Cerrado Mineiro; e ainda tem as verdejantes planícies por onde passa o Velho Chico ou a árida chapada que faz divisa com o Sul de Bahia.

A exploração de minérios ainda é marca registrada do “país” mineiro, que abriga jazidas de fósforo, zinco e ferro, por exemplo. Mas, é na produção agrícola que Minas se destaca, principalmente com o café. Mantendo 3 das maiores áreas produtoras de Cafés do Brasil, o Sul de Minas, as Matas de Minas e o Cerrado Mineiro, este Estado é responsável por mais de 50% de tudo que o nosso país produz. Ah, e essencialmente de grãos da espécie arabica!

Ficam em Minas Gerais alguns dos mais importantes polos de pesquisa da cafeicultura, como aUniversidade de Lavras – UFLA e a Universidade Federal de Viçosa – UFV, além de concentrar o maior número de cooperativas de cafeicultores no país, como Cooxupé, Cooparaíso, Coocatrel, MinaSul, Expocaccer, Coocacer e Coocafé, entre outras.

 A partir deste mês de Fevereiro, iniciamos nossas atividades educacionais em Belo Horizonte, ou simplesmente Belô, juntamente com a ACADEMIA DO CAFÉ de Bruno Souza, consolidando um trabalho conjunto que já chega aos 15 anos. A Missão da ACADEMIA DO CAFÉ + CAFEOTECH é o de oferecer Educação  e Treinamento em nível de excelência nas áreas de Avaliação Sensorial,Ciência da Torra do CaféIndustrialização de CaféTecnologias de Extração e Preparo de Cafée outros programas especiais através de modelos inovadores. É a nossa contribuição para ajudar a preparar profissionais do café dentro de uma perspectiva moderna e altamente especializada.

Daremos início com os Módulos 1 e 2 do Curso Sensorial – Metodologia SCAA de um total de 5 módulos de 2 dias de duração cada um, exclusivo para o pessoal das Alterosas. Aplicaremos um modelo inovador, de forma que o Módulo 1, por exemplo, é chamado de BOCA, onde são trabalhados exercícios para aprimorar habilidades do Palato, enquanto que o Módulo 2, chamado de NARIZ, tem foco no Olfato.

Veja a Agenda de Cursos até Maio de 2011 nos quadros acima.

Academia do Café fica na Avenida do Contorno, 4392, Bairro Funcionários, Belo Horizonte, MG. Para maiores informações, ligue para 31-3223-8565 ou escreva para academiadocafe@gmail.com .

Outras novidades virão.

Esperamos vocês!

Por que o café é bebida singular?

Thiago Sousa

A palavra Singular tem, segundo o Dicionário Aurélio, estes sentidos: “único, individual; especial, raro; aplicável a um só sujeito”. Se levarmos esses sentidos para uma perspectiva de raciocínio lógico, podemos ver que há uma notável correlação com conceitos estatísticos.

A saga das sementinhas de café até nossas xícaras de cada dia iniciam-se durante a fase da floração. Numa lavoura de café, apesar de semelhantes, nenhuma planta é exatamente igual a outra, pois cada qual é um indivíduo. Mesmo entre os dedos de uma mão, cada um tem sua individualidade!

Veja nesta foto como cada flor está num estágio sutilmente diferente das outras, assim como existem também botões fecundados. É, na vida tudo transcorre como uma grande corrida, onde cada um de nós acaba ficando em diferentes colocações.

Em cada fase do ciclo da vida dos frutos do café, essas pequenas diferenças de tempo de floração podem se tornar dramaticamente maiores em razão de uma série de efeitos determinados pelo clima ou pela nutrição dada à planta, por exemplo.

Se lembrarmos que o fruto do café amadurece apenas enquanto estiver preso à planta, o momento em que é feita sua colheita tem influência direta no que poderemos perceber na xícara durante a degustação.

A foto ao lado mostra muito bem como cada fruta tem, digamos, velocidade diferente em seu processo de amadurecimento. Deve ser levado em conta que pelo menos foram 4 floradas diferentes que ocorreram, identificadas pelas distintas cores. Como comentei anteriormente, o ponto “Maduro” da fruta corresponde quando ela adquire a cor avermelhada como cerejas maduras, no caso das variedades vermelhas, ou alaranjada, quando forem variedades amarelas. Antes disso, o teor de açúcares é menor do que o que em um fruto perfeitamente maduro, levando a diferentes resultados durante a torra das sementes do café.

O processo de torra do café é na realidade um complexo conjunto de reações químicas regido pela energia que é posta num torrador. Porém, as respostas de cada grão (= semente ) de café dependem do ponto de maturação da fruta durante sua colheita.

Observe na foto ao lado que, numa primeira vista, podemos admitir que o resultado da torra está uniforme, ou seja, com os grãos praticamente com o mesmo tom de marrom. Mas, ao se observar mais atentamente, veremos que existem sutis e até consideráveis diferenças nos tons de cor!

Alguns estão com um tom que lembra chocolate ao leite com bastante cacau, que indica que são sementes de frutos que estavam perfeitamente maduros quando foram colhidos. Tons mais claros indicam que as sementes são de frutos imaturos, daqueles que darão a sensação de adstringência quando experimentarmos na xícara. Adstringência é aquela sensação incômoda de aspereza e secura na boca, como quando comemos uma banana ou caqui verdes. Isso é sempre um péssimo indicador de qualidade. Lembre-se que Qualidade Sensorial do Café está definitivamente ligada à uniformidade de maturação das sementes usadas para preparar um xícara, preferencialmente originadas de frutos maduros.

Costumo dizer que o espresso é o serviço de café que é o exemplo máximo do significado de Bebida Singular. Se pensarmos na técnica italiana, que utiliza 7 gramas de café torrado para extrair 30 ml de espresso, essa quantidade corresponde a aproximadamente 50 grãos torrados. Como a quantidade é pequena, é razoável pensar que se houver um único grão proveniente de um fruto verde, o estrago será amplificadamente percebido na xícara!

Deixando de lado estas situações desastrosas, se forem 50 grãos de frutos perfeitamente maduros, cuidadosamente secos e selecionados (o olhar atento e as papilas privilegiadas dos Juízes Degustadores são decisivas aqui…), magistralmente torrados (ah, a mão e sensibilidade do Mestre de Torra se revelam nesse momento!) e inspiradamente extraídos por hábeis Baristas,certamente a Experiência Sensorial será memorável!

Veja que nenhuma xícara de espresso será igual a outra! Por mais uniforme que seja o lote de café, por mais regular que seja o Barista em cada extração, os resultados não se repetem. Além do mais, cada pessoa tem uma sensibilidade particular, de forma que a percepção de cada uma será sempre distinta de outra.

É por isso que o Café é uma Bebida Singular!

Porque o café é uma fruta! – 2: A torra

Thiago Sousa

Frutos maduros, frutos colhidos e secos. Descansados, beneficiados e selecionados. A etapa da Porteira para Dentro está encerrada e temos, agora, os Grãos Crus (na verdade, Sementes!) que seguem para a etapa de industrialização.

O café tem muito mais em comum, em se falando de processos industriais e partes botânicas utilizadas, com o cacau e chocolate do que com as uva e vinho. Da uva o que se quer é sua polpa para ser cuidadosamente fermentada e, assim, se obter finíssimos vinhos. As sementes tem de ser retiradas para não interferirem com o típico sabor amargo vegetal. Já do fruto do cacaueiro são as suas sementes procuradas para, depois de secas e tratadas, serem torradas para se chegar ao sempre apaixonante chocolate. Aliás, chocolate e café são tão próximos que suas principais substâncias são assemelhadas, respectivamente, theobromina e cafeína.  Na verdade, a theobromina (do grego theo = deuses, bromos = alimento) é uma molécula que dá origem à cafeína, por isso seus efeitos de prazer nas pessoas são tão semelhantes!

Para a indústria de torrefação, o grão cru é a matéria prima. Portanto, quanto melhor for a matéria prima, tanto melhor poderá ser o produto industrializado. É por isso que existe uma relação direta entre a qualidade da matéria prima, qualidade esta definida pela Pureza e Uniformidade, e o seu preço. Lembre-se que Pureza significa que o lote de café não tem impurezas como cascas, pedras e paus, além contaminações e grãos que sofreram fermentações indesejáveis. Já o conceito de Uniformidade pressupõe que os grãos sejam de frutos colhidos em pontos de maturação bastante próximos, preferencialmente plenamente maduros, conhecidos como Cerejas por lembrar essa saborosa fruta avermelhada como rubi.

Lotes de café pouco uniformes, contendo, por exemplo, grãos não maduros (ou Imaturos) vão originar probleminhas que afetarão a bebida na xícara. Comentei no primeiro post desta série que o cafeicultor tem como desafio procurar colher o máximo de frutos maduros, frutos estes que possuem o teor completo de açúcares previsto. Frutos plenamente maduros são doces e suas sementes perfeitas (é esta a razão porque as sementes são preparadas a partir de frutos nesse estágio!), com todo o açúcar que é de direito!

Caso o fruto colhido ainda não tenha chegado naquele ponto, substâncias que provocam adstringência, que é a sensação de “pega” como quando se come uma banana verde, se sobrepõem sobre a menor quantidade de açúcares formada. Para se ter idéia, para sabores desagradavelmente amargos e adstringentes somos quase 10.000 vezes mais sensíveis que em relação ao sabor doce!

Na foto acima, os grãos maduros estão separados dos imaturos (em menor quantidade), cuja cor mais clara os denunciam! Se você quebrar um desses grãos junto ao nariz, perceberá notas aromáticas lembrando a capim cortado.

O processo de torra envolve um grande número de reações químicas e bioquímicas estimuladas pelo calor. É bastante razoável pensar que o tipo de fonte de calor, bem como a forma como ele chega às sementes, sua intensidade e a delicada relação que tem de manter com o ar são decisivos para um resultado satisfatório. É ciência e arte combinadas, pois além do domínio técnico e um bom equipamento, o Mestre de Torra tem de ter sensibilidade para perceber as sutis transformações que a semente sofre a cada instante na linha do tempo de torra.

Durante a torra, a partir daquela que denominamos de Fase das Reações de Maillard, quando aquelas numerosas reações acontecem, quebrando e formando moléculas, os aromas e sabores começam a surgir magicamente!

A Roda de Aromas e Sabores da SCAA – Specialty Coffee Association of America, reproduzida parcialmente ao lado,  para fins didáticos, mostra alguns dos aromas e sabores mais comuns obtidos nessa etapa. Por exigirem menor quantidade de energia, moléculas das classes Aldeídos e Cetonassão formadas inicialmente, originando notas de aroma como nozes e amendoim.

Em seguida, envolvendo mais energia para as suas reações, são formados compostos Heterocíclicos, alguns sulfurosos, que fazem aflorar aromas como caramelo. Por fim, com o maior número de reações pirolíticas, que envolvem um aumento notável da quantidade de energia do sistema, formam-se compostos como Pirazinas, que geram aromas mais profundos como o chocolate e especiarias.

A Arte da Torra está no refinado controle dessas variáveis, em saber fazer com que notas de aroma e sabor que potencialmente estão nas sementes de um lote de café possam ser magistralmente formadas. É claro que a máquina ajuda, mas o piloto é a peça fundamental. Porém, sem um bom combustível, no caso um lote de café de alta qualidade, dificilmente se chega ao final de um rally…

Trip to Yemen – 6: Videos

Thiago Sousa

Para completar esta série sobre a incrível viagem ao Yemen com direito a conhecer as mais antigas lavouras de café do mundo, estou incluindo 2 vídeos.

O primeiro vídeo mostra Tallook, onde é praticada cafeicultura sombreada a 1.300 m de altitude. Veja uma bonita cerimônia com serviço de Bun (café) e Qishr, e se surpreenda em saber que lá a associação é de produtoras (mulheres), funcionando muito bem!

Veja agora imagens do antigo Porto de Mocha, o Mar Vermelho (Red Sea) e  Taiz, maior cidade do Yemen e seu belo mercado. Ao final a divertida cantoria de Steve, do Kenya, cantando Akuna Matata, imortalizado no filme da Disney “O Rei Leão” pela impagável dupla Timão e Pumba, e como o café cria fortes laços de amizade:

Trip to Yemen – 5: Mocha, Red Sea & Tallook

Thiago Sousa

A última etapa da jornada pelas origens yemeni de café foi particularmente fantástica!

Saindo de Jabal Bura, onde se encontram as lavouras mais elevadas de café que tenho conhecimento (quase 3.000 m acima do nível do mar!), iniciamos a “descida da serra”, literalmente, rumo ao Mar Vermelho.

Vencida a sinuosa estrada das montanhas, a paisagem mudou radicalmente. As grandes rochas e imponentes picos deram lugar à branca e fina areia do deserto, que compõe grande parte da região sul do Yemen. Sol impiedosamente intenso e brilhante fez a diferença na temperatura, que atingiu rapidamente mais de 32°C. E chegamos ao mítico Porto de Mocha.

O Porto de Mocha teve seu auge entre os Séculos XV e XVII, quando era o principal porto para escoamento das mercadorias que vinham do norte do Yemen, muitas vezes passando por Sana’a. Banhado pelo Mar Vermelho, fica relativamente próximo ao Estreito de Bab al Mandeb, que separa o Mar Vermelho do Golfo de Aden e é onde está a menor distância entre a Península Arábica e o Leste da África.

Sendo um importante local para exportação, era natural que o café também tivesse parte na história. Tanto é verdade que foi por isso que os grãos crus de café ganharam o nome de Mocha Sanani (= vindo de Sana’a), que se tornou um nome comum a todo o café originário do Yemen.

Essa fusão entre nome e produto é o que aconteceu no Brasil como o Porto de Santos. Santos é o mais importante porto exportador de café brasileiro, abrigando um grande número de casas de comércio internacional (lembre-se que o Brasil chegou ao posto de maior produtor mundial de café por volta de 1880…). Em geral, os comerciantes de commodities idealizam padrões para os seus produtos, o mesmo acontecendo com o café. Assim, ao se misturar grãos crus de diversas origens brasileiras, como Sul de Minas e Alta Paulista, por exemplo, com determinado padrão de qualidade, dão nomes para facilitar na venda. Assim, o ainda muito famoso é o chamadoCafé Tipo Santos, que nada mais é do que um café com certo padrão de pureza e qualidade de bebida, vinculados a uma característica sensorial média como sem Defeitos Capitais (PVA = Pretos, Verdes e Ardidos) e delicada acidez (afinal, o café brasileiro tem sido usualmente base de blends).

Muita gente ainda pensa que Santos é um local onde existem lavouras de café, quando na realidade é apenas um porto de exportação, assim como foi Mocha. Este último perdeu seu brilho a partir do Século XIX, quando os portos de Aden e Hodeida ganharam importância. Hoje Mocha não passa de um vilarejo de pescadores, com bucólicas hospedarias e muita estórias para contar…

Como não poderia deixar de fazer, coloquei os pés no Mar Vermelho que, apenas para esclarecer, é de um belíssimo azul… Junto comigo compartilhando o mágico momento estão os Companheiros de Viagem, a partir da direita,  Al-Masri, do Yemen, Tsion, da Ethiopia, Mario e Manuel, do Mexico, e eu, seu Coffee Traveler. Foi emocionante!

Fizemos o pernoite em Taiz, a maior cidade do Yemen, com mais de 3 milhões de habitantes. Visitamos sua área antiga com um grande mercado. Aproveitei e compre um queijo de cabra defumado para experimentar. Apesar de muito salgado, certamente para evitar contaminações e “otras cositas más”, sua textura era muito macia, delicada, quase um pudim de leite.

Falando em leite, existe apenas o de cabra, quase todo destinado para a fabricação artesanal de queijos. O leite de vaca é importado e somente em hotéis é possível de encontrar.

De Taiz seguimos para Tallook, a região produtora menos elevada do Yemen , mas não menos que 1.300 m de altitude!

Fomos recepcionados pelos produtores, que nos serviram Bun (café) e Qishr. O café me impressionou pela riqueza de sabores com notas a frutas vermelhas e chocolate (é daí que veio o conceito do sabor do Mocha Coffee, divulgado pelos europeus), secundados por acidez do raro ácido fosfórico, em geral encontrado em cafés do Kenya.

O ponto alto foi saber que existe uma Associação de Mulheres Produtores de Tallook! Sim, foi uma surpresa saber que a associação é toda organizada pelas mulheres, num total de 164 da região, representando mais de 100 hectares cultivados de café. Através da associação conseguem adubos para o tratamento das lavouras, fazem o benefício e rebenefício de café, torram e comercializam, gerando riquezas para a comunidade.

Sim, foi um fecho de ouro para a viagem!

Veja o vídeo com imagens de Haraz e Jabal Bura a seguir:

Trip to Yemen – 4: Haraz & Jabal Bura (& Yemeni Baristas!)

Thiago Sousa

Os trabalhos da 2nd International Conference on Arabica Naturals, em Sana’a, encerram-se no dia 13 de dezembro com excelentes resultados. O dia seguinte,  14, estava reservado para o início de uma longa jornada pelas principais origens yemenitas produtoras de café. Eram antes das 6 h da manhã quando um grupo de amigos se juntou no lobby do hotel, aguardando as camionetes 4X4 que nos levariam. Expectativa total!

Todos estavam ansiosos pelo início da grande aventura, uma vez que todos, apesar de experientes no café, estavam se iniciando nas origens do Yemen. Este país, considerado ainda o mais pobre dentre os da Península Arábica, pode ser dividido em duas grandes áreas geográficas: o Sul, onde predomina o deserto, é rico em petróleo, que gera a maior parte das divisas do país, enquanto que o Norte, onde grandes cadeias de montanhas se estendem generosamente, tem na agricultura sua sustentação econômica. Apesar da conhecida fertilidade dos rincões montanhosos, em parte explicada pela incrível quantidade de rochas calcáreas, apesar da topografia íngreme e repleta de pedras, tem outra restrição: a água, que é bastante escassa. Ou seja: se não é o caso de paisagem desértica de dunas em mutação, predomina a aridez das montanhas pedregosas.

As chuvas são diminutas se compararmos à abundância existente no Brasil (não mais que 30% do que chove em nosso país!), por isso tem de ser sabiamente empregada pelos yemenis.

Nesta primeira etapa da jornada, nosso destino era Haraz, uma das mais antigas cafeiculturas do mundo (lembrem-se de que a cafeicultura do Yemen é milenar!) nas montanhas. Lavouras de café entre 1.500 m e 1.800 m de altitude. Não, não eram as mais elevadas… no entanto, elevações dessa magnitude já ultrapassam as Centro-Americanas como em BoquetePanamá.

A principal característica das lavouras é o fato de que todo o plantio é feito empregando a técnica de terraços, que permitem lidar com a declividade das montanhas e auxiliam na retenção da água. O que impressiona é o perfeito trabalho em nível, no que podemos chamar de alinhamento em State of Art. Aproveitamos, o Companheiro de Viagem Manuel Diaz e eu, e fizemos algumas medições e cálculos rápidos. Conclusão: no espaçamento médio empregado, a densidade de plantio fica em torno de (pasmem!) 7.000 plantas por hectare!

Isso explica, em parte, a relativa boa produtividade dessas lavouras.

Estes terraços estão em Jabal Bura, e ficam entre inacreditáveis 2.000 e 2.400 m de altitude. Algumas lavouras chegam a conversar com as estrelas, pois estão a cerca de 3.000 m acima do nível do mar!

Observem em detalhe a construção de um terraço. Impressionante, não?

Imagine que fizeram, inicialmente, o traçado de cada linha, verificaram o nível para, finalmente, construírem, literalmente, as paredes de cada terraço. Daí, é razoável concluir que por se tratar de uma obra de engenharia, o custo para a implantação de uma lavoura como essa chega a ser… impensável! Porém, é algo que fazem a centenas e centenas de anos…

Outra coisa: sendo a largura dos terraços, principalmente naquela altitude, bastante pequena, dá para compreender que todos os serviços são feitos manualmente. Tratores são impensáveis e até mesmo cavalos. Para vencer esses terrenos pedregosos e íngremes, somente burricos e cabras. Estradas em desenhos pouco civilizados e repletas de seixos rolantes são vencidas com certa dificuldade pelos valentes Toyotas 4×4!

Foi uma aventura vertiginosa!

Como refresco, assiste ao vídeo abaixo e conheça o mais antigo serviço de café, o Ibriq, numa cafeteria típica do Yemen:

Trip to Yemen – 3: Conference on Arabica Naturals

Thiago Sousa

Ao receber o convite para participar do 2nd International Coffee Conference on Arabica Naturals, em Sana’a, Yemen, uma das perspectivas que se abriu para mim foi estar numa discussão de alto nível sobre “Afinal, por quê Natural?”

Foi no Yemen que o cultivo de café se estruturou, ganhando padrão agronômico e, por isso mesmo, alçando vôos como o principal produtor das cobiçadas frutas de Coffea arabica por um longo período.

Muitos me perguntaram: por que  uma conferência sobre Cafés Arabica Naturais ?

A bem da verdade, a esmagadora maioria dos grãos disponíveis no mercado tem processo de secagem denominado Natural, que é aquele em que o fruto, preferencialmente maduro, é colhido e seco (desidratado) com sua casca externa. Esta é a definição do que é um Café Natural. Caso esta casca seja retirada, as sementes ficam expostas, envoltas apenas por uma casca interna, chamada de Pergaminho, pois sua cor e textura lembra os antigos materiais egípcios. Descascar frutos maduros é sempre mais fácil do que em frutos verdes, de forma que o resultado neste processo, que pode envolver ainda uma etapa com fermentação em tanque com água para retirada da mucilagem, conhecida como Fully Washed ou Café Lavado. Portanto, neste último processo, o resultado na obtenção de sementes bem formadas (= qualitativo) é superior em relação ao Natural, apesar de que em quantidade seja bem mais modesto.

Apesar dessa vantagem qualitativa, tão bem explorada nas campanhas de marketing de países produtores como a Colômbia e os Centro-Americanos, o principal insumo utilizado é também o mais precioso e escasso em nosso planeta: a água potável. Por isso, há uma crescente preocupação entre ONGs conservacionistas em relação a este tema.

Afinal, a contaminação que a desmucilagem provoca na água e, no caso de locais com menor infraestrutura, nos rios acaba por afetar o delicado equilíbrio biológico.

A discussão sobre qualidade sensorial é um tema que envolve aspectos tecnológicos e de manejo, no que digo que o homem pode conduzir tudo de forma mais amigável com o meio ambiente. E a Conferência em Sana’a teve como preocupação abordar todos esses temas, justamente para demonstrar que o Café Natural possui características sensoriais ricas e que o padrão de qualidade de produto está muito mais ligado a procedimentos decorrentes da maior compreensão de cada localidade.

Saiba que mais de 80% dos grãos crus (= Green Coffee) de café, apenas ficando com os da espéciearabica, são Naturais! É que a minoria Lavados é bem mais barulhenta no mercado…

Qualidade sensorial está intimamente ligada com o conceito de Uniformidade, como já delineei acima. Ou seja, quanto mais maduros ou próximos disso estiverem os frutos, tanto mais uniforme será o lote e, consequentemente, sua bebida com muito maior potencial para alta qualidade.

E o que o produtor tem de fazer?

Colocar-se no lugar do consumidor: como você gosta de uma fruta, madura ou verde? Simples, não?

O conceito é, porém, a realidade é muito mais árdua… Há o procedimento de se colher seletivamente apenas os frutos maduros, que esbarra no elevado custo, principalmente se em regiões onde múltiplas floradas são comuns. Ou fazer a seleção com equipamentos de alta tecnologia depois das sementes corretamente secas, independentemente do processo de secagem escolhido.

A viagem ao Yemen trouxe uma série de respostas e confirmações que há tempos vinha buscando, que comentarei nos próximos posts.

Para este místico país, a Conferência ganhou muito destaque, tendo a presença de autoridades máximas na abertura, como o Primeiro MinistroDr. Ali Mohammed Mujawar, o segundo a partir da direita na foto acima, e o Ministro da Agricultura, além de outras autoridades. Ciente da importância do Yemen na saga histórica do café, o Governo vê neste precioso fruto a oportunidade de reinserir o país no mapa do comércio internacional de café em posição de destaque.

Além dos temas técnicos ao longo da Conferência, que contou com participantes de mais de 20 países, houve a primeira edição do Arabica Naturals International Contest, sob a coordenação doCompanheiro de Viagem Manuel Diaz Pineda, do México. Foi formada uma equipe de juízes SCAA e Q-Graders, da qual tive a honra de fazer parte, e que estão nesta foto oficial: de pé, a partir da direita,Mario Roberto Fernández Alduenda, México,Michael Mekonen, Ethiopia, Surendra Kotecha, India, Manuel Diaz Pineda, México, e dois dos rapazes yemenis que estiveram na Equipe de Apoio; sentados, a partir da esquerda, Manuela Violoni, da Itália (que coordenou o workshop para baristas), um barista yemeni, e eu, seu Coffee Traveler. Participou, ainda, Resianri Triane, Indonesia, que não está nesta foto.

Mais de 30 amostras foram avaliadas cuidadosamente, algumas surpreendentes!

Veja, neste vídeo, o anúncio dos Top 10 do concurso, pelo Diretor Executivo da SMEPS – Small & Micro Enterprise Promotion ServiceWesan Qaid:

Trip to Yemen -2: Caravan Serai, Spices & Cafe

Thiago Sousa

Imaginando Sana’a como parte de rota das caravanas de mercadores vindas da região oriental da Península Arábica rumo ao Mar Vermelho, manter uma Caravan Serai seria algo mais do que esperado.

Hoje em dia, os grandes espaços deste tipo de hospedaria se tornaram, como acontece em Bab Al Yemen, praças onde diversas barracas se instalaram para comercializar itens nobres como especiarias e frutas secas.

Com uma forte inclinação para o comércio, os yemenis oferecem seus produtos a partir de estupendos arranjos onde combinam magistralmente cores e texturas, compondo um rico mosaico de cores e aromas, como pode ser observado  nesta foto. Vejam que bela composição com  cravo da índia e noz moscada em primeiro plano, cardamono e orégano, sementes de gergelim tostada e as rubras folhas de hibisco, conhecidas também como tea rose.  Gengibre e pimenta do reino completam o conjunto.

Juntamente com Makonen, da Ethiopia, provei cada tipo de tempero, especiaria e frutas, comparando seus matizes de sabores com as que encontramos no Brasil, por exemplo. Foi um exercício sensorial inesquecível!

Algumas frutas são cultivadas na região Norte do Yemen como as uvas, que devido ao clima árido são muito saborosas e intensamente adocicadas. Observe nesta foto como a montagem para exposição das uvas passa levou-se em conta características como  ponto de maturação na colheita, tamanho das bagas e até procedência. Estavam deliciosas!

A região Sudoeste do Yemen é banhada pelo Mar Vermelho, tendo ao Sul o Mar Arábico e o Golfo de Aden. Há um estreito que separa estas duas águas, tornando esta parte da península muito próxima da chamada África Oriental, mais precisamente com a Ethiopia.

Nesta parte do Yemen a arquitetura difere um pouco das cidades mais ao norte, além do que seus habitantes com feições bastante distintas, também usam roupas destacadamente mais coloridas. Tudo isso é influência da cultura etíope. Ainda hoje o intercâmbio com a Ethiopia é muito grande e, por exemplo, diversas palavras e expressões são comuns aos dois povos.

A Ethiopia é o berço do cafeeiro (ou origem botânica), planta que deu início à saga da segunda bebida mais consumida no mundo depois da água, ou seja, onde foram identificadas originalmente. A proximidade com o Yemen fez com que plantas e sementes tenham sido transportadas a partir da Ethiopia. A partir daí, os yemenis passaram a cultivar os cafeeiros de forma sistematizada, o que faz com que aquele país seja considerado como o berço da Cafeicultura e do café como bebida.

Esta questão de berço disto ou daquilo ainda hoje desperta uma apaixonada discussão entre etíopes e yemenis…

Registros históricos indicam que com o domínio da produção sistematizada do café, o Yemen foi o maior produtor deste precioso fruto durante muitos séculos, tendo boa parte de sua comercialização feita pelo antigo porto de Mocha. Devido ao escoamento dos grãos de café através deste porto, denominou-se como Mocha o café produzido no Yemen, exatamente como ocorreu no Brasil ao se confundir o porto de Santos para muitos uma origem de café!

 As origens produtoras de café do Yemen ficam mais ao norte, nas montanhas, onde o clima é mais ameno e chove mais (apenas impressionantes entre 400 mm a 500 mm de chuva por ano!!!), onde também ficam as outras produções agrícolas. O sul tem como paisagem predominante o deserto que, no entanto, faz aflorar vindo das profundezas um outro negro produto: o petróleo.

Para se ter idéia do meu espanto quanto à quantidade de chuvas é porque correspondem em média a algo como 25% a 30% do que normalmente ocorre no Brasil. Sendo a água escassa e tão preciosa, é compreensível porque toda a produção de café é secada pelo processo conhecido comoNatural (= grãos maduros secos com a casca).

Sendo um produto de grande valor, em geral as sementes descascadas eram praticamente vendidas em sua maior parte para outros países, ficando por vezes apenas a casca do fruto. Veja na foto acima os dois produtos sendo comercializados, as sementes à esquerda, cascas à direita.

As sementes ou o Café Cru é praticamente, nos dias de hoje, totalmente consumido dentro do próprio país. Com uma produção bastante pequena, em torno do equivalente a 150.000 sacas de 60 kg líquidos, o café cru (= Green Coffee) atinge preços impressionantes como US$ 10/kg (isso mesmo, dez dólares por quilo!!!).

Café bebida no Yemen é o Bun, finamente moído e preparado em ibriqs em estilo tradicional à toda região árabe.

Com a casca surgiu uma outra bebida, o Qishr. Ou seja, o seu uso é legal porque gera um produto distinto. Com o tempo, para dar notas de sabor diferentes, foram sendo adicionados outros produtos como gengibre, canela e cardamono às cascas, de modo que diversos blends de Qishr surgiram, como o que está nesta foto.

Observe que é muito clara a descrição do Qishr como feito a partir da casca do café.

No caso deste produto, considerado um dos melhores blends foi criado pelo mesmo senhor que está sentado na entrada de sua barraca, como pode ser visto na terceira foto da sequência.

Fica uma lição: os yemeni souberam dar um tratamento digno à casca do café, que atinge preços tão elevados quanto o do próprio café!!!

Mas que fique claro: Bun é Bun, Qishr é Qishr.

E outro detalhe: esse uso massivo da casca do café é possível porque as lavouras do Yemen são praticamente isentas de uso de agroquímicos, o que os torna bastante seguro o seu consumo.

Porque o café é uma Fruta! – 1

Thiago Sousa

Quando se fala em Qualidade do Café, observa-se uma quantidade de informações desencontradas que acabam confundindo mais do que esclarecendo o consumidor e mesmo as pessoas que participam desse mundo incrível. A questão se torna ainda mais delicada na medida que o interesse para os cafés de alta qualidade cresce, pois evitar distorções no conhecimento torna o mercado mais saudável.

Para facilitar, vamos abordar as etapas mais importantes na fase que é conhecida como Da Porteira P’ra Dentro ou até o grão cru estar pronto para sua comercialização.

Vale lembrar mais uma vez que o café é um produto típico de Terroir, que quer dizer todas suas características de bebida são influenciadas pela geografia, seja na localização, seja pelo clima, pela botânica e pelo toque humano. Outra coisa importantíssima: o que queremos é a semente dessa frutinha!

Essa fruta só amadurece enquanto ainda está no pé (tirou antes de madura, é “preju” total…), diferente da banana e do mamão, que conseguem amadurecer mesmo que retiradas ainda verdes. Neste ponto, o café é igualzinho à jabuticaba, exemplo que considero perfeito. A melhor jabuticaba é aquela todinha preta, que dá uma polpa maravilhosamente adocicada.

A polpa do café pode ser considerada como espelho do que está acontecendo na semente. Se a polpa está ainda “pegando”, é porque ainda a fruta não está madura; se estiver doce, doce, doce é porque está no ponto ideal de maturação, havendo conexão total com a cor da casca, seja avermelhada ou dourada. Como o cafeeiro da espécie arabica é uma planta inteligente, afinal tem 44n de cromossomos(!), no momento em que a fruta fica madura, esta dispara um alarme biológico que faz com que a ligação com o ramo se feche, iniciando sua fase de, digamos, auto-secagem, vindo a ficar passa.

Sabe quem é que é o responsável por disparar esse alarme biológico?

Os açúcares!

A formação dos componentes da semente seguem uma ordem crescente de energia, ficando para o final as substâncias que necessitam de mais energia para serem formadas, que são os açúcares. Se a, digamos, programação da planta é a de que as frutinhas ficam maduras quando suas sementes atingem 2,0% m/v de açúcares (que é a média na semente do cafe´), o alarme é, então, disparado. Antes disso, são formadas as substâncias que dão aroma e sabor, algumas proteínas, óleos e ácidos, não nesta ordem obrigatoriamente. Portanto, dentro da nossa linha de trabalho, o Açúcar é Tudo enquanto o fruto estiver na planta.

Sabe por que é que temos de colher o fruto idealmente quando maduro? Porque simplesmente queremos a semente!

E semente boa é semente de fruta madura, que, se semeada, poderá dar excelentes plantas. A polpa nos indica se a fruta está madura, ou seja, vale a Teoria do Espelho que comentei antes.

Veja que, em condições normais, a fruta do cafeeiro começa a murchar quando seu total de açúcares previsto se formou. Se você pensar que, ao comprar tomates, sempre os maduros serão escolhidos, pois os ainda não muito vermelhos serão adstringentes (dando a sensação de “pega” na boca), leve esta lógica na colheita do café. Porém, nem sempre é possível colher todos os grãos perfeitamente maduros ao mesmo tempo, pois a planta do café é um organismo vivo e que acaba levando tempos diferentes para cada fruta. O cuidado do produtor é o de tentar fazer a colheita retirando o mínimo de frutos verdes, que acabam interferindo na qualidade sensorial na xícara.

Tarefa fácil não é, daí a disparidade de qualidade que se observa entre os milhares de produtores. Saber colher as frutas rubis ou douradas encerra fina conexão com a lavoura.